— Como assim o material atrasou?
— Ocorreu um problema com a distribuidora. Coisas que sempre acontecem — Escuto o homem do outro lado da linha dando suas desculpas.
— Pois não deveria. E agora, o que direi ao meu cliente?
— Peça ao Fernando que explique, homens conseguem fazer isso melhor.
— Desculpa? O senhor sabe com quem está falando para fazer esse comentário pretensioso?
— Claro que sei, você é a secretária do senhor Bittencourt...
— O senhor está enganado, agora sou a nova presidente dessa filial, então exijo respeito e principalmente que o senhor reveja seus conceitos machistas se não quiser perder seu emprego.
— Me desculpa, eu...
— O senhor tem 24 horas para resolver esse problema com a distribuidora. Tenha um ótimo dia!
Desligo o telefone frustrada. Quatro anos fazendo isso é ainda não me acostumei com os comentários desses idiotas machistas.
— Clara, posso entrar? — Minha secretária pergunta colocando a cabeça para dentro da sala.
— Claro, Lili. Estou gostando de ver, falando em português — Ela entra na sala e fica vermelha de vergonha.
— Estou tentando falar apenas a língua da senhora para ir treinando meu português, tanto tempo aqui que já estava me esquecendo como usá-lo.
Lili se senta na cadeira a minha frente com uma pasta que eu imagino estar cheia de documentos para assinar. Lilian é meu braço direito dentro dessa empresa, quando vim assumir esse cargo, na época apenas como um favor para Fernando, fiz algumas entrevistas com secretarias e gostei dela logo de cara e desde então Lilian está comigo. Minha amiga e secretária.
— Já falei que mesmo aqui dentro, nada de senhora.
— Desculpa.
— O que tem aí nessa pasta? — pergunto apontando para os documentos em seu colo.
— Ata da reunião que acontecerá daqui a 18 minutos — Ela me responde olhando para seu relógio para ter certeza do tempo.
— Mais uma entre tantas, vamos lá.
Me levanto e sigo para a sala de reuniões da empresa. Lili fica o tempo todo do meu lado, subimos de elevador até o andar que acontecerá a reunião e quando entramos na sala, um grupo de homens fica em silêncio.
— Bom dia! — cumprimento a todos e me sento na cadeira com os demais a minha volta. A sala está cheia, alguns representantes de obras, clientes e acionistas estão presentes. Sou a única mulher da sala, o que se tornou um grande problema para todos e seus egos.
— Vamos começar a reunião. Lilian irá entregar uma ata referente aos assuntos de hoje, como todos podem ver o primeiro item é a obra do museu de Arkansas estamos com problemas de entrega de materiais...
— Já imaginava isso, mesmo porque esse projeto é um absurdo — um dos acionistas fala jogando a pasta sobre a mesa, respiro fundo e me encosto na cadeira.
— Me explique por quê?
— Pelo simples fato, de você querer um projeto sustentável em uma área no centro da cidade, os gastos serão maiores, nem um cliente em sã consciência vai aceitar isso, principalmente quando envolve tanto dinheiro.
— Qualquer pessoa com um mínimo de consciência vai comprar a ideia do projeto. Hoje em dia projetos sustentáveis não são uma questão de luxo e sim de necessidade. O projeto é maravilhoso, principalmente porque a estrutura vai ser feita com matérias recicláveis, depois de pronto os gastos serão muito menores do que de um projeto comum, sem contar que não vamos agredir o meio ambiente.
— Maria Clara, você e esses seus ideais, acorda menina! Essa é uma empresa de renome, você não pode ficar brincando de heroína.
— Eu sei muito bem o que essa empresa é, não preciso que o senhor me lembre — Olho para o homem com firmeza, em nenhum momento levanto a voz, mesmo porque não é brigando e gritando que se ganha autoridade.
— Sei que você foi uma ótima secretária e que Fernando confia em você, mas te colocar como presidente foi demais até para ele.
— Há quatro anos não sou a secretária e sim, a presidente dessa empresa e também uma das acionistas. Me deixe lembrá-lo que tenho 18% das ações, portanto tenho direito de estar aqui tanto ou até mais que o senhor.
— Também sou acionista garota e não admito que você me desmereça — sua voz ecoa pela sala e todos da mesa me olham.
