Prologue

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So Yeon acordou empapada de suor.

Os olhos escuros correram pelo cômodo enquanto tentava retomar a respiração descompassada. As mãos pequenas apertaram a roupa de cama e o iminente aperto no peito se fazia presente, uma sensação corriqueira que simplesmente não conseguia entender, muito menos aceitar.

Era o mesmo sonho de sempre: olhos amendoados, o homem com a voz doce e abraços adoráveis, uma colina alta... outro país. Esbanjava felicidade e uma aura mais velha, mas tudo sempre acabava em tragédia. Um último abraço, uma despedida. Onde subiu uma enorme leva de escadas e o homem ficava desolado com sua partida.

Ainda havia variações, onde ela enxergava fantasmas e até mesmo amiga de Sunny, uma famosa atriz que estava fazendo um dos dramas mais vistos do ano. O homem que retornara as cinzas, mas voltara com uma aparência de verdade.

Um casamento consagrado num vasto campo com flores brancas, um acidente de carro. O som estridente da colisão, cheiro de sangue. O sol, as pálpebras se fechando...

E aquilo trazia lágrimas.

A menina limpou a testa com a manga da camiseta rosa e pegou o celular para verificar o horário, suspirando aliviada por não ter perdido a hora. A mala já estava pronta do outro lado do quarto, finalmente realizaria seu sonho de visitar outro país. Ganhadora de um dos concursos de artes da escola, a menina recebera uma viagem para Quebec, no Canadá. Baek Yeon Hee, mãe da adolescente, não poderia ter ficado mais feliz com a notícia.

Moravam numa pequena casa em Seoul há pouco tempo, Yeon Hee achara que a menina teria mais oportunidade na cidade grande e juntou economias para que tentassem a vida em outro lugar. Mãe solteira, batalhava com unhas e dentes para prosperar um futuro à sua amada filha.

A menina limpou algumas lágrimas que escorriam pela pele macia e fungou, deitando-se de lado e puxando o cobertor para cobrir a cabeça.

— Por que esse sonho é sempre tão triste...? — Indagou alto, escondendo o rosto nas mãos, afundando-se numa profunda agonia.

E mal conseguira perceber que, lá fora, chovia.

Kim Shin estava deitado na mesma posição. Do outro lado da cidade, o solitário Goblin encarava o quarto vazio. Agonia absurda, uma dor alastrante irradiava seu peito, a saudade que sentia de sua amava jamais poderia ser descrita com palavras exatas. Sentia falta de tudo sobre ela e, em noites como aquela, temia até ser capaz de ouvir sua risada.

Se suas contas estivessem certas, Eun Tak estaria com 19 anos agora. Sua segunda vida, uma garota brilhante, que finalizara a sua primeira tão cedo e de forma tão valente... o amor triste que os dois protagonizaram perdurava sua mente. Porque ele sentia falta dela, sentia falta de lhe abraçar e até mesmo do cheiro adocicado.

Ele amava tudo sobre ela, sempre amou.

E a Coreia encarou anos de chuva.

O Goblin forçou-se a levantar da cama pouco antes das nove da manhã, a vasta casa nunca foi tão solitária como nos últimos anos. Calçou as pantufas e forçou-se até a cozinha, o corpo latejava e negou com a cabeça algumas vezes.

Como de costume, preparou o filé grelhado sem dizer absolutamente nada, empratando-o e levando até a mesa, que ainda possuía três cadeiras. Sentado na extremidade da direita, comeu embalado no som da chuva enquanto se perdia em memórias de quando Eun Tak e Wang Yeo eram extremamente barulhentos enquanto comiam.

Uma divindade não deveria ser tão dotada de sentimentos.

Enquanto So Yeon embarcava no avião com mais alguns estudantes, Kim Shin terminava seu banho. Vestiu as roupas escuras sem pressa alguma, o relógio dado por sua eterna noiva fora colocado no pulso antes de se olhar no espelho. Num suspiro descontente, pegou alguns livros na mesa de centro e abriu a porta com força enquanto mentalizava o local.

