Capítulo 17

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Anna

Seus gritos ainda ecoavam na minha cabeça. Cada palavra, cada tom de desespero na sua voz. Meu Deus, quanto tempo havia se passado? Horas? Dias? Semanas?

A porta se abriu e jogaram um prato da lavagem que vinham me alimentando. Tinha um gosto horrível de cebola. O único outro momento que a porta se abria era quando vinham me sedar. Então eu apagava em questão de minutos e quando acordava não fazia a mínima ideia de quanto tempo havia se passado.

O chão frio me fazia tremer até os ossos, e as paredes não eram diferentes. Aquele lugar me causava claustrofobia de tão pequeno. Com três passos eu conseguia alcançar a parede da frente e se abrisse os braços, minhas mãos encostavam nas que me cercavam. Em um canto havia um vaso sanitário e uma pequena pia e só. A única fonte de luz era a que pateticamente passava pelas frestas da porta.

Abracei as pernas até o peito para conservar o pouco de calor que havia no corpo. Onde estava Kelley? Minha imaginação gostava de formar a imagem dele vindo me resgatar em um cavalo branco mas na realidade eu não sabia nem se ele estava vivo. E isso era o que mais me aterrorizava. Minhas lágrimas começaram a correr novamente e me perdi na fantasia do resgate, que era a minha única forma de conforto. Bem, isso e nossas memórias juntos. Seu jeito enigmático, o sorriso de canto, os cabelos negros. Seu cheiro... Meu Deus, como eu sentia falta do seu cheiro. O jeito como ficava no meu travesseiro, no ar do meu quarto, na minha roupa. Inspirei minha camiseta úmida e suja e jurei que podia sentir seu cheiro nela. 

De repente uma luz se acendeu e não era forte, mas queimou meus olhos de tal maneira que chegou a ser doloroso ao ponto de me fazer chorar e achei que ficaria cega. A porta de ferro abriu-se com um estrondo e um vulto pairou sobre ela. Por um momento quis atirar-me para ele achando que era Kelley mas então me contive.

Não era Kelley. 

O vulto se revelou um homem pálido, de cabelos claros com aspecto de sujo e um terno caro que não compensava toda sua crueldade. Billy olhou para mim com um sorriso de desdém no seu rosto nojento. O desgraçado havia matado Phil. Machucado Carter, um amigo que nos ajudara. E principalmente Kelley. Inferno, ele poderia tê-lo matado. Em um momento de fúria me atirei sobre ele, mesmo fraca e dolorida. Mal dei dois passos quando sua mão atingiu meu rosto, me jogando contra a parede. 

- Sua piranhazinha. Ainda acha que pode me atingir? - Caçoou. 

- Eu posso tentar. - Minha voz mal saiu. Depois de vários dias gritando por socorro minha voz estava rouca e minha garganta inflamada. Minhas mãos também não estavam muito melhores. As unhas estavam em carne viva, as palmas arranhadas e cobertas de sangue depois de esmurrar as paredes e a porta em vão. 

O bico do seu sapato atingiu o lado direito do meu corpo e eu gritei. Minha visão ficou escura e lágrimas picaram em meus olhos mas me recusei a chorar na frente desse canalha. Ele me chutou. De novo. E de novo. E perdi o ar. 

Ele parou um tempo depois, mas eu já tinha desligado. Estava com Kelley, na cama tranquila da Pousada, ouvindo os sons que vinham da mata atrás da casa e com a cabeça apoiada no seu peito. 

- O que está pensando? - Perguntei.

- No quanto minha perna com cãimbra dói com você em cima. 

Eu ri. 

- É sério.

- Certo. Estou pensando no quanto tenho sorte de estar aqui com você. 

- Compartilhamos o sentimento. - Sorri. - Kelley, e se algum dia não estivermos juntos? 

Ele se apoiou nos cotovelos para me olhar.

TentaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora