Eu nunca pensei que bater o cotovelo seria a pior dor do mundo.
Caralho.
Entrei em pânico por um segundo procurando por Kelley, querendo saber se ele estava bem. Atiraram em nós. Não foi um tiro aleatório, com toda a certeza. Porra, eu estive tão, tão, perto da morte. Mas não poderia suportar pensar na morte do homem ao meu redor.
Kelley me manteve presa no chão, com o corpo jogado em cima do meu em uma espécie de armadura. Seus olhos buscavam de onde tinha vindo o tiro no estacionamento deserto.
- Você está bem? - Sussurrou logo acima da minha orelha.
Balancei a cabeça dizendo que sim.
- Ótimo. Fique abaixada.
Ele agachou atrás de um carro, virando lentamente a cabeça para ver a frente. Sua mandíbula estava rígida, sua postura corporal ameaçadora de um jeito que nunca tinha visto antes. Sua mão foi para a parte de trás do jeans, tirando de lá uma arma preta. Sufoquei um arquejo. Seus dedos voaram para seus lábios, gesticulando para que eu ficasse quieta. Balancei a cabeça e me arrastei silenciosamente para o seu lado.
- Vou checar a área. - Kelley disse com os lábios sem emitir uma palavra. - Fique aqui.
Ele se pôs de pé em um salto, e desapareceu da minha vista. Eu estava tremendo tanto que poderia jurar que o chão estava se abrindo abaixo de mim. Medo, raiva, choque. Tudo percorria o meu corpo de uma só vez e tive que me segurar para não quebrar e não emitir qualquer som. Me enrolei em uma bola, com a cabeça entre os joelhos e comecei a contar mentalmente as batidas aceleradas do meu coração.
Uma mão pousou no meu ombro e eu dei um grito até perceber que era Kelley.
- Vamos sair daqui.
Segurei sua mão e mal senti minhas pernas enquanto ele nos conduzia até um Toyota prata e velho e me enfiava no banco do passageiro.
- O que aconteceu? - Perguntei com um fiapo de voz.
Seu rosto estava muito tenso e ele dirigia rápido mas eu não sabia para onde estávamos indo.
- Não sei, Anna. Só sei que precisamos sair daqui.
- O que aconteceu? - Minha voz saiu mais alta dessa vez.
- Eu gostaria de saber, porra, mas também não sei! Era para nós o tiro mas não nos mataram, e poderiam, acredite em mim.
- Meu Deus - Choraminguei.
Quase uma hora depois Kelley entrou em um hotelzinho barato de beira de estrada e pediu um quarto. Era simples, realmente simples, e fazia a Pousada parecer um hotel cinco estrelas.
- Você deveria tomar um banho e descansar.
- Tudo bem.
Peguei a bolsa que por sorte consegui tirar do Honda antes do ataque e me arrastei para o chuveiro. Joguei as roupas em um bolo desordenado no chão e entrei na água escaldante. Podia ver minha pele ficando vermelha mas não ligava. Puta merda. Onde eu me meti? Não que me arrependia de ter conhecido Kelley, de modo algum. E se eu tivesse nos colocado em perigo com todas as mensagens e ligações? Eu poderia ter colocado não só ele e a mim mas todos os nossos amigos também. Parabéns, Anna.
A porta se abriu, interrompendo meus pensamentos agitados e assustando-me.
- Hey - Kelley disse baixinho.
Em um segundo suas roupas estavam no chão ao lado das minhas e ele entrava na banheira estreita jogando água para todos os lados. Me aninhei em seu peito grande e de certa forma reconfortante, ouvindo as batidas de seu coração que agora me pareceram tão frágeis. Um soluço escapou de mim seguido por outro e mais outro e lágrimas incontroláveis. Eu chorei por minhas ações burras, impensadas, pela vida de Kelley que eu poderia ter perdido, pela minha própria vida. Sua mão afagava carinhosamente o embaraço dos meus cabelos, murmurando palavras doces. Seus braços estavam em mim, a única coisa que me segurava, como uma âncora.
- Eu estou aqui, estou aqui com você. Vai ficar tudo bem, meu bem. Não vou te deixar.
Devo ter adormecido ali pois quando abri os olhos novamente estava na cama. Kelley não estava no quarto. Não entre em desespero, pensei. Não entre em desespero, está tudo bem, ele está bem. Convencendo a mim mesma com essas palavras, coloquei um jeans e uma camiseta preta realmente usada e fui checar o celular. Uma mensagem de Julia perguntando se está tudo bem e duas ligações perdidas da minha mãe. Por um momento me perguntei se poderiam me rastrear até chegarem nos meus pais. Mas qual utilidade eles teriam? Seria muito trabalho para nada, e agradeci silenciosamente por não ter colocado pelo menos eles em risco. Mesmo assim tirei a bateria e o chip só para garantir.
