Intolerância à alfa-galactose

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Me divirto com essa idéia. Cruzo as pernas e olho para os olhos do peixe à minha frente. São crustáceos refinados e mergulhados em molho remoulade e isso revira meu estômago.

-Ah não, Paul.

-O que houve?

-Sou intolerante a frutos do mar.

-A frutos do mar?- sua voz fica gozada e suave de repente.

Qual a graça?

-Sim- bufo, sorrindo. – Esqueci de te dizer. Não sabia que você tinha pedido isso.

-Sempre é bom saber- ele pisca, girando os dedos para o alto.

O gesto é rapidamente compreendido por um dos bem-vestidos rapazes.

-Adam.

-Senhor? - ele ziguezagueia entre as mesas.

-Minha acompanhante é alérgica a crustáceos. Tire o molho remoulade.

Adam balança a cabeça. - Claro, senhor. Pedirei para trazerem novamente o cardápio.

Ele recolhe o alimento com maestria. Ouço-o sair às pressas, e me viro de volta para Paul. Ele inclina-se para frente.

-Qual é seu desejo agora?

Estou debruçada sobre minha mão tranquilamente, e me sinto petulante por isso. Ajeito-me:

-Um prato simples.

Outro garçom retorna e Paul ainda não perdeu a graça. Grudo os olhos no cardápio.

-Aceito um croissant- falo depois de alguns segundos. -De legumes e queijo.

-Vegetariana?

Nego.

-Intolerante à alfa-galactose. Um tipo de açúcar presente na carne vermelha.

Ele então para de rir e é bastante ousado, porque coloca a mão em meu rosto.

-Você é realmente diferente, garota.

-Você não faz ideia do quanto- falo com menor fôlego.

-Não precisa comer se não quiser.

-Humm.. Mas eu quero.

-Tudo bem.

Paul tira a mão que ficou em meu rosto.

Eu vou ao banheiro.

Pelo rubor que vejo agora no reflexo do espelho, parece que estive brincando com fogo e queimei as pontas dos dedos. O que está acontecendo? Ando até a primeira porta sanitária, acuada, refletindo se vivenciei algum momento tão intenso como esse alguma vez na vida.

....

-Intolerante à alfa-galactose?

-Pois é.

-Eu não sabia disso, Chanel.

-Vivemos muito pouco tempo.

-E este homem? Quantas horas já passou com ele? Duas?

-Fora o destino. Me deixe.

-Espero que este homem faça isso com você também. A deixe.

Deslizo para dentro da cadeira, embora eu me sentisse mais à vontade no olho da rua. Convincente, respondo suas perguntas à altura, da mesma forma que ele o faz, me olhando com graça.

-Tudo bem com você?

-Estou bem- murmuro.

-Bem mesmo?

-Sim. Por que a especulação?

Espio o desconhecido à minha frente. Ele sorri com encanto para mim, e logo emendamos uma conversa sobre a família, o porque de fato vim a Chicago, porque minha mãe estava com o quarto namorado e porque, novamente, eu havia corrido atrás dele. Paul insistia nessa pergunta, e não deixei por menos. Insisti:

-Por que se preocupa com isso?

Ele franze o cenho. – Não me preocupo. É apenas curiosidade.

Ah sim. Curiosidade. Até o momento, nenhum de nós parecia apto a cortejar o próximo com mais de uma carta. Sendo assim, dou um sorriso e corto um pedaço do croissant para levo-o à boca. Mastigo devagar antes de responder.

-Achei que você tinha perdido seu dinheiro- digo.

Paul ri. - Chanel, você sabe que aquele dinheiro não era meu. Usou ele apenas como argumento para conversar- ele inclina a cabeça. -Por que veio atrás de mim?

Certo. -Quer mesmo saber?

Ele passa a língua pelos dentes. - Por favor, Chanel.

-Isso vai te decepcionar- aponto.

-Está me deixando empolgado.

Dou um sorrisinho:

-É sério, Paul. Eu não sei.

-Aposto que sabe.

Nossa. Ele é tão ou mais tenaz que eu. Por que insiste nisso?

Eu havia ido atrás de Paul por um único motivo: fiquei estranhamente intrigada. Era apenas isso somada a uma porção de curiosidade e encanto pela sua impecável postura, mas agora havia algo nele que me prendia totalmente, como se Paul tivesse um ímã que o ligasse a mim, ou talvez, neste caso, que me ligasse a ele.

-É claro que você sabe, Chanel- ele repete.

-Podemos conversar sobre isso lá fora?

Paul parece não entender. -Quer ir lá fora?

Levo os dedos aos lábios para limpar o resto do alimento que possa ter ficado.

-Quero.

....

Uhuull...

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⏰ Última atualização: Jul 04, 2016 ⏰

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