Lágrimas e suspeitas

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E Eric começou a falar sua versão do ocorrido.
-Meus pais foram se deitar cedo, como de costume. Acho que não passava das 22:30. Eu estava comendo o meu segundo pedaço de bolo de cenoura quando minha mãe veio me dar um beijo de boa noite na cozinha. - respirou fundo - Foi a última vez que a vi viva. Terminei o bolo e o copo de suco que estava tomando e fui pro meu quarto, fui jogar online um pouco enquanto o sono não chegava. Hábito meu, estava com as luzes apagadas e com fone no ouvido no máximo, acho que foi por isso que não ouvi entrarem dentro de casa.
Eric deu uma pausa, passou a mão em seus cabelos desarrumando-os mais.
-Se eu não usasse os fones com o volume tão alto, talvez... - um choro parecia brotar, sua voz começava a falhar, o nó da garganta já estava feito - Talvez ainda estivessem aqui comigo, ainda estivessem vivos.
Experiente, Fabia sabia que não adiantaria pressiona-lo:
-Leve o tempo que precisar, meu jovem.
Após alguns minutos de respiração profunda e alguns soluços e fungadas Eric retomou o seu depoimento:
-Bom, chegou um momento que o sono chegou, pouco antes da meia-noite. Me deitei e quando estava começando a dormir, acho que cheguei até a começar a sonhar. Acordei quando ouvi alguns baques, abri os olhos logo em seguida porque tinha alguém correndo pelo corredor e ao chegar a minha porta ouvi ela sendo trancada. Estranhei logo de cara, mas tudo aconteceu tão rápido que antes de eu alcançar a porta ouvi gritos de uma mulher, era minha mãe. "Para, por favor, meu marido não, por favor" - dessa vez Eric pareceu não conseguir segurar o choro, lágrimas escorriam de seu rosto - e junto a esse desespero ouvi tapas. Comecei a bater na porta do quarto desesperado, acho que daí que apareceram esses roxos nos meus braços, eu batia o mais forte que podia, precisava saber o que estava acontecendo. Parei quando senti alguém se aproximar da porta, era minha mãe. Ela disse "Filho, fica quieto, ele não sabe que tem mais alguém na casa, filho, por favor, se proteja, liga pra polícia". E essa foi a última vez que ouvi a voz da minha mãe.
Eric precisou de outra pausa para se recompor e poder prosseguir:
-Fiquei paralisado com o que estava ouvindo minha mãe dizer, não sabia o que fazer. Mas fiquei quieto e parei de bater à porta. Me abaixei pra tentar ver por debaixo da porta o que acontecia, gelei ao ver meu pai caído no chão sendo estrangulado por alguém. Vi pouco a pouco seus olhos perdendo a vida, só soube que ele tinha se ido porque notei seu corpo amolecer, os olhos dele continuaram abertos e virados pra porta do meu quarto como se mesmo morrendo ainda quisesse me vigiar, me proteger. Peguei meu celular pra ligar pro 190, e foi aí que comecei a ouvir baques na porta junto aos gritos da minha mãe. A porta quebrou e abriu, não consegui olhar pro rosto do assassino, apenas o vi segurando minha mãe pelos cabelos e pela parte de trás da camisa do seu pijama. - Eric fechou os olhos e deixou mais lágrimas escorrerem por seu rosto - Ele havia estourado a cabeça da minha mãe na porta do meu quarto. Só sai do meu estado de choque parado vendo minha mãe pendurada nas mãos daquele cretino quando a vi sendo jogada no corredor e notei que ele vinha em minha direção. Não sei como, mas consegui me desviar de seu ataque e sair pela porta do quarto e correr até chegar na área da piscina. Ele estava vindo atrás de mim, mas tinha um churrasqueira perto peguei uma faca do jogo que sempre estava perto dela e me escondi embaixo de uma mesa que havia por ali. Quando ele se aproximou da beirada da piscina e deu as costas pra mim, corri e cravei a faca nas suas costas.
-Em qual região das costas? - perguntou a Delegada.
-Perto da cintura, do lado direito.
-Hm, ok. Prossiga.
A essa altura Eric já não chorava mais e estava com o olhar vago lembrando dos momentos que vivera nessa noite que os poucos raios de sol no céu anunciavam o fim.
-Vi ele cair na piscina, não me dei o trabalho de olhar pra seu rosto ou de memorizar alguma característica. O que eu menos queria era eternizar a imagem do assassino dos meus pais na minha mente. Joguei a faca na água também, outro erro meu. Ele a usou mais tarde pra matar o policial.
-Não foi culpa sua, Eric.
-Mas foi consequência de um erro meu.
-Não se martirize, continue.
-Depois disso eu voltei pra dentro de casa e fui na direção do telefone pra fazer a denúncia. Mas vi os meus pais mortos no chão. Acho que comecei a ter ataques de pânico pois lembro de poucas coisas depois disso, as coisas só ficam claras quando a sua equipe chegou lá.
-Ok, então. O Sr. está liberado e como não tinha parentes na cidade liguei para sua tia e ela disse que viria o mais rápido possível e que enquanto isso podia ficar na casa de um amigo, a viagem dela até aqui deve demorar pouco menos de 16 horas. Tem algum em mente?
-Não, posso ficar num hotel, não tem problemas. Preciso ficar sozinho um pouco.
-Se quer assim... Colocarei duas equipes 24h vigiando-o para garantir a sua segurança. Tudo bem?
-Tudo bem. - Eric concordava mas já não a ouvia, estava aflito pensando que não havia contado do seu irmão.
-Ah antes que eu me esqueça, sei que você sabe que não sabemos a localização do seu irmão. Tem ideia de onde podemos encontrá-lo?
-Não, procure pelos bares da cidade. Ele costuma ser bem popular nesses ambientes, passa os fins de semana bebendo com os amigos de boteco em boteco.
-Ok, obrigado, Eric. Flávio, meu secretário, irá lhe guiar até a equipe que o levará até o hotel de sua preferência.
-Certo. Mas antes de ir, tem algo que eu preciso perguntar.
-Pois não. Pode falar.
-Acha que meu irmão possa estar envolvido no crime?
-Bom, sabemos quem foi o assassino. Ele é conhecido como Perdidinho e tem fama de assassino de aluguel. Ou seja, ele foi mandado por alguém. E, por enquanto, todos são suspeitos. Inclusive você, Eric. - a Delegada selou seu olhar intimidante com o de Eric.
Ele saiu da sala quieto, perplexo com as últimas palavras dela Delegada. "Perdidinho, assassino de aluguel", "todos são suspeitos, "inclusive você, Eric". Ela parecia fazer um trabalho rápido e ágil, e isso o deixou inquieto.

Morte à queima-roupaOnde histórias criam vida. Descubra agora