Medos

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Depois do pesadelo, e de ter caído da cama,  Eric havia conseguido dormir mais, e dessa vez foi um sono sem sonhos, apenas um nada. Quando levantou-se já se aproximava das 17, vestiu uma roupa que a delegada havia conseguido para ele já que ainda não havia ido em casa após o ocorrido. Não estava muito bonito, a camisa era branca e bem larga, nela estava escrito "Crack... Não tropece nessa pedra", pelo menos a calça era do seu tamanho e de um jeans escuro.
Pensou em descer para comer algo, mesmo que não sentia fome ele sabia que precisava se alimentar, mas não gostava da ideia de ver outras pessoas que a essa altura já sabiam o que havia acontecido e quem ele era. Numa cidade com pouco 60 mil habitantes as notícias corriam muito rápido.
Se deu por satisfeito em pedir uma omelete de queijo e um suco de maracujá para o serviço de quarto e comer sozinho. A comida não demorou muito de chegar, mas foram necessários uns bons minutos para ele conseguir comer tudo, estava praticamente se forçando a mastigar, comia apulso.
Mal terminou de comer e já foi logo escovar os dentes, ele possuía uma obsessão com seu sorriso, já havia feito diversos procedimento odontológicos. Morria de medo de ter cáries. Passava fio dental antes e depois da escova.
Após tudo sentou numa cadeira na sacada para ver o finalzinho do pôr-do-sol, olhava o céu ficar cada vez menos alaranjado e transitar para um azul escuro e logo em seguida para a negritude da noite. De novo tentava pensar em nada. Tentava ser apenas um observador do surgimento da noite.
-Quase 24h. Quase um dia. - pensou alto.
Quase 24h e Eric ainda tinha dificuldades em aceitar, em ao menos acreditar.
A noite chegou e a temperatura começara a cair, com frio Eric entrou no quarto novamente. Já se aproximava das sete da noite. Sua tia já devia estar chegando, mais uma ou duas horas e ela chegaria. Catarina era sua única tia, Eric gostava bastante dela, ela sempre o mimou bastante. Alguém que Eric não gostava era de Tarsila, simplesmente não a suportava. Ele sempre a vira como uma intrusa na família.
Ele não entendia como alguém tão legal como Tia Cátia - não o porquê, mas era assim que ele e Marcos a chamavam desde pequenos - pudesse ter pensado em adotar uma menina tão chata. Na realidade, Eric não entendia como alguém como Tia Cátia havia considerado adotar, afinal ela podia engravidar, não era estéril.
Tia Cátia era uma pessoa que Eric nunca entendera, ele nunca havia visto ela com algum namorado ou sequer falando de algum. Talvez agora ele estivesse começando a entender, nas últimas horas ele acabara de perder a vontade de casar, e tinha certeza que se fosse uma mulher também teria perdido a vontade de engravidar. Mas ainda sim, ela não havia passado por isso na sua infância ou na sua adolescência.
Ele tinha medo do que veria se ligasse a TV, tinha medo de como olhariam pra ele se descesse para a área comum, tinha medo de dormir e ter outro pesadelo. Então, Eric passaria as próximas duas horas nessa reflexão de tentar entender sua tia enquanto aguardava sua chegada. Mal sabia ele da surpresa que o aguardava. Uma surpresa que inicialmente seria claramente indesejada por ele. Inicialmente.

Morte à queima-roupaOnde histórias criam vida. Descubra agora