" O mais belo estado da vida é a dependência livre e voluntária: e como seria ela possível sem amor?" (Johann Goethe)
Dizem que o amor é uma droga, alguns falam isso no sentindo pejorativo da palavra, já eu falo no sentindo literal. Sim, o amor é uma droga que te torna dependente quando menos espera, pois o amor só surge para os despercebidos. Não há uma fórmula ou regra ditada em que você a certa hora irá se apaixonar por tal pessoa em tal lugar, não. É de repente, naquele dia em que o Sol resolveu não brilhar, naquela noite em que as estrelas parecem se esconder, naquela momento que tudo ao redor parece sem sentido, é aí que esse danado do amor resolve aparecer. Colocando ou tirando coisas do lugar, bagunçando ou arrumando a bagunça que outros deixaram em seu coração. Sem data, sem hora marcada, ou talvez, em um momento ditado apenas pela força do destino. Força essa, que só surte efeito após dois corações tomarem diversos caminhos até se encontrarem. Então o efeito dessa droga passa a agir em seu corpo, pois quando está perto do outro a sensação de prazer é plena, as alucinações são constantes, o chão flutua abaixo de seus pés, o sorriso aparece involuntariamente e o mundo se colore quando seus olhares se encontram. Do contrário, a ausência da tal droga, quer dizer, da tal pessoa causa uma crise forte de abstinência, seu corpo pede para respirar o ar do mesmo ambiente do outro, seus pensamentos vagam até "para onde ele está ou o que está fazendo agora?", então o desejo de ter aquela droga cada vez mais começa a tomar conta de você de uma forma quase dolorosa. É necessário apenas um toque, um encontro de lábios talvez, algo que faça você acreditar que não é o único dependente naquela relação, algo que faça você crer que a dependência é recíproca. Porque no fim, drogados ou não, sonhamos em ser dependentes da reciprocidade.
Só havia me apaixonado uma vez na vida e isso me deixou consequências eternas, mas não fez com que eu me cegasse para não enxergar quando algo diferente ocorria em meu coração. Ainda conhecia a sensação de borboletas no estômago ou das mãos e pés suados, conseguia reconhecer quando haviam sinais enviados através dos saltos que meu coração dava ao ver ele. E foi naquela sexta-feira à noite, poucos dias após nosso jantar, deitados sobre o gramado em frente à minha casa, que tive certeza, meu coração estava se tornando dependente de Javier.
- Você não está prestando atenção na leitura! - acusou abaixando o livro e o posicionando sob seu colo.
- Estava sim - rebati.
Não, eu não havia ouvido nada das últimas duas páginas lidas por ele. Me perdi na forma melodiosa em que as palavras saiam de sua boca, mas sem dá atenção no significado delas. Me perdi na ruga que ele fazia na testa para ler, me perdi no cheiro que vinha dele por estarmos deitados tão próximos. Me perdi imaginando a sensação que seriam os lábios dele sobre os meus ao lhe observar abrindo a boca para ler. Me perdi na forma que os olhos dele brilhavam a medida que as letras iam passando através de sua Íris castanho escuro. De fato, eu estava mais do que perdida.
- Então me diga a última frase que eu li, não precisa dizer completa, bastam algumas palavras - falou virando o rosto para me olhar.
Todas as noites agora eram assim, as sete em ponto saímos de casa e deitávamos no gramado úmido, passávamos horas conversando, lendo ou simplesmente olhando o céu, quando as palavras acabavam isso não incomodava, pois o silêncio ao lado dele me soava mais bonito que qualquer melodia vinda de uma renomada orquestra.
- Não tenho boa memória, mas foi algo sobre amor - tentei parecer certa do que dizia.
Ele sorriu, na verdade ele gargalhou, aquele havia se tornado meu som favorito.
- O livro todo fala sobre amor, Keana... Mas foi uma ótima tentativa, porém falha.
- Sobre amor não correspondido... - deixei escapar baixinho - esse livro fala sobre o pior tipo de amor possível. O amor sem reciprocidade.
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Minha luz particular
FantasyApós terminar a faculdade, a jovem Keana sente que é hora de começar a escrever seu livro. Decide então se refugiar na pacata cidade de Pinkons, um lugar pequeno e repleto de lendas que lhe servirão de inspiração. Ao buscar luz para as ideias, Keana...