"...a tempestade..." - Parte 1"

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Twitter: ISBB5H


Narração: Lauren

Miami – Condomínio Solar – Apartamento 12B

O dia em que perdi minha virgindade. A primeira e única vez em que terminei um namoro. O dia em que assumi minha sexualidade para meus pais. O dia do meu exame de ordem. Posso contar nos dedos, sem completar uma mão cheia, as vezes em que sucumbi a essa sensação estranha que parece corroer meus ossos e músculos, transformando-os em pó.

E agora aqui, parada dentro do meu carro, perdida em pensamentos e sensações, em frente ao apartamento de Camila, estou me submetendo à mesma sensação pela quinta vez. Finalmente completando uma mão. O nervosismo e a insegurança elevados a potência infinita. Pelos céus, como eu queria saber me controlar.

Olhei para minhas mãos que repousavam sobre minhas pernas e sorri nervosamente ao constatar que já estavam úmidas mais uma vez. Com muita lentidão as esfreguei contra o tecido escuro e grosso da minha calça jeans e senti meu telefone vibrar no bolso de trás.

– Merda. – Vociferei enquanto angulava meu tronco na direção do banco do carona para retirar meu esquecido e potencialmente quebrado celular do bolso. – Camila... – O nome escapou pelos meus lábios em um sussurro ao vê-lo piscando na tela e suspirei sentindo-me ainda mais nervosa. A mensagem fora curta. A pequena apenas perguntava onde eu estava e a que horas chegaria a sua casa. Olhei pela janela do carro na direção do seu condomínio e pensei em uma resposta que me deixasse confortável. Sei que deveria simplesmente abandonar minha posição atual e caminhar até seu apartamento, mas eu não podia encarar Camila ainda. Não agora... Preciso de mais algum tempo e me decidi por não respondê-la.

Joguei minha cabeça contra o encosto do banco e comecei a contar cada vez que inspirava e expirava tentando me acalmar. – Vamos lá Lauren... Não é tão difícil assim. – Falei para mim mesma tentando me assegurar de que tudo ficaria bem. Afinal qual o segredo? Seriam necessários poucos segundos de coragem e enfim a resposta. Seria rápido e terminaria com um sim ou um não. Felizmente com um sim... É o que eu espero.

– Camz... Não. Camila. – Bufei sacudindo a cabeça procurando clarear meus pensamentos e recomeçar o ensaio. – Camila, eu... – Pelos céus, porque é tão difícil?! – Que droga, Lauren Michelle! Recomponha-se!

Voltei a olhar através do vidro temendo que a pequena me flagrasse ali tão perto da sua casa e estragasse toda a minha tentativa patética de preparação e meu sangue parou de circular pelo corpo no momento em que encontrei um par de olhos escuros, possivelmente tão castanhos como os meus preferidos, me encarando com curiosidade da porta do condomínio. Por um milésimo de segundos temi que fossem exatamente os meus castanhos quentes e belos, mas não... Para o meu alívio não eram.

Franzi o cenho sem tirar meus olhos da mulher que já não me olhava de volta e que agora estava concentrada em alguma coisa que o homem ao seu lado dizia enquanto tocava o interfone freneticamente. O casal de meia idade tinha as mãos entrelaçadas e uma postura levemente desconfortável, mas como estavam de costas para mim não pude obter mais detalhes.

Abaixei o vidro sentindo-me curiosa pela presença daquelas duas pessoas quando notei, da janela de cima, uma Camila temerosa olhar para o andar de baixo com hesitação. Seus cabelos longos caíam sobre o rosto e ombros e sua postura vacilante era tímida, como se estivesse se escondendo. Seus olhos se abriram alarmados ao pairarem sobre o casal na porta do condomínio e em um milésimo de segundo a pequena sumiu por trás da cortina.

O homem fez mais algumas tentativas no interfone antes de desistir e arrastar a mulher ao seu lado pelo caminho de entrada com uma feição nada agradável. Sua mão livre serpenteava pelos cabelos grisalhos antes metodicamente arrumados e em sua testa algumas rugas confirmavam seu total descontentamento. Seus traços eram pesados e bem marcados e ele parecia cansado, ao contrário da mulher a quem estendia a outra mão. Esta mantinha-se tranquila com uma expressão insondável e que quase nada transparecia. Seu rosto, embora apresentasse algumas rugas, não exalava cansaço ou insatisfação e sim uma leveza quase cínica, lembrando-me minha própria mãe. Seus castanhos opacos analisavam a vizinhança de Camila com atenção até me encontrarem mais uma vez e seus lábios se quebraram formando um sorriso simpático.

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