Capítulo 9

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Tan tan tan....!

Quem estava ansioso pelo capítulo? Bom, não precisam de ansiar mais, já o têm. O capítulo 9 aqui vos espera!!!!




Saio da sala com a minha mente num turbilhão tal que ouço tudo e não ouço nada. Contudo, gravado a ferro quente, está o rosto pálido do Pedro antes de sair da sala da Chefia, sem mais nada do que um pedido de desculpas. Não percebo a sua reação. Eu esperava um sorriso convencido ou um ataque verbal dirigido às mulheres sobre o facto de terem gente mais capacitada do que nós, crianças, para o que elas nos pedem.

Seremos assim tão dispensáveis?

Ouço o tilintar do metal contra metal que me faz virar o rosto em direção do som. Congelo. Pelo vidro consigo ver as crianças que estão em testes facultativos a treinar o manejo de uma espada. É claro que as espadas não são do tamanho normal. Estas são feitas à medida de uma criança de 5 anos e repletas de todo o tipo de proteção quando são testadas umas nas outras. Contudo, quando o treino é individual ou eles são avaliados, esses penduricalhos todos desaparecem e eles usam-nas para ferir o adversário que usualmente é um boneco de madeira. Cerro os dentes quando vejo a miúda que tinha confortado na Vaga a atacar, a medo, o colega. Ela parece aterrorizada e isso deixa-me furiosa. E é essa fúria que liberta as minhas memórias reprimidas daquele tempo.

Lembro-me da primeira vez que me puseram uma arma nas mãos. Foi estranho pegar em algo tão complexo. Sei que olhei para o homem que me entregou o objeto com um olhar confuso. Não me lembro completamente da expressão do homem, só me lembro que ele se virou para o lado e entregou uma arma idêntica ao meu colega do lado. Nesse tipo de armas, os treinos eram, e ainda devem ser, feitos em carreiras de tiro com projeteis de borracha e com proteções a envolver-nos por todos os lados para não nos magoarmos. Sei que tive medo. Não sabia o que era aquilo, para o que servia...

Com o tempo fui me esquecendo de coisas daquela altura, mas há algo que não me esqueço. Da raiva. A raiva que ainda hoje predomina em mim. Ver todos os miúdos com saudades de casa, dos pais. Ser obrigada a mexer em objetos que não deviam estar nas nossas mãos, que ao longo da História foram utilizadas para nada mais do que destruição. Destruição causada por adultos. Armas que pertencem aos adultos. Nas mãos pequenas de crianças... Era simplesmente hediondo... Continua a ser hediondo...

Nada mudou.

Enquanto estou imersa nas memórias, chego ao elevador e entro, carregando no botão que me levará ao piso habitacional. Caminho em silêncio pelos corredores, com a minha porta como destino, quando algo me chama à atenção a meio do caminho. O Pedro está a apertar uma jovem contra o corpo, com o rosto escondido na curva do seu pescoço e suponho que ela lhe esteja a sussurrar coisas reconfortantes. As suas mãos sobem e descem pela coluna do rapaz, suavemente. Ele abana a cabeça antes de se afastar para a olhar nos olhos.

O espanto cobre-me o rosto, deixando-me de boca aberta.

A Camilla sorri-lhe docemente enquanto lhe esfrega os braços e se coloca em bicos dos pés para lhes beijar o rosto antes de se afastar dele... na minha direção. Rapidamente, escondo-me num corredor adjacente, desejando não ser descoberta pelo casal. Ela passa por mim sem me ver.

Quando espreito, vejo o Pedro percorrer o corredor principal, desaparecendo ao virar da esquina.

Suspiro.

- Então é por isso que estavas assim tão estranho...

Tinha intenções de me fechar no meu quarto e pensar nos prós e nos contras desta missão suicida. Contudo, acabo a sair pela parede falsa do meu quarto para a superfície. Sento-me nos degraus velhos e podres do alpendre e olho para lá da Cúpula, para aquilo que não consigo ver, que não consigo desvendar daqui.

