"...não estava viva quando a tirei do mar..."

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Twitter: ISBB5H


Narração: Camila

Miami – Condomínio Solar – Apartamento 12B

– Eu já disse que você é a melhor amiga de todas?

– Hoje? – Perguntei irônica. – Umas trinta vezes, mas só isso. Somente trinta. – Meu corpo se balançou sem controle sobre o estofado antes de sentir uma pressão que afundava uma das almofadas do meu sofá velho.

– Mila... – Sua cabeça pousou em minhas pernas.

– Mani... - Repeti.

– Você está com raiva! – Ela concluiu insatisfeita.

– Não, eu não estou.

– Sim, você está!

– Não! – Retirei sua cabeça do meu colo impaciente e me levantei do sofá seguindo para o parapeito da janela da minha sala. – E chega dessa discussão boba. Eu já disse que não estou com raiva de você. – Seus lábios se abriram, mas eu fui mais rápida. – E nem chateada. Ou triste.

– Então que porra você tem Mila? Você está diferente desde sábado! Desde que voltamos do hospital. – Mani se aproximou da janela em que eu estava e cruzou os braços esperando por uma resposta mais convincente.

Repassei os acontecimentos de sábado em minha cabeça e fechei os olhos ao me lembrar de um lindo par de olhos verdes.

– Mani.

– Sim?

– Eu só... Foi muito, entende? Aquele afogamento, aquela garota... – Fui o mais sincera que pude. Desde o final de semana essa era a primeira vez que eu me permitia falar abertamente sobre o assunto.

– E a mentira. – Ela disse sem esconder o ressentimento.

– Não. Normani, essa mentira, isso não é nem de longe o que me incomoda. – Estiquei minha mão balançando meus dedos freneticamente em um pedido silencioso para que ela se aproximasse de mim. Circulei meus braços ao redor de sua cintura quando ela estava próxima o suficiente e descansei minha cabeça em sua barriga. – Eu não importo de ter mentido se isso significa que você pôde manter seu emprego. Eu realmente não me importo.

– Então... – A dúvida era nítida em seu tom de voz.

Quando senti que seus dedos passeavam por entre os meus fios de cabelo voltei a falar. – Escuta bem, Mani. Você é minha melhor amiga, minha família aqui em Miami. É tudo o que eu tenho e eu não quero que pense nem por um minuto que eu me arrependo de ter feito o que fiz no sábado. – Levantei minha cabeça para olhar fundo em seus olhos. – Você vacilou, é verdade. Aquele turno de sábado era seu e se você não tivesse se afogado em álcool na sexta-feira, exatamente como eu disse para não fazer, você teria sido capaz de se levantar da cama a tempo de trabalhar. Entenda que cobrir seus turnos nunca é um problema, mas sua falta de compromisso é.

– Eu teria ido trabalhar se você não tivesse se oferecido... – Ela murmurou.

– E então aquela garota estaria morta. – Senti o corpo da morena enrijecer com a minha fala. – Você estaria de ressaca, fraca e distraída. Não teria alcançado a garota a tempo e nem ao menos teria forças para tirá-la do mar. Essa foi... F-foi uma das coisas mais difíceis que eu já tive que fazer em toda a minha vida.

– Mila...

– Não, Mani. Não diga nada, pois você sabe que eu estou certa. Contar ao coordenador que foi você quem a salvou não é um problema. Encobrir a sua falta não é um problema. Implorar para as amigas dela que colaborassem com essa mentira dizendo que é você quem estava lá não é um problema. O problema é que ela estaria morta se eu não estivesse lá. E eu não deveria estar lá, pois não era o meu dia de trabalhar. E eu não queria estar lá. Você entende que por raiva, por pura implicância eu quase deixei que você fosse para a praia de ressaca? – Bufei imaginando o queria teria sido da garota se eu o tivesse feito.

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