Alan

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Segunda - 11 de Julho de 2016 - Noite

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Segunda - 11 de Julho de 2016 - Noite

Não queria ir pra casa naquela noite. Tudo naquele apartamento lhe lembrava de Patricia. Não queria voltar a beber, jamais, depois do episódio de quinta passada no cemitério. Vontade não faltava, mas não ia se entregar assim a um vicio que nem existia a menos de um mês. Rumou pra delegacia, parou seu carro a duas quadras dali, subiu pra sua sala, que agora estava usando com frequência suficiente pra chamar de 'sua', mesmo sendo uma sala genérica e fria como outra qualquer ali. Sentou-se e checou o celular.

Havia mandado uma mensagem para a irmã na noite anterior. Estava tudo bem com ela o marido e suas sobrinhas, isso era um alivio. Desde o episódio no cemitério vivia cada hora como se fosse perder alguém. Algum colega de trabalho era a segunda opção, talvez Murilo seu chefe ou sua amiga legista Gabriela. Teria o homem de preto se enganado?

Seu pai, sua mãe, Fred. Em todos os casos ele tinha visto o Homem e em todos os casos a morte havia vindo certeira como uma flecha em poucas horas. Ainda estava abalado por essa ultima aparição, a perseguição de vultos no cemitério... que loucura. Tudo que queria era um café e algo para ocupar sua mente, um pouco de trabalho.

Sobre sua mesa estava um pen drive envolto em plástico transparente com um papel grampeado onde estava escrito: Rua X, São Judas Tadeu. Monitoramento dia 6 de Julho. 4 horas antes e depois das 22:35.

Sabia que era o vídeo que requisitara.

Alguém ligou de um orelhão nesta rua informando que o homem debilitado que havia sido encontrado era Michel Hudson. Quem informou a policia estaria ligado de alguma forma com o sumiço e possível cárcere da criança por todo esse tempo? Ou teria ajudado em sua fuga?

Plugou o pen drive no seu notebook. Sentia falta dos vídeo cassetes, ainda tinha um empoeirado em algum lugar daquela delegacia. Tudo agora era digital e chato.

Levou o vídeo para o meio, faltando 30 minutos para o horário da ligação. O Orelhão nem estava na rua da câmera. Estaria se não fosse um grande sobrado construído na esquina. Carros, muitos carros.

Quinze minutos para a ligação acontecer e alguns moleques passam, dois a pé, um de bicicleta amarela. Alan desacelera o vídeo, redobra atenção. Dois minutos antes, o moleque na bicicleta amarela volta a entrar em foco, usa um boné nike azul e laranja, virado para trás. Alan pausa a imagem, envia a imagem para a impressora e faz duas copias. E ele. Continua o vídeo. O garoto vai em direção ao orelhão. 22:35 da noite, Alan fica na expectativa. Um minuto depois o garoto dobra a esquina olhando para os lados, pedala em pé e some.

_Te peguei! – balbucia Alan.

Ele se levanta e vai buscar as folhas na impressora. Teresa está lá esperando alguns documentos serem impressos, observando contra a luz a impressão de Alan.

_Achou algo detetive?

_Acho que sim. Espero que sim.

_Se quiser verifico se há alguma queixa de roubo de bicicleta parecida...

Teresa dava em cima de qualquer um, mas para Alan ela falava serio com ele, vinha sempre com pequenas gentilezas e olhares que sinalizavam algo a mais.

_Obrigado, não precisa.

Alan passou na cozinha e pegou uma xícara de café, em seguida voltou pra sala em que trabalhava, o vídeo ainda rodava no notebook, a rua escura, a marcação do tempo era 22:52.

Abriu seu armário, retirou a foto das costas de Michel. Até agora sabiam que o menino havia sido sequestrado e pelas marcas, mantido em cativeiro e recebido maus-tratos por todos esses anos. Mas aqueles números... Alan pensou que seria uma espécie de identificação, mas eram números muito longos. E o fato do garoto reaparecer dentro de um guarda roupas, nas mesmas circunstâncias em que sumiu tornava tudo uma espécie de piada. Enviou um e-mail para Murilo com a foto do garoto na bicicleta em anexo, foi breve.

Este é o cara que fez a ligação avisando a policia que o Nárnia internado no Hospital Municipal era Michel Hudson. Pode emitir a busca pra mim? Agradeço.

Quando voltou a tela abaixo era 23:02 no vídeo. Um homem de preto atravessava a rua vindo do lado oposto a esquina, chapéu escuro, face nublada e o andar tranquilo para trás.

Alan deixou a xícara cair e cuspiu parte do café por entre os dentes. Seu estomago se contorceu de dor quando se ergueu de súbito com vontade de correr dali, mas conteve-se, apoiou na mesa arfando, olhando para a tela do note. Aquilo era real? Estava na gravação?

Teresa apareceu na porta preocupada

_Tudo bem? Escutei gritar!

_Eu... derrubei minha xícara. Só isso.

Teresa o olhou desconfiada.

_Hum, vou pegar algo para limpar isso.

Se o Homem que anda para trás apareceu nas imagens ele é real, essa é a prova que ele é real, se eu voltar o vídeo, ele vai estar lá novamente – pensou – se ele estiver lá eu não sou louco.

Retrocedeu o vídeo até 22:50.

A mesma cena da esquina vazia a noite. Esperou impaciente contando os segundos.

Meu Deus – lá estava o homem novamente. Seu coração acelerou e ele andou de costas assustado até encostar na parede. O Homem desapareceu da cena e quando Alan olhou pro lado, Teresa o olhava com ar de preocupação e um pano úmido nas mãos.

_Alan!? Esta tudo bem mesmo?

Consternado ele disse que precisava descansar apenas. Fechou o note e guardou o pen drive e fotos na sua pasta enquanto Teresa o observava.

_Toda esse trabalho... Fiquei sabendo de sua esposa... Alan, se quiser conversar!

Tudo que ele menos queria agora era falar de Patrícia, ainda mais com Teresa.

_Obrigado Teresa, talvez um outro dia... – saiu apressado.

Desceu as escadas e voltou pro carro. Sabia do que precisava, relaxar. Já estava tarde e não queria pensar naquilo que tinha visto no vídeo. Dirigiu até um Motel onde a recepcionista estranhou a entrada do rapaz sem acompanhante. Pegou um quarto barato e subiu. O que ele precisava estava li, limpa e pronta pra ele, uma hidromassagem e ninguém pra encher o saco.


12 de Julho - Manhã

Havia esvaziado sua mente e dormiu um sono sem sonhos até seu celular tocar as dez da manhã.

Era seu chefe, Murilo.

_Alan, onde você esta? – gritou do outro lado da linha

_O que aconteceu? – perguntou em resposta, ainda sonolento.

_Preciso que venha pra cá imediatamente, o ex Delegado Rodrigues foi atacado ontem a noite em sua casa no Urbanova.

_Rodrigues? – Sua mente rápida fez a conexão. Onde estaria aquela ex-babá nesse momento? Teria voltado pra casa?

_Ele esta morto Alan. Tem algo a ver com seu caso, do menino de Nárnia.

_Michel é o nome dele chefe!

_Isso, esse ai. Estou te mandando uma foto e minha localização, venha rápido! – Desligou. Em seguida o celular apitou o recebimento dos arquivos.

A imagem mostrava as costas do ex delegado mutilada. Tinha muito sangue pra ler com clareza a mensagem, mas Alan soube de imediato que era mais uma sequencia numérica semelhante a gravada nas costas do menino Michel.

Onde dorme a escuridãoOnde histórias criam vida. Descubra agora