Então foi lá, foi lá que tudo começou, na desgraça daquele terraço. Como podia eu, pensar que tudo cairia de uma hora a outra? Como em efeito dominó. Droga, eu fui tão burra.
Aquela discussão na escola havia sido o suficiente para acabar comigo o resto do dia. Não falei com mais ninguém e assim que bateu o sinal da sexta aula, saí correndo e não voltei mais, os três períodos da tarde que me perdoem, mas eu realmente estava mal.
Não, não pensem que eu sou mais uma garota dramática que fica pra baixo por qualquer coisa. Vocês não conhecem meus motivos, não me julguem sem antes saber a verdade.
Todos têm problemas, eu não era a exceção.
Voltei andando para a casa, por mais que minha vontade fosse chegar o mais rápido e desabar na minha cama, mas eu não tinha aquele direito, seria ser fraca ao extremo. E eu não era fraca, pelo menos não gostava de aparentar ser.
Então assim que cheguei, apenas tomei um banho longo, longo de mais e saí.
Saí pra fora.
Pra qualquer lugar.
Sem destino por aí.
Na esperança de ser feliz.
Gostaria de dizer que era aquilo que eu tinha feito, mas não era, a desculpe se alguém esperava que agora eu virasse uma hipster das maconha e fosse ser feliz em um trailer com um drogadinho de merda.
Eu estava a caminho daquele prédio, do velho terraço, ah... Eu costumava amar aquele terraço.
Assim que pisei os pés no velho prédio do pai dela. Vocês sabem de quem eu estou falando. O pai desativou ele depois que a mesma morreu, como um gesto de carinho.
Eu não vou iludir vocês, como toda boa garota líder da hierarquia adolescente, Thayná nunca teve a convivência familiar devida. Sempre teve tudo o que queria e quando queria em uma tentativa falha dos pais de substituir o tempo em que eles não ficavam presentes.
O pai dela era um cretino e só ficou pior na adolescência da garota. Não sou ninguém para dizer que hoje ele se arrepende, mas se não, isso só mostrava o quanto cretino ele era.
Desativar um prédio por causa da morte da filha pra se fingir diante da mídia?
Ah vai lavar a casa da cachorra! Poderia ter árvores aqui, quem sabe assim o ar do pulmão dele fosse menos poluído que ele.
Eu não ligava de pensar ou até mesmo falar dela quando estava sozinha, o problema mesmo era quando se dirigiam a mim sobre ela.
Eu sabia de tudo e não podia falar, não mesmo.
Já havia chegado ao terraço e sentado no mesmo lugar de sempre. Sentido o mesmo cheiro de sempre, a poluição de São Paulo junto do cheiro de planta seca. Subir 5 andares pela escada de incêndio que era cruel, mas tem certas coisas que a gente para de reclamar.
A vista era esplêndida, eu conseguia ver todo o horizonte e se pá um pouco mais.
Mas então eu me lembrei dela novamente, não só dela, como de tudo sobre ela e com ela que eu já tinha passado.
E então eu permiti as lágrimas saírem, não do tipo todo extravagante de chorar. Só permiti que elas descerem por meu rosto, era totalmente indiferente, apenas fungava vez ou outra enquanto olhava todo o arredor e pensava em tudo e em nada.
Apesar de tudo que fiz e me arrependia, eu tinha meus motivos e quando me lembrava deles tudo fazia pleno sentido, por mais cruel que fosse, tudo parecia normal, indiferente, como dormir, um sonho sem fim.
A velha e boa Alana Correia estava morta e enterrada com Thayná Monterey. Parte de mim se foi com ela e não que eu não fosse feliz agora, mas era uma felicidade tão temporária. Tão inútil.
- Garotas bonitas não deveriam chorar no terraço de um prédio abandonado, é tão filme de terror! - Ouvi uma voz e me virei para trás, era um garoto, aparentava ter a minha idade e eu não conseguia ver seus traços direito já que ele usava um moletom com uma toca tão grande que chegava a encobrir até seu nariz, dando-me a visão apenas de seu sorriso sorrateiro no rosto.
- E você é o que? A assassino com problemas mentais que mata a garota burra que sempre morre primeiro? - Soltei debochada, não tinha tempos para joguinhos. Deixei minha máscara de garota doce cair, hoje era dia de distribuir coices.
