A carta

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A noite seguiu da melhor forma possível. Muitos amigos dos mais pais já tinham ido embora lá para as 2 da manhã. Meus amigos e eu éramos os DJ's da minha própria festa. Colocávamos as músicas que queríamos, dançávamos como se estivéssemos sozinhos nos nossos quartos, e até Adam caiu no embalo daquele sábado à noite.

A manhã seguinte foi uma das melhores da minha vida. Várias declarações nas minhas redes sociais, meus amigos e parentes mais queridos ali perto de mim (ainda faltava muita gente, mas os que estavam ali sentiram a energia positiva que percorria em minha casa).

Exausta da noite anterior e de abrir os presentes, à tardezinha minhas tias e amigas da minha mãe começaram a fazer as perguntas que costumavam fazer só no final do ano: "e os namoradinhos?". Entretanto, dessa vez foi adaptada à situação.

- Katherine, agora fala pra gente quem é o rapaz que dançou a valsa com você ontem? - minha tia Susan, que sempre foi mais pra frente, fez questão de perguntar.

Senti minhas bochechas esquentarem diante dessa pergunta. Não havia muito tempo que eu tinha percebido o que sentia pelo Adam, e parecia que outras pessoas já o tinham feito antes de mim.

- Ah, tia... É um colega de classe - disse com a cabeça abaixada para não demonstrar meu rosto corado.

- Vocês dançaram tão lindamente. - foi a vez da tia Adeline comentar - Minha parte favorita foi aquela que vocês quase se beijaram, quando ele abaixou você que nem nos filmes.

- Seu pai ficou uma pilha, filha. Você tinha que ver! Os ciúmes estavam estampados na testa dele. - essa notícia me surpreendeu. Sabia dos ciúmes do meu pai, só não sabia até onde ele iria

- Realmente eu perdi essa ao vivo, mas tenho certeza que alguma amiga minha deve ter filmado uma parte que ele estava assim - respondi depois de pensar como meu pai poderia estar vermelho com esses ciúmes.

Os comentários sobre a reação de cada tio, avô e primo meu foram discutidos por esse grupo de mulheres que eu tanto admiro. Fiquei lá escutando as suposições sobre o que cada um pensou até o cansaço bater mais uma vez. Meus olhos pesavam e meus pés ainda doíam pelos saltos que usei a noite toda.

Me retirei e fui ao meu quarto, na tentativa de tirar mais um cochilo. Mas ao me deitar, lembrei de Adam. Lembrei do que sentira por ele durante a valsa. Lembrei de como ele havia se tornado meu ponto de equilíbrio. Lembrei da sensação de ter ele tão perto de mim, com sua boca a centímetros da minha. Lembrei da carta que ele me deu e que até então não tinha lido.

Dei um pulo da cama e comecei a procurar a carta entre os papéis de presente rasgados e jogados no meu quarto. Então um arrepio subiu na minha espinha quando não o encontrei e pensei na possibilidade de alguém já o ter lido, de o ter jogado fora junto com a primeira remessa de papéis de presente ou de eu o ter esquecido no salão de festas.

Onde estava aquela maldita carta? Que cor ela era mesmo?  Ah, sim. Amarela com flores. Vamos lá, eu tinha que encontrar a carta.

Tive que arrumar todo o meu quarto para encontrar a carta no lugar mais óbvio que ela poderia estar: embaixo da minha cama.

A abri e logo me deparei com a caligrafia de Adam. A letra dele era incrivelmente bonita para uma letra masculina. Bonita e decifrável. O que era bem raro entre os meninos da minha sala. Resolvi ler logo e matar a curiosidade que já estava me matando.

"Aos doze anos, vi você, uma menina novata no colégio, entrar pela porta. Tinha os cabelos curtos e escuros, olhos castanhos mais lindos que qualquer céu azul e um sorriso encantador"

Parei de ler e olhei para o teto, agarrando a carta com minhas duas mãos e a pressionando contra o meu peito. Ele gostava de mim desde quando eu entrei no colégio? Como eu não percebi isso? Eu realmente tinha sido tão cega à esse ponto?

De cara, me emocionei. Ele guardara aquele sentimento no oitavo ano para si. Comecei a imaginar coisas. O futuro, o pedido, a casa, os filhos, as brigas, as reconciliações. Sim, eu fui longe demais no meu pensamento para a primeira frase da carta. Não sabia se ele ainda sentia o mesmo. Quem sabe, eu tenha me tornado somente a melhor amiga dele depois desses 3 anos. Imaginar um futuro para mim e para Adam, naquele instante, era pular de um penhasco à beira mar mesmo não sabendo nadar. Continuei lendo a carta:

"De cara tornou-se para mim a mais bonita da turma. Mas para aqueles que veem além da beleza, o fator que mais torna uma menina encantadora é seu caráter interior, seus princípios, sua verdadeira personalidade. Então pensei comigo mesmo 'preciso conhecê-la, preciso dizer o que sinto'. Por muito tentei, mas não consegui.

Os anos se passaram e com eles fui entendendo sua personalidade, seus ideais, fui percebendo que você talvez não fosse como eu pensei, mas mantive meu sonho vivo. Até que num belo sábado a oportunidade encontrou o tempo e depois desse dia, eu finalmente te conheci de verdade, da forma como eu queria e finalmente pude confirmar que seu interior chega a ser mais bonito que toda infinita beleza que vejo cada vez que olho seu rosto.

De sempre para sempre, nunca esqueça desse momento."

Eu entrei em estado de choque. Não me  mexia e só olhava fixamente para as letras desenhadas naquele pedaço de papel.

Aquelas palavras provocaram um sentimento indescritível em mim. Eu sabia que se dissesse à ele que correspondia o sentimento, seríamos felizes, mas não facilmente. Nada é fácil, por que começar um relacionamento com alguém que guarda um sentimento tão lindo por mim há 3 anos seria fácil? A vida daria um jeito de complicar.
Mas sabia também que se eu não dissesse, os "e se" da vida me perseguiriam.

Não existia muita coisa para me impedir de revelar o que sentia, na verdade. O medo de dar tudo errado era o meu maior obstáculo. Dar errado o que? Eu não sei. Mas as coisas deram erradas com o Christian, por que não com o Adam?

Passei cerca de uma hora no meu quarto pensando no que eu faria em relação à carta. Decidi que revelaria o que sentia também, com muita relutância; só não sabia como, nem quando. Só sabia o quão feliz eu estava em saber que era recíproco.

CLEAN [Projeto 1989]Onde histórias criam vida. Descubra agora