— O senhor tem cinco por cento, enquanto eu tenho mais do triplo e como já mostrei várias vezes, sou capaz de estar aqui. Sou arquiteta e não apenas uma antiga secretária, então exijo que vocês se lembrem disso. Agora não quero mais ouvir reclamações sobre a presidente porque gostem ou não, sou eu. Se ninguém tem mais nada proveitoso para falar poderemos dar continuidade, isso aqui é uma reunião não uma sessão de terapia para vocês falarem sobre as suas frustrações.
Todos da sala voltam os olhares para as atas a sua frente, o homem que até alguns minutos debatia comigo, pega sua ata com fúria e volta a ler. O restante da reunião segue tranquila, conseguimos entrar em um acordo com os clientes e acionistas, o que me deixou mais aliviada.
Volto para minha sala e abro meu e-mail, recebi alguns do Fernando sobre a avaliação do projeto e como imaginei, ele adorou. Meu telefone toca e atendo no automático, um sorriso se abre em meu rosto quando escuto a voz da minha irmã.
— July, que saudades! — Ela funga do outro lado e já imagino que está chorando.
— Diz isso agora, mas me ligar que é bom nada — Reviro os olhos e sorrio para todo seu drama.
— Mas eu te liguei ontem.
— Para mim faz uma eternidade.
— Como está a minha princesa? — Escuto a risada da minha sobrinha e sei que está brincado.
— Está cada dia mais esperta e me deixando de cabelos brancos antes do tempo.
— Isso porque nem chegou à fase dos namorados... — Escuto July repreender Alice por algo que ela fez e aguardo sua resposta.
— Nem brinca com isso, Fernando fica louco só de imaginar.
— E eu não sei, tenho até dó da minha sobrinha.
— Clarinha, falta um mês para o aniversário da Alice de quatro anos, você virá não é? — Respiro fundo imaginando que agora minha irmã vai falar muito depois da minha resposta.
— Não posso ir, a empresa está cheia de projetos...
— Já pensei nisso, Fernando já arrumou alguém para ficar no seu lugar enquanto você estiver fora — July me corta e fala animadamente.
— Ele o quê? July o que eu te disse sobre tomar decisões por mim?
— Clarinha, faz quatro anos que você não vem ao Brasil. Nem quando Alice nasceu você veio, então seja lá qual for o motivo supere, porque eu não vou fazer como das outras vezes e ir até ai. Ou você vem nos visitar ou não vai ver sua sobrinha — Me engasgo de surpresa com as palavras da minha irmã.
— Você não faria isso.
— Já fiz, o aniversário será daqui a um mês, venha antes para me ajudar na organização e se quiser traga acompanhante. Me ligue quando comprar suas passagens, beijo amo você.
Fico parada olhando para o telefone na minha mão, sem acreditar no que acabei de ouvir. Perdida nos meus pensamentos, não sinto de imediato meu celular vibrar em cima da mesa. Olho para a tela e vejo a foto do Rodrigo, me trazendo um sorriso bobo no rosto.
— Oi, tudo bem? — pergunto assim que atendo o telefone.
— Oi, meu amor, está ocupada? — Rodrigo pergunta em português com o sotaque nítido, mas lindo.
— Para você nunca, mas do que se trata a sua ligação?
— Um convite.
— Ah, é? Convite para o quê? — pergunto girando em minha cadeira.
— Um coquetel. Posso passar para te pegar às nove?
— Claro, vou adorar. E antes que eu me esqueça, minha irmã ligou me intimando para a festa da Alice.
— Quando iremos? — sua pergunta me pega de surpresa e meus olhos saltam para fora.
— Você vai comigo? Que dizer se eu resolver ir, você vai?
— Claro que sim, minha linda! Você é minha namorada, vou estar sempre do seu lado. Aproveito e conheço um pouco sobre minhas origens — Suas palavras me emocionam.
Conheci Rodrigo há dois anos, ele é Engenheiro e trabalhou comigo em um projeto, nascido e criado em Nova York tem descendência Brasileira, por isso tem esse nome, foi uma homenagem que sua mãe fez ao avô que era um carioca. Rodrigo é lindo, maravilhoso, romântico e compreensivo e o mais importante um grande amigo. Quando eu me vi perdida, sozinha e sem ninguém, ele apareceu me dando apoio, carinho e seu amor. Nunca vou esquecer.
