CAPITULO: 11: ENCARE

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      Saí transtornado daquela mansão. Meus sentimentos nunca estiveram tão descontrolados. Eu sentia um aperto no coração que nunca havia experimentado antes, como se a qualquer momento fosse implodir e sumir na existência. Nada do que eu fizesse, dissesse ou pensasse fazia sentido. Parecia que o mundo, o meu mundo, perdera o seu brilho de repente. O sol, aquele que tanto iluminou meus pensamentos e que, mesmo quando erradas, apoiou minhas atitudes, já não resplandecia mais em meu universo. Era como se eu estivesse perdido numa escuridão ainda mais profunda do que aquela em que já estava. Como pude deixar que aquilo acontecesse? Se eu tivesse entendido os sinais, se eu esquecesse o bom senso, se eu fosse direto quando perguntei o que havia acontecido àquele dia..., ah! Chloe não gostaria de me ver afogado em um mar de culpas, mas aquelas ondas eram maiores e mais fortes do que eu.

      Entrei em casa como um carro desgovernado atropela o que vê pela frente. Nem me importei em saber se Victor estaria em casa ou não. Naquele estado, eu seria facilmente capaz de matá-lo com as minhas próprias mãos se assim fosse necessário.

      Corri escadas acima em direção ao banheiro. Só ali, com as mãos apoiadas sobre a pia, me recordei que estava suado, sujo, com cheiro de mofo e um tanto confuso com a cronologia do tempo. Eu saí direto da delegacia para tentar falar com Chloe e então, estava em casa. Não tive tempo para banhos ou organizar melhor os fatos. Minha mente girava. Era como se dias houvessem se passado em apenas algumas horas.

      Olhei para o meu reflexo no pequeno espelho. Tentei rejeitar o máximo possível aquela imagem grotesca. Internamente, criei dezenas de razões para justificar o meu estado, sempre evitando tocar nas feridas abertas, mas a realidade, sadicamente, estapeou o meu rosto com toda a sua fúria: olheiras fundas e marcadas, olhos vermelhos, dentes amarelados e cabelos embaraçados.

      Como se aquilo fosse magicamente melhorar minha aparência, liguei a torneira e lavei o rosto diversas vezes. Fitei em meu reflexo novamente e tudo parecia ter piorado. Sobre suspiros intensos, um ódio brotou da planta dos meus pés e subiu à cabeça. Senti uma pressão em meu corpo, uma vibração, e meu coração acelerou. Meus punhos se cerraram, como se minhas unhas fossem atravessar a carne a qualquer momento. Em golpes repentinos até para mim, transformei em pedaços aquele espelho com minhas próprias mãos. Estilhaços grandes e pequenos se distribuíam cintilantes por todo o banheiro. Alguns caíram sobre os meus pés. Arfei quando comecei a sentir um ardor intenso e uma dor aguda tomar conta dos meus punhos.

      — Merda!

       Eu me arrependi do que fiz segundos depois de ter feito. Com a mão menos lesionada, tomei um pano qualquer que estava próximo e o pressionei sobre a outra por alguns minutos. Caminhei para debaixo do chuveiro em seguida, tirei aqueles trapos de mim e deixei que a água fria lavasse o meu corpo, ainda que nada dentro de mim fosse, de fato, melhorar. Cada gota que percorria o meu torso parecia me despertar uma tristeza que eu jamais havia sentido. Não conseguia conter a ansiedade e o vazio dentro de mim era palpável. Meus cabelos, grudados no rosto, ofuscavam a minha visão. Deslizei as mãos por todo o meu corpo a fim de remover toda aquela sujeira. Os toques eram acompanhados de soluços; de lágrimas que se misturavam com a água na superfície do meu corpo. Houve um momento em que o simples ato de estar de pé se tornou uma tarefa impossível.

      Eu desabei ali. Chorei amargamente.

     Mesmo contra a minha vontade, tive de me alimentar. Quase não havia comido nos dias que passei na delegacia. Lá, as refeições eram apenas para os funcionários. Quando sobrava alguma coisa, ou era para o lixo ou o meu estômago. Recusei os restos algumas vezes, mas a fome fora maior do que a minha dignidade.

O Peso do PensarOnde histórias criam vida. Descubra agora