Kelley chegou pouco depois com uma sacola de supermercado. Sua barba estava por fazer, realçando sua mandíbula firme. Usava sua usual camisa preta, jeans e botas. Sério, como alguém consegue ficar tão lindo em coisas tão simples? - Já acordou? - Perguntou sorrindo - Fui comprar algumas coisas, já que vamos ficar aqui por um tempo.
- Quanto tempo? - Caí pesadamente na cama, com um suspiro cansado.
- Alguns dias, talvez semanas. Vou entrar em contato com colegas meus para relatar a situação e ver como resolver isso. - Sua voz estava exausta e o peso em seus ombros confirmou isso. Me levantei e fui até ele, passando os braços ao redor da sua cintura.
- O que você não está me contando?
- Nada.
- Kelley...
- Não é nada, Anna.
- Você precisa confiar em mim. - Me afastei para olhar em seus olhos. - Estou nisso tanto quanto você. Tenho o direito de saber de tudo.
Kelley sustentou seu olhar no meu por tanto tempo que poderia ter sido horas.
- Aquilo foi só um aviso, o tiro não era para nos matar. Era pra mandar um recado. Consegui um pré pago para fazer umas ligações e... - Seu olhar adquiriu um brilho de raiva - Estão a caminho da pousada. A CIA não conseguirá chegar a tempo e a polícia local não está preparada para lidar com aqueles caras.
Minha mente estava indo e voltando com as novas informações.
- O que você está me dizendo?
- Vão matá-los, Anna! - Gritou, para ninguém em especial - E me ordenaram ficar aqui, enquanto pessoas inocentes morrem por minha culpa!
- Deve ter um jeito... - Eu andava freneticamente pelo quarto, o som dos meus sapatos batendo desesperadamente no chão. Kelley estava com as mãos no encosto da cadeira, os nós dos dedos brancos. Um toque de celular nos fez pular, e ele o tirou de seu bolso de trás do jeans. Seu rosto disse tudo. Esperançoso no começo, caindo gradativamente para choque, raiva e medo.
- Entendi. - Respondeu para quem quer que estivesse do outro lado da linha. - Estarei lá.
Quando desligou, sua mandíbula estava dura feito rocha e ele tremia de um jeito que nunca vi antes.
- Estão com Phil. - Disse depois de minutos de tensão. Seu olhar trancou o meu. - Vou resolver essa bagunça. Foda-se as ordens, ele é meu tio porra. Você fica aqui.
Fiquei em pé no mesmo segundo.
- Não vou ficar aqui! Mas que porra Kelley?
- Não vou arriscar você!
- Mas vai arriscar você!
Passou as mãos pelo cabelo, exalando sua frustração.
- Por favor, Anna. Não faça isso mais difícil do que já é.
- Você prometeu. - Foi minha única resposta. Cheguei perto, pegando seu rosto entre as mãos. Suas feições continuavam lindas porém cansadas. Seu olhar dizia tudo: raiva, medo, cansaço, culpa.
- Eu estou com você, não vou te deixar. - Prometi, beijando cada centímetro do seu rosto lindo. - Somos cúmplices desde o início, amantes, namorados, amigos, tudo. Você é meu companheiro de cafeína e meu par perfeito para um crime. Somos um só.
Ele acenou a cabeça dizendo que sim, e era a única coisa que eu precisava. Nos afastamos para arrumar as coisas, coisa que levou pouco tempo já que não tínhamos muito. Pagamos a diária e fomos para o Toyota.
- Vem cá. - Kelley chamou, parado no porta-malas aberto do carro.
Puta merda.
Meu namorado assaltou o exército.
Dentro havia inúmeras armas, grandes e pequenas e cartuchos.
- Onde você conseguiu tudo isso? - Perguntei chocada.
- Precaução, baby. - Vi a sombra de um sorriso repuxar os cantos de seus lábios. - Tome esta. - Ele empurrou uma pistola na minha mão, pequena e leve. - Mas eu quero uma metralhadora. - Brinquei. Mais ou menos. Seria bacana, vamos concordar.
Kelley apenas revirou os olhos em divertimento.
- Mais tarde te ensino a usar. Mas não é muito difícil. Vamos.
Entramos no carro. Eu me distraí procurando alguma estação de rádio até que achei uma tocando AC/DC.
- Sabe... Você tinha razão. - Começou Kelley - Somos parceiros perfeitos para um crime. Ou um resgate.
Sorri quando nossos olhares se cruzaram. Seus olhos negros estavam selvagens. Queimavam tudo em mim. Estávamos prontos para chutar bundas de filhos da puta como o casal perfeito que éramos.
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Tentação
RomanceSexy, romântico, misterioso. O que fazer quando o cara perfeito é a definição do perigo? É possível conciliar amor com proibição? Um bad-boy perfeito, uma paixão arriscada.