Capítulo Um

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    A angústia me corrói o cérebro. Ser vivo,  creio que tem tentáculos, que pressionam e impedem o raciocínio.

Durante toda a vida eu fui responsável por uma inteligência que joguei fora.

Considerando-me a frente do meu tempo, brinquei de amores e de coleções de homens.

Deitei-me como bicho, no mato... Por amor...

Amores que duravam um noite, uma hora...

Eu era a namorada que os homens tinham na escuridão da noite... Não podia ser mostrada, pois era feia... E segundo diziam, gostosa.

Essa mesma escuridão me levou para a estrada... A longa rodovia BR 116.

Sem emprego, sem pensão alimentícia e com três filhos menores para criar, essa foi a versão plausível para mascarar um desejo... Descobrir quanto vale um ser humano. 

Meses atrás, eu havia recebido uma proposta de um ser que pretendia ser garoto de programa.

Essa pessoa teve um importante papel na minha queda.

Com a coragem e a determinação de saber o que queria me dirigi a uma pessoa que sabia como funcionava o esquema. E fui.

Eu nunca havia aceitado sequer um presente de um homem... E agora eu deveria saber  quanto pedir por mim, por quanto eu deveria me vender, sendo que em noventa por cento dos casos, era pedido um desconto.

E a partir dali, cem quilômetros de estrada me aguardariam todas as noites, dependendo de caronas de desconhecidos que eu quase nunca revi pelos meus caminhos.

Um vestido inadequado... Saindo de um casamento, separada há poucos meses, só possuía roupas decentes.

Decentes, as roupas... Pois a conduta era muito pior do que a das prostitutas que conheci nos dias de trabalho.

Sempre discordei da trilogia "Nunca matei, nunca roubei, nunca me prostitui...".

Conheci sofrimento e responsabilidades de mulheres que nunca tiraram um centavo a mais da carteira de seus clientes. E que nunca poderiam ser comparadas a um ladrão ou assassino.

Ladras? Havia sim, como em toda profissão.Essas roubavam por safadeza, não por serem prostitutas. Seriam simplesmente ladras em qualquer lugar.

A separação fora por uma vida dupla... Vivi durante cinco anos com dois homens. Por ser safada?

Não sei... Justifiquei por muito tempo que foi por ser bondosa... Faz-me rir... Eu pensava que o meu marido não sobreviveria sem mim.

Vivi com um santo? Não. Fui surrada, traída... Das traições eu não gostava... Das surras, sim.

E passei a ter orgasmos apenas se apanhasse... Se tivesse tapa na cara, puxão de cabelo e violência. As dores me levavam às nuvens.

E aprendi a ganir como uma cadela. Hoje eu não tenho vida sexual. Mas se eu fosse um homem, teria medo de ir para a cama com uma mulher escandalosa como eu era.

Palavrões também teriam que ser constantes.

Com essa escola sexual, seria fácil, eu pensava...

De vestido comprido e mochila de regueira, com toalha, sabonete, gel, preservativos e um aparato de coisas que me disseram necessárias, fui para a estrada.

Na carona de ida, não tive coragem de dizer qual era o intuito da viagem. E me senti perdida.

Não consegui clientes. Mas na volta, nem lembro rosto, cor, de onde vinha, nem para onde ia... Meu primeiro programa...

O preço... Trinta reais, sem anal, pois tenho traumas, vindos de uma primeira vez, sodomizada com os braços torcidos para trás, sendo rasgada e passando dias e noites de dores lancinantes, pois em casa, eu tinha que dizer que era virgem.

O desconto, é claro, foi pedido. Sempre eram trinta reais que se transformavam em vinte. Esse era e talvez ainda seja, o preço de um ser humano na estrada. Não foi muito sacrifício...

Com bons professores e rasgados elogios no oral, a tarefa foi cumprida rapidamente. E recebi os primeiros vinte... O meu primeiro preço... O mesmo preço que o pretenso garoto de programa me pedira meses antes.

Fui para casa, dormir por algumas horas. Depois que o dia amanhecesse e o cansaço da noite sem dormir pudesse ser mascarado, havia a segunda parte... Os cabarés de quinta categoria me esperavam.


ROAD WOMAN A Vida de Uma ProstitutaOnde histórias criam vida. Descubra agora