Cidadela Alta de Arthor. Ao amanhecer.
Poucas coisas realmente incomodavam Chuck, poucas coisas o faziam realmente refletir. Mas depois daquele dia, sentado na varanda de seu quarto, tudo que o aprendiz de mago queria fazer era processar aquele sem número de informações que passeavam em sua mente.
Havia uma imagem principal, que por algum motivo não saia da mente do príncipe. Os olhos do draconato. Era como se já os tivesse visto, se já tivessem caminhado juntos, como se já tivessem lutado lado a lado incontáveis vezes.
- Besteira. Pensou alto.
Chuck se arqueava na varanda enquanto observava o sol despontar no horizonte azul, não havia conseguido pregar os olhos a noite inteira. O draconato, o atentado no antro, era muita coisa pra se pensar. O peito ainda doía pelo ferimento feito pelo golpe de Summers Hans, mas nada doía tanto quanto o ego, pela derrota.
Os pensamentos foram interrompidos por uma voz na porta. Era Sir Rohaan, comandante da Guarda da Guilda. Moreno, um queixo pontudo, vestindo a tradicional armadura completa da guilda, placas de metal reforçadas e elos entrecortados nas juntas.
- Príncipe, precisamos do Senhor no porto. – a voz era grave, porém cordial.
- Meu pai não pode bajular esses lordes enquanto eles vão embora? Pensava que esse era o papel dele. – Caminhou até um armário e pegou algumas roupas.
- Desculpe, senhor. Mas Howard ainda está conversando com o draconato e parece que não vai terminar tão cedo.
- Eu entendo. Se pudesse estaria lá também, você também não ficou curioso com essa história? Ouvi falar que um de seus ancestrais lutou ao lado de um daqueles durante a Era das Correntes. – Chuck esboçou um sorriso, os dois se conheciam desde a adolescência, não havia motivos para formalidades.
- Sim. A Lança Rubra de Arthor, um dos membros da minha família, lutou ao lado de Salazar Black, durante a Era das Correntes, até onde sei, foi morto as margens do Rio Sulfur. – Rohaan se acomodou em um ponto do quarto enquanto Chuck se trocava.
- Draconatos. Eu entendo pouquíssimo sobre eles, quase nada pra falar a verdade. Você deve saber algo. Conte-me. – Abotoou o longo traje acinzentado da Guilda.
- Sei muito pouco também, senhor. Conheço as histórias, li os livros, mas nunca havia visto um de perto. Diria que eles são mais intimidadores do que pensava. Não são como os meio-dragões, misturas bizarras de homens e seres dracônicos, frutos de rituais de bruxos doentios. São criaturas nobres, descendentes de linhagens antigas. Sangue nobre. – pontuou o comandante.
- Sangue de dragão. Conheço essa parte da história. Deve ter sido honroso lutar ao lado de um deles e no minimo perigoso.
- A dinastia Black dominou essas terras por setecentos anos. Muito da nossa cultura, costumes, modo de batalha, até nossos pratos mais conhecidos, têm influência deles. – Rohaan levantou, caminhou até a varanda. – Essas muralhas, os castelos mais antigos, todos foram erguidos na época em que eles reinavam. E mesmo assim, eles caíram, seus castelos, cidades, templos e cidadelas. Hoje estão abandonadas.
- Todo chama um dia se apaga, Sir Rohaan. – Estranho, quando olhei nos olhos daquele draconato, senti como se o conhecesse, de longa data. – Chuck terminou de se vestir.
- A noite de ontem foi confusa para todos nós, príncipe. Lorde Òrion está esperando no porto, melhor nos apressarmos.
- Não sei pra você, Sir, mas pra mim esses últimos dias foram no mínimo estranhos. – Disse Chuck enquanto caminhava em direção a porta.
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Lembranças de um deus caído
FantasyNikki é o último de sua estirpe. O último draconato vivo no mundo conhecido. Sem lembranças do passado, a única informação que ele tem é que sua linhagem descende de uma família poderosa e muito antiga. Em um mundo regido por leis de aço e magia...