Treze - Banida

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Papai não parava de gritar para que Allison se afastasse, mas ela se preocupava comigo mais que tudo, e mesmo com papai puxando-a pra longe de mim, ela tentava ao máximo me alcançar.

Eu não entendia o que se passava, não acreditara realmente a história absurda de Tyler, mas naquele momento, com o gosto do sangue da Alli ainda em minha boca, eu não poderia estar mais aterrorizada.

Mamãe apareceu, e quando me viu eu só pude ver ódio e repulsa em seu olhar.

- Victoria, tire-a daqui!

Minha mãe não demorou a segurar Allison e arrastá-la pra fora do quarto, mesmo que sob protestos. Eu não sentia mais dor, apenas medo. Medo da forma como meu pai estava me olhando. O que ele poderia estar vendo que seria tão aterrorizante?

Eu encarei o espelho do meu armário e não me vi ali. Tudo o que conseguia enxergar era um monstro. Caninos afiados e compridos, olhos estranhos escurecidos e estrias negras à sua volta. Eu gritei.

- Pai! O que tá acontecendo comigo?!

- Annya, o que aconteceu naquela festa?!

Eu me encolhi, chorando, meu pai se aproximou e tudo o que eu conseguia ouvir eram os batimentos do seu coração e o sangue correndo, aumentando o desejo que se instalou permanentemente dentro de mim, mas dessa vez eu não tinha o controle do meu lado. Eu o ataquei.

Mordi seu braço no momento em que ele tentou tocar em mim. Ele gritou e eu o larguei, assustada comigo mesma. De repente minha mãe retornou carregando uma besta armada com estacas. Se papai não tivesse se posto no caminho, ela certamente teria atirado em mim.

- Victoria, não! Ainda é nossa filha!

- ESSE MONSTRO NÃO É MINHA FILHA!

Aquilo doeu mais do que a estaca poderia ter doído. Ela me encarou com repulsa e atirou, mas quando eu me movi para não ser atingida, em milésimos de segundo, eu estava em cima da cama e a estaca cravada no carpete.

- Não! – Papai berrou, segurando a mão da minha mão, para que ela não recarregasse. – Não vê que ela não sabe o que está fazendo?! Ela não tem ideia do que está acontecendo...

- Não me importo, Chris! Ela é um monstro e nós matamos monstros!

- O que?!

Então estava entendendo aquela conversa. Meus pais eram matadores de monstros. Eu me perguntei se vampiros não eram as únicas criaturas sanguinárias que existiam.

Eu conseguia ouvir os berros da Allison, trancada no banheiro de visitas. Eu conseguia ouvir a campainha do vizinho, eu conseguia ouvir os barulhos do trânsito na rodovia ao longe. Mais do que ouvir, eu sentia o cheiro de tudo. E eu estava absurdamente assustada com aquilo e mais assustada eu fiquei quando ouvir a porta da frente abrir.

- Tem alguém na casa!

- Sou só eu. - Eu ouvi o sussurro de Tyler. – Se eu soubesse que você era filha de caçadores eu nem tinha me aproximado de você. Mas já que o estrago já foi feito... – De repente ele estava no quarto. – Eu to aqui pra te dar cobertura.

Mamãe gritou e papai se colocou a frente dela, depois de pegar a besta de suas mãos e apontar para o rapaz.

- Quem é você?!

- Argent, não é? Eu estou aqui para ajudar sua filha, fui eu que a transformei...

Meu pai atirou e Tyler segurou a estaca, antes que ela o atingisse.

- Eu sabia! – Berrava minha mãe, enquanto meu pai engatilhava outra estaca. – É claro que foi um garoto, e aposto que foi na festa de ontem!

- Exatamente. Eu não sabia dessa história de família caçadora... Foi só um infeliz engano.

Eu estava encolhida na cama, tão nervosa que estava tremendo. Eu só conseguia encarar o braço do meu pai que ainda sangrava, mas eu estava nervosa demais pra me mexer. Eu apenas ouvia a conversa mais estranha da minha vida.

- Não quero mais saber! Quero esses monstros mortos!

Mamãe não parava de berrar.

- Victoria, se acalme. – Papai se voltou novamente para Tyler, ainda apontando a estaca para seu peito. – Você disse que está aqui pra ajudar, Annya?

- Chris, Annya está morta! Ela não pode ser ajudada!

- Me recuso a aceitar isso, Victória! – Meu pai berrou e ele nunca foi de berrar, isso me fez encarar seu rosto. – Eu sei que você não a quer mais aqui, mas ela ainda é nossa filha, eu não vou matá-la! Tyler, não é? Pois bem... Ajude-a, tire a daqui.

- Pai, não me mande embora... Eu juro que não vou mais te atacar.

Eu chorava.

- Você é uma recém-criada querida, você não tem controle suficiente. É perigoso ficar. Não só pra nós, como também pra você. Temos amigos que não aceitariam tão facilmente. Sinto por isso, mas você tem ir embora.

- Me poupa desse discurso, Chris. Ela não é mais nossa filha, ela nem mesmo está viva, ela é um cadáver ambulante à beira de um colapso nervoso.

- Não me importa... Eu ainda vejo a garotinha à quem ensinei à atirar...

Mamãe revirou os olhos.

- Tá, faça o que quiser! Mas e a Allison? Nos esforçamos demais pra mantê-las fora desde mundo, até que chegasse a hora certa, e ainda não chegou!

- Eu já ia falar isso... Tyler, pode me fazer um favor?

- Claro.

E assim, ele apagou a memória da minha irmã e implantou uma nova. Eu fui mandada para um colégio interno, onde eu aprenderia disciplina. Eu não ataquei seu pé, eu não me transformei num monstro, eu não mordi nosso pai, eu não fui mandada embora de casa na companhia de um vampiro desconhecido.

Eu não estava morta no coração da minha mãe e perdida no do meu pai. Eu só estava me disciplinando longe de casa. No fundo, não era tudo uma grande mentira. No fundo eu teria mesmo que aprender como tudo isso funcionava, ou eu acabaria enlouquecendo.

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