Num passe de mágica, ao atravessar aquela porta, estava em Quebec.

Na cobertura do hotel que possuía, o homem observou silenciosamente o ambiente por alguns segundos antes de se dirigir até a sala de estar, pousando os livros na mesa de forma audível. Checando o horário local no celular, logo o jogou no bolso do casaco antes de encolher os ombros e marchar para a porta, indo resolver algumas pendências.

Já So Yeon dormira praticamente a viagem toda, ficando simplesmente eufórica ao chegar no país das folhas Maple. A adolescente tirou mais fotos do que previa no aeroporto e não conseguia conter a animação, que aumentou quando chegaram ao hotel que ficariam hospedados na semana. Com certeza não dormiria naquela noite.

A decoração rústica lhe dava uma sensação de nostalgia. Tinha vontade de sair e explorar cada pedaço daquele lugar que parecia ridiculamente familiar, mas não estava a fim de ser punida pelos professores, que estabeleceram regras rígidas aos adolescentes.

Apenas cinco adolescentes foram premiados com a viagem e felizmente ficaria num quarto sozinha. Subiu com as malas e não deu tanta atenção ao que o professor Kim reclamava, assentindo com a cabeça vez ou outra. O jantar seria servido no quarto por conta do horário e sabia que teria de estar em pé cedo no dia seguinte.

Quarto 99. So Yeon praticamente se arrastou até lá e posicionou o cartão no local indicado para abrir a porta com mais pressa que previa. A decoração rústica, com uma leve pitada de modernismo deixava o quarto com um ar chique, chique como a menina jamais havia visto. Admirada, um som de espanto escapou dos lábios avermelhados.

— Esse é o melhor dia da minha vida! — Exclamou, levantando as mãos para o céu. — Mamãe adoraria esse lugar!

Como em sua vida passada, a menina correu pelo quarto com um sorriso de ponta a ponta, bisbilhotando o frigobar, colocando o roupão branco perfeitamente alinhado que estava no banheiro e correndo até a varanda, jogando-se na cama com os braços abertos e batendo as pernas freneticamente.

So Yeon estava tão feliz que poderia chorar.

Kim Shin estava tão triste que os céus se rendiam a sua dor.

Após o jantar, a menina tomou um longo banho com direito a espumas na banheira e, quanto mais aproximava do horário de dormir, as mãos trepidavam e seu coração acelerava com a mínima chance de ter aqueles sonhos novamente.

— Vai ficar tudo bem, vai ficar tudo bem... — Consolou a si mesma, olhando-se no espelho já de pijamas, secando o cabelo com a ajuda de um secador vermelho.

Dormir sempre fora uma tortura. Visitara inúmeros profissionais e até mesmo passou por tratamentos com remédios, mas nada sanava aquela questão: dias chuvosos lhe deixaram estranhamente pensativas, velas faziam os olhos marejar...

E o desconhecido homem lhe passava uma sensação de perda. Até mesmo quando o via sorrindo, seu coração doía. Porque ela puxou uma espada de seu peito e chorou agarrada aos seus braços quando ele desintegrou em milhares de pedaços, o sonho fantasioso parecia tão real...

Mas aquele homem não era real, não poderia ser.

Divindades eram intrigantes, sequer acreditavam que existiam de fato.

Deitou-se na vasta cama e se afundou um pouco mais no cobertor, um suspiro descontente escapou ao virar-se para encarar a janela com uma visão privilegiada: as estrelas dançavam, brilhando lindamente junto a lua.

— Vamos dormir, Soyeon-ah. — Espalmou as mãos na altura do rosto e fechou os olhos.

E o mesmo destino que afetou sua vida passada, dessa vez, tinha um plano especial para a Eterna Noiva. 

Eternal Bride [K-DRAMA] [PT/BR]Onde histórias criam vida. Descubra agora