Penso no que me espera. Penso no Pedro. Penso na bela jovem de olhos claros que acabo a descobrir ser mais do que eu esperava. Penso na Mia... Penso em mim.

Suspiro. Com as unhas cavo sulcos na madeira, calmamente, vendo-a ceder ao meu toque. Vejo o céu escurecer com o passar do tempo mas não faço nada para me mexer e voltar para dentro. O meu corpo parece que não me quer obedecer. É como se me estivesse a enviar um ultimato: Ou meto as ideias em ordem e tomo uma decisão ou não sairei daqui tão cedo. Respiro o ar descontaminado do interior da Cúpula.

Não sei precisar quanto tempo demorar até acreditar que tinha de o fazer. Mas, decidida, levanto-me dos degraus de madeira apodrecida pelo tempo, que a torna altamente perigosa e volto, pelo caminho feito anteriormente, ao meu quarto.

Rezo para que o Pedro esteja na sua habitação o tempo todo que demoro a chegar à sua porta. Ergo a mão na continuação do meu impulso. Porém, a minha consciência trava-me antes dos nós dos meus dedos chocarem com o material da porta.

O que é que estás a fazer, Sicca? Não te metas onde não és chamada! Tu não gostarias que ele se intrometesse na tua vida privada!

O problema é que eu não tenho propriamente uma vida privada. Não tenho vida. Mas ele tem.

Com esse pensamento em mente, preparo-me para bater à porta. O som dos nós dos meus dedos em contacto com a porta ecoa pelo espaço vazio que é o corredor em que estou. Deixo o barulho resvalar e morrer na minha espera por uma resposta.

É nesta altura que a contrariedade me invade. Por um lado, quero que ele esteja lá dentro, só que, por outro, será muito melhor que ele não esteja. Será mais fácil para mim...

Quando acho que não se encontra ninguém em casa e planeio em me ir embora, a porta abre-se, dando-me a conhecer um Pedro confuso do outro lado.

- Sicca? Que admirável surpresa...

- É... - Balbucio.

- Precisas de alguma coisa?

Encho-me de coragem e digo:

- Sim. Eu estou aqui para te dizer para não te preocupares, eu arranjarei uma forma de não teres de sair em missão, para poderes ficar aqui com quem amas, com a tua namorada.

Olho para ele. O Pedro parece cada vez mais confuso, com o seu sobreolho cada vez mais franzido.

- Namorada... Do que é que estás tu a falar?

Abro a boca para lhe responder quando uma voz doce me impede de o fazer.

- Pedro, quem é? – Pela porta que separa o quarto da sala que serve também de hall de entrada, a Camilla entra na minha linha de visão. Embrulhada numa toalha branca de aspeto macio, a jovem tem o seu cabelo castanho quase preto, agora libre das amarras do seu penteado prático de enfermeira, a cair-lhe em ondas molhadas até aos ombros elegantes. – Oh, Sicca... Olá... - Cumprimenta-me ela com um sorriso embaraçado.

Já eu, em vez de responder ao seu cumprimento, encaro o Pedro e sussurro:

- Disto...

Sem pensar duas vezes no assunto, vou-me embora sem esperar qualquer reação do Pedro. Também não paro quando ele me começa a chamar e, temendo que ele me perseguisse e me travasse, corro e só paro no meu quarto... Não, não é no meu quarto que estou. Estou com a Mia, deitada no seu sofá preto com a cabeça no seu colo, qual criança que precisa de conforto. Eu não falo e ela não me vem com conversa fiada ou faz perguntas, só me afaga o cabeço com momentos calmos e ritmados.

Sinto-me tão estranha, tão confusa. Não entendo nada de nada, nem a mim mesma ou os meus atos.

Esta não sou eu...



Digam-me... fui muito mázinha? O que esperam do capítulo 10? Fico à espera dos vossos comentários, até à próxima publicação, Testados.

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