Nosso namoro aconteceu naturalmente, em um dia éramos amigos, assistíamos filmes e compartilhávamos segredos amorosos jogados no tapete do meu apartamento, no outro andávamos de mãos dadas pelas ruas de Nova York aos beijos e abraços.
— Vamos decidir isso mais tarde, agora vou para casa me arrumar, se não a noite estarei horrível.
— Você é linda de qualquer jeito, mas me ligue se precisar de algo. Nos vemos mais tarde tudo bem?
— Ok, até mais tarde.
Desligo o telefone e começo a arrumar minhas coisas. Chamo Lili até minha sala e peço que desmarque todos meus compromissos. Pego minha bolsa e sigo para porta.
— Ah, Lili! Não se esqueça, se até amanhã de manhã os materiais não chegarem, convoque uma reunião para à tarde com o advogado da empresa responsável.
— Pode deixar, Clara!
— Até amanhã! — Abraço minha amiga e saio da sala.
Vou direto para meu apartamento. Nunca vivi com o luxo que as dondocas vivem antes de vir para Nova York. Hoje moro em um apartamento luxuoso e muito bem localizado.
Sair do Brasil foi a melhor decisão que eu poderia tomar, sou uma das arquitetas mais conhecidas de Nova York. Amadureci muito nesses últimos anos, namoro um homem maravilhoso e principalmente esqueci meu passado ou, pelo menos, pensava isso, até a possibilidade de voltar ao Brasil e rever o homem que destruiu todos meus sonhos surgir.
A decepção me deixou em pedaços e me levou a tomar a decisão de vir para um país desconhecido e ficar longe de todos que amo para conseguir esquecê-lo. E deu certo, não é mesmo? Então agora se eu voltar para o Brasil, o que será por pouco tempo, vou olhar para ele e não sentir mais nada.
Ligo para o salão próximo a minha casa e marco com eles para daqui uma hora, o que me dará tempo para tomar um banho.
Tomo um banho relaxante tentando esquecer esses pensamentos da possibilidade de reencontrar meu antigo amor, caso volte ao Brasil. Que Deus me ajude se isso acontecer.
Chego ao salão na hora marcada, hoje quero uma coisa simples, mas elegante, por isso peço à cabeleireira que faça uma trança embutida. Um penteado sofisticado e simples. Quarenta minutos depois, me olho no espelho e gosto do que vejo.
Faltam algumas horas para o coquetel então decido fazer as unhas, maquiagem e massagem. Saio do salão às sete horas da noite me sentindo leve e relaxada, estava precisando dessa massagem depois do dia de hoje.
Chego a minha casa e vou direto para o quarto escolher um vestido. Coloco vários sobre a cama e não consigo decidir, foram tantos coquetéis nesses últimos anos, mas ainda é sempre a mesma demora para o vestido. Depois de minutos tirando e colocando vestidos decido por um de saia longa, na cor azul, com um decote profundo e sem mangas. Coloco uma scarpin de salto na cor nude e um conjunto de brincos e colar de ouro branco com pingentes ponto de luz.
Me olho no espelho e fico satisfeita com o resultado, retoco meu batom no tempo exato da minha campainha tocar.
— Sempre pontual — Olho para o relógio da minha mesinha que marca exatamente nove horas. Sigo para porta principal e quando abro me deparo com um lindo buquê de rosas brancas escondendo um homem que, pelo perfume, sei exatamente quem é.
— Rodrigo?! — Ele abaixa as flores e me olha com aquele sorriso no rosto, aquele que faz qualquer mulher se derreter por inteira de tão quente que é. Ele tem esse sorriso, fora que ele consegue causar uma sensação tão gostosa e desesperadora dentro da gente, que juro que se não tivéssemos um coquetel arrancaria esse smoking agora mesmo.
— Vai ficar só me olhando ou vai usar? Porque sou todo seu, linda, para fazer qualquer coisa que essa cabecinha esteja pensando nesse momento.
Reviro os olhos para o seu comentário e o convido para entrar, ele aceita e fecho a porta, antes que eu tenha a oportunidade de falar algo sinto meu corpo sendo empurrado para porta enquanto uma boca quente devora a minha. Minhas mãos são presas em cima da cabeça por mãos fortes.
Rodrigo me beija com intensidade, como sempre, sem nunca deixar a química que existe entre nós esfriar, pelo contrário, é cada vez mais gostoso estar com ele.
