-Niall... eu... desculpa... – não sei bem o que dizer, por isso atiro-me para os seus braços e sinto as suas lágrimas caírem sobre o meu ombro.
Ficamos assim por algum tempo, não eram necessárias palavras. Não pensei que fosse isto o que ele me ia contar, mas dói. Dói cá dentro, o que é estranho, eu não conheço o Niall.
-Jess, ela era tão parecida contigo. – ele engasga-se e tira uma foto dela do seu bolso. Incrivelmente tem os mesmos olhos claros que eu, e o seu cabelo está preso numa trança, e a seu lado está o Niall a beijar-lhe o rosto.
-Era linda. – sorri fracamente.
-Isto foi... Antes de ser diagnosticado cancro... Sabes... Quando ela ainda tinha... – ele chorava fracamente, parecia-me tão vulnerável. Apercebi-me que ele se estava a referir à perda do seu longo cabelo devido à terrível doença.
-Com ou sem cabelo. Tem os teus traços, é perfeita. – ele agarra-se a mim com mais força. – Ela está orgulhosa de ti.
Sabia que era bom ouvir aquilo quando perdemos alguém especial. Perdemos todas as chances de poder sentir o toque da pessoa novamente, de ouvir a sua voz, de discutir, de rir, de viver. E sentir que ela se pode orgulhar de nós, é algo que nos faz continuar de cabeça erguida.
-Ela chamava-se Jennifer, o funeral é domingo. Tinha apenas 10 anos, não é justo o que aconteceu com ela, não é. - ele chorava desesperadamente.
-Ni, calma. – beijei-lhe levemente o rosto e ele pareceu ficar mais calmo.
-Por favor, vamos para dentro, quero contar-te tudo, mas não aqui. – ele limpa as suas lágrimas.
-Vamos.
***
POV NIALL ON
Sentamo-nos no sofá da sala. Eu sabia que ela não se lembrava de mim, não se recordava do que fiz por ela. Mas eu lembro-me, melhor que ninguém. Tentei ganhar todas as forças que podia para partilhar a perda da minha irmã com ela. Era difícil, não é o tipo de coisas que eu faço, mas alguém precisa de saber.
-Os meus pais não tinham dinheiro para pagar o tratamento dela. Demos o nosso melhor, todo o dinheiro que tínhamos era para ela. Todo mesmo, não sobrava nada para nós. A Jen era o tipo de pessoa por quem eu estava disposto a dar a minha vida. – enquanto falava a Jess olhava para mim atentamente, acariciando o meu cabelo.
-É algo lindo de se ouvir, Niall. Acredita, ela está orgulhosa de ti.
Não, Jessica. Eu estraguei a minha vida, tornei-a na merda que ela é atualmente. Ela fazia da minha vida melhor, era a minha pequena, o meu mundo, a minha fonte de positividade, de felicidade. Ela era tudo. Eu perdi o meu tudo.
-Jessica, tu fazes-me lembrar tanto ela. É como se tivesse a sua alma gémea aqui comigo. Fazes-me sentir como ela fazia.
-Como é que eu te faço sentir? – ela perguntou intrigada.
-Vivo. – encaro-a.
Há um momento de silêncio, estamos ambos um pouco chocados com todas as declarações que tinham vindo à tona hoje.
-Eu sei que é uma pergunta parva, mas... Hoje foi a primeira vez em toda a tua vida que tu me viste? – estava receoso pela resposta dela, sabia como ia magoar.
-Bem, que eu me lembre sim. Nunca te vi aqui na rua nem nada. – ela pareceu confusa com a minha pergunta. – Porquê?
-Curiosidade. – forcei um sorriso.
Ela não se lembrava. Não a culpo, no fundo naquela altura não quis que ela se lembrasse de mim no futuro. E parece que resultou, mas magoa. É como se me atropelassem o coração.
-É melhor eu ir... – eu queria ficar ali e dormir com os braços à sua volta, mas sabia que isso não seria possível. Não novamente.
-Fica. – ouço um sussurro vindo dela, ela está corada.
POV NIALL OFF
O Niall pega na minha mão com delicadeza, e leva-nos até ao quarto. Abro uma gaveta e pego numa camisola comprida o suficiente para não se ver as cuecas, entro na casa de banho e troco-me. Quando chego, o Niall está só de boxers deitado sobre a minha cama.
-Niall... – disse corada, com os olhos fixos no chão.
-Jess, já me viste assim inúmeras vezes, não há que ter vergonha. – ele ri-se. O que quer dizer ele com “inúmeras vezes”?
-Mas só te vi uma vez, hoje no lago... – ele parece arrependido do que disse e rapidamente abana a cabeça negativamente como se dissesse “esquece”. Decido ignorar aquele estranho acontecimento.
-Vais dormir de pé? Pode vir para aqui, eu não te vou fazer mal. – ele sorriu docemente.
-És um comediante incrível. – digo sarcasticamente e ele ri.
Deito-me na ponta da cama e ouço o seu riso abafado contra o meu pescoço, e a sua mão rapidamente me vira para ele, encostando as nossas testas e permanecendo com o contacto dos olhos.
Ele dá-me suaves beijos na testa enquanto diz o quão sou linda e me faz rir com as suas típicas piadas sobre o professor de Biologia, e de cada vez que ele demonstra tristeza no seu olhar, digo que a sua irmã está orgulhosa dele, o que estou certa que não é mentira.
-É verdade? – perguntei.
-O quê? – ele afastou as nossas testas para poder ver a minha expressão.
-Que eu sou a coitadinha da escola, e que não queres saber da morte dos meus pais... – sussurro, implorando novamente por contacto dos meus lábios com o seu peito. Uma sensação familiar.
-Não. – ele disse friamente – Eu estava apenas irritado quando disse isso. Não és coitadinha nenhuma, e sabes que me importo contigo.
-Importas? – digo com um pouco de espanto e alegria na minha voz, retirando os meus lábios que massajavam levemente o seu peito.
-Sim. – ele sorri – Eu gosto de ti.
-Ainda bem, porque eu também gosto de ti Niall. – digo um pouco aliviada por o sentimento ser recíproco.
-Agora dorme, já é tarde. – consigo-o ver a morder os lábios para conter o seu lindo sorriso e antes de fechar os olhos, os seus lábios tocam-me no pescoço e ouço as suas últimas palavras – Boa noite, linda.