- Talvez eu possa ser... Mas acho melhor deixar essa tarefa para você - A carga na voz dele era tão acusativa quanto aparentava, ele queria me atingir, ele conseguiu me atingir, mas em vez de cair em seu joguinho, apenas continuei com meu sorriso
- Desculpa docinho, eu tenho namorado, não posso transar com você - Mandei um beijo no ar, apesar de ter certeza que meu rosto ainda estava molhado. Como já disse várias vezes, eu nasci para ser atriz.
- Ainda bem que isso é a vida real, segundo minha experiência, nos próximos 5 minutos você iria morrer - Fugiu do assunto se sentando ao meu lado, esperto. Desculpe, eu era mais.
- Pare de falar de morte ou vá embora daqui, que eu saiba você não é bem-vindo - Revirei meus olhos vermelhos, a esse ponto eu nem me importava mais com seu rosto, ele não queria que eu visse, eu não iria ver.
- Você não deveria destratar a morte assim, ela já foi tão sua amiga Lana. - Balançou a cabeça negativamente fazendo um barulho estranho com a boca.
Gelei na hora, ele sabia meu nome? Sabia quem era eu?
- O que você quer? - Perguntei cerrando os dentes. Ele não era familiar para mim, sua voz, nada e eu costumava a ter a memória ótima, tanto visual quanto auditiva.
- Nada de mais... - Falou em tom inocente se espreguiçando. Ótimo, outro cínico no mundo. - Apenas... apenas me conte tudo.
- Contar o quê? - Aquilo bateu em mim como um soco, mas não perdi meu tom superior e debochado, ele não era uma de minhas mentiras, ele não era um de meus pecados, ele não alguém que eu me importasse. Não tinha nada o que temer vindo dele.
- Ambos sabemos o que é, vamos, não vai doer. Quero saber seu ponto de vista sobre o assassinato de Thayná Monterey - Sorrio irônico me olhando e dessa vez consegui ver seu rosto. Ele não era um conhecido da minha mente, não era mesmo.
- Assassinato? Ela se suicidou idiota! - Revirei meus olhos mantendo meu belo teatro - Problemas com drogas e bebidas, pais que não ligavam para ela e uma máscara de maldade para tampar seu sofrimento. Não seja tolo. Todos nessa região sabem o que aconteceu a ela.
- Você prefere revelar tudo por bem ou por mal, eu estou te dando a chance de se justificar garota - Parecia irritado, de um jeito tão esquisito.
- Eu não tenho o que revelar, mas que droga! - Continuei.
- Alana Correia, 11 anos. A criança com tendência manipuladora, possuí um sentimental difícil de lidar, se perde em suas próprias emoções e tende a criar situações imaginárias para defender suas causas. Vítima de bullying e problemas mentais, incluindo entre eles: dupl...
- CHEGA, NÃO CONTINUA ESSA PORRA! - Peguei aqueles papéis de sua mão com tudo e joguei pelo prédio abaixo, sentido lágrimas brotarem em meus olhos novamente, era tão difícil deixar o passado no passado?! Mas que inferno!
- Eu tenho cópias, não me importa. - Deu de ombros - Inclusive tenho uma gravação no meu celular, quer assistir? - Sorrio malicioso, tanto quanto macabro. Eu sabia muito bem que gravação era - Então, vai me contar ou vou ter que espalhar as cópias pela parede da sua escola?
- O que você tem haver com isso? Com minha vida? - Falei entre alguns fungados, lágrimas desciam de meus olhos, droga, eu estava tão frágil, só pode ser TPM. Olhei e vi que o garoto estava mesmo falando sério, droga, onde ele conseguiu aquilo, eu havia queimado tudo. Ou pelo menos achava que tinha, esqueci que no mundo de hoje existem computadores e pen drives - Certo.
- Finalmente. Então, que a verdade seja dita. - Bateu pequenas palmas e voltou sua atenção toda a mim.
- Minha história começa em 2009, eu tinha apenas um amigo, que hoje não lembro o nome e nem sei onde está.
Eu era diferente do que sou hoje, muito diferente e também estudava no mesmo colégio...
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Little Secrets
Teen FictionÚltimo ano do colegial. Provas, faculdades, ENEM... A garota se via perdida em meio a tudo isso, finalmente, depois de tanto tempo ela estava quase conseguindo lidar com tudo o que tinha feito e aceitado que tinha amigos de verdade. Finalmente ela...