Em maio, naquela região, os rapazes, com uma espiga verde no chapéu, e as moças, engalanadas com flores de linho, vão dançar à volta dos dolmens, essas grandes mesas de pedra que a pré-história erigiu nos campos.
Ao regressarem, dispersam-se um pouco, aos pares, pelos prados e nas sombras da mata, rescendente a lírio-do-vale.
Em junho o pai Saulier casou sua filha e houve uma grande festa. Era o único arrendatário do barão de Sancé, que, afora aquele, não empregava senão meeiros. O homem, que era também dono da taberna da aldeia, desfrutava boa situação financeira.
A pequena igreja romana foi adornada de flores e círios grossos como punhos. O próprio senhor barão conduziu a nubente ao altar.
O banquete, que durou várias horas, abundava em morcelas, chouriços, salsichas e queijos. Bebeu-se vinho.
Após a refeição, vieram todas as mulheres casadas do povoado, como de praxe, ofertar seus presentes à noiva. Esta já estava em sua nova casa, sentada em um banco diante de uma grande mesa sobre a qual se amontoavam lençóis, baixelas, caldeirões de cobre e de estanho. Seu rosto redondo, um tanto bovino, brilhava de prazer sob uma enorme grinalda de margaridas.
A senhora de Sancé envergonhava-se de não levar senão um modesto presente: alguns pratos de bela faiança que guardava para essas ocasiões. Angélica lembrou-se de que em Sancé comia em escudelas, como os camponeses. E sentiu-se ferida por aquele ilogismo. As pessoas eram esquisitas! Podia apostar que também a recém-casada jamais utilizaria aqueles pratos; guardá-los-ia cuidadosamente em uma arca e continuaria comendo em sua escudela. E no Plessis havia tantos objetos maravilhosos que seus donos abandonavam como em uma tumba! . . .
Angélica entristeceu-se e beijou a recém casada sem qualquer efusão. Entrementes, os jovens reuniam-se junto ao grande leito conjugal e soltavam piadas.
_ Ah! minha linda, com a cara que tendes tu e teu marido, certamente chaudaut vos cairá bem ao amanhecer! _ disse um deles.
_ Mamãe _ perguntou Angélica ao sair _, que é esse chaudaut de que falam em todos os casamentos?
_ É um costume de camponeses, como levar presentes ou dançar _ respondeu, evasiva, a baronesa.
A explicação não satisfez a menina, que prometeu a si mesma assistir ao chaudaut.
Na praça da aldeia não se tinham iniciado ainda as danças embaixo do grande olmeiro. Os homens permaneciam em redor das mesas armadas ao ar livre, sobre cavaletes.
Angélica ouviu os soluços de sua irmã mais velha, que pedia para voltar ao castelo, pois se envergonhava de seu vestido simples e cerzido.
_ Ora essa! _ exclamou Angélica. _ Complicas demais a tua vida, pobre mana! Queixo-me eu do meu vestido, apesar de apertado e muito curto para mim? Só os sapatos me incomodam deveras. Mas trouxe os tamancos embrulhados e os calçarei para dançar à vontade. Estou disposta a me divertir.
Hortência insistiu, queixando-se do calor e garantindo que se sentia mal. A senhora de Sancé aproximou-se do marido, que estava sentado entre os figurões da terra, e avisou-o de que se retirava, mas deixava Angélica aos seus cuidados. A menina ficou um momento junto de seu pai. Tinha comido muito e se sentia sonolenta.
Em torno deles estavam o cura, o síndico, o mestre-escola, que as vezes fazia o papel de chantre, o cirurgião, o barbeiro e o sineiro, e alguns lavradores que possuíam charruas puxadas por bois e empregavam vários manobradores, formando assim uma pequena aristocracia de aldeia. Também fazia parte do grupo Artêmio Callot, agrimensor do burgo vizinho e nomeado provisoriamente para ajudar na drenagem do pântano próximo, o qual figurava como estrangeiro, embora fosse, na realidade, do Limousin. Finalmente, ali se encontrava também o pai da noiva, Paulo Saulier, criador de gado grosso e miúdo.
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Angélica - Marquesa Dos Anjos
RomanceEstou transcrevendo esta historia pois sou super fã. Espero que gostem.