Capítulo 12

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Anigel teve um sonho estranho no qual acontecia uma coisa jamais vista na história da humanidade da Península. As chuvas não chegavam.

Em vez das tempestades habituais que, vindas do Mar do Sul, inundavam Zinora e Var, Ruwenda, Labornok e Raktum, mais as ilhas de Engi, durante duas estações todos os anos, houve apenas meses e meses infindáveis com o sol brilhando no céu sem nuvens e um vento quente soprando dia e noite, castigando impiedosamente as pequenas nações. Toda a Península foi devastada, mas Ruwenda, sem saída para o mar, sofreu mais do que todo o resto.

Da sua janela, na Cidadela, Anigel viu o vasto Mutar transformar-se num filete d'água, depois também o Rio Skrokar, o Virkar e o Bonorar. O Lago Wum, alimentado por esses rios, secou completamente, impedindo o transporte da madeira da Floresta Tassaleyo para as serrarias. O comércio fluvial desapareceu. A seca assolou as fazendas de Dylex e skriteks monstruosos e famintos saqueavam Ruwenda de uma extremidade à outra.

Seus pais, o Rei Krain e a Rainha Kalanthe, acompanhados pelos soberanos de outras cinco nações imploraram a Anigel Para trazer de volta as chuvas. Anigel disse que não sabia como fazer isso, e eles foram embora, desesperados.

No sonho, sua irmã Kadiya a informava que o solo lamacento dos alagados de Ruwenda estava seco. As plantas e os arbustos secaram, e não havia mais flores, nem frutos. Os fungos suculentos perdiam toda a umidade e os liquens verdes, nutritivos, viraram palha. As árvores da selva perdiam as folhas.

— Reze! — insistia Kadiya e Anigel rezou, segurando o amuleto com o Trílio Negro nas mãos febris. Mas o vento quente soprou com mais força em volta da Cidadela e Kadiya afastou-se, furiosa. No sonho, ela via os corpos dos animais mortos, por toda parte, pilhas de pele e ossos. Tudo por sua culpa.

Sua irmã Haramis apareceu para avisar que o povo seria a próxima vítima: todos os humanos da Península e os nativos do Pântano e das montanhas. No sonho, Haramis apontava para o norte, onde, segundo diziam, moravam a Dama Branca e o Feiticeiro Negro. Só os dois sobreviveriam, avisou Haramis, se Anigel não trouxesse as chuvas.

A morte viria do norte — não sob a forma de um vento quente e seco, mas com uma grande tempestade de fogo resultante do conflito final entre a Arquimaga Binah e Orogastus. O fogo consumiria todo o mundo conhecido, a não ser que a pequena e indefesa Anigel evitasse.

— Mas eu não posso! — gemeu ela, com a alma cheia de terror. — Tentei, mas não sei o que fazer! Meu coração sofre profundamente e estou cheia