— Podemos ir para o quarto — ele sussurra e morde o lóbulo da minha orelha, mandando uma mensagem para todo meu corpo e me excitando, me deixando louca de vontade.
— Não, não podemos, o coquetel você lembra? — pergunto quase sem voz.
— Nesse momento não me lembro de nada, só de você.
Desvencilho-me do seu toque e sigo para a sala, ele se aproxima limpando o batom da boca, me olha e pisca. Pego uma almofada e jogo em sua direção, mas ele consegue pegar e sorri para mim.
— Estou toda amassada agora.
— Continua linda — Deposito um beijo casto em seus lábios e vou em direção ao quarto.
Me olho no espelho e noto que o estrago foi apenas no batom, Minha roupa, por incrível que pareça, está do mesmo jeito. Retoco o batom enquanto Rodrigo se arruma do lado oposto.
— Como foi seu dia, amor? — me pergunta enquanto se olha no espelho.
— Problemas com entregas do material do museu, os acionistas questionando minha autoridade... — Respiro frustrada e antes de perceber sinto os braços de Rodrigo em volta da minha cintura.
— Ninguém disse que seria fácil, Clara, mas você vai conseguir e sabe por quê?
Fiz que não e ele continuou:
— Porque você é a melhor arquiteta que conheço, você vai dar conta, linda! — Encosto minha cabeça no seu peito e sorrio com suas palavras.
— Obrigada.
— Agora me diga como estou?
Me viro e encaro um par de olhos verdes, Rodrigo tem a pele bronzeada, cabelos claros, irradia sensualidade por onde passa e, acima de tudo, é carismático, sempre está de bom humor. Nunca o vi reclamando de nada, até quando está com problemas resolve com o seu bom humor habitual.
— Gato, como sempre!
— Não é novidade! — sua resposta me faz dar um tapa em seu braço arrancando gargalhadas dele.
— Vamos, seu convencido, esse quarto já está pequeno demais para tanto ego.
Saímos de mãos dadas do apartamento e seguimos o caminho todo até o luxuoso salão onde acontece o evento. O lugar está muito bem decorado, pessoas bem vestidas circulam pelo lugar como se fossem suas casas.
— Pronta, Clara? — Rodrigo me pergunta quando chegamos à entrada principal.
— Sim.
Como se uma aeronave estivesse sobrevoando as nossas cabeças, todos do lugar nos olham, algumas mulheres cochicham e fazem caretas, imagino o motivo. Bando de invejosas.
Mas apenas uma pessoa me faz parar quando nossos olhares se cruzam, um sorriso brinca no rosto da criatura que quase destruiu minha carreira. Ela deposita na mesa sua taça de champanhe e se aproxima de cabeça erguida e passos firmes.
— Maria Clara, que surpresa! — Ela se aproxima para me cumprimentar, mas me afasto dando um passo para trás, Rodrigo me encara sem entender nada.
— Como vai, Amanda? — Nesse momento vejo os olhos do homem ao meu lado se arregalar e a mulher parada a minha frente aproveita para analisá-lo de um jeito bem indiscreto.
— Muito bem, e você pelo jeito melhor ainda — Ela destila seu sarcasmo olhando para Rodrigo que a encara de testa franzida.
— Não vai me apresentar, Clarinha — Ela fala estendendo a mão para ele, que como sempre um cavalheiro, aperta com gentileza.
— Prazer, Rodrigo Sammers. E você, quem é?
— Amanda, muito prazer.
Rodrigo passa o braço pela minha cintura e pede licença a Amanda.
— Essa é quem eu penso que é? — ele pergunta baixinho
— É sim, a própria.
— Bom saber, assim ficaremos bem longe dela.
— O difícil é saber se ela vai ficar. — Ele me olha e deposita um beijo em minha testa.
— Vamos, amor, vamos falar com alguns clientes.
Olho para trás e, como imaginava, Amanda tem os olhos fixos em nossa direção, ela levanta sua taça em sinal de brinde e sorri friamente.
Será uma noite longa, muito longa.
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Sedução - DEGUSTAÇÃO
RomanceClara sempre amou perdidamente o melhor amigo de sua irmã, porém ele nunca a olhou como ela desejava. Até que após algumas doses de whiskey tudo acontece e ela tem a melhor noite de sua vida, mas Matt não se lembra. Decepcionada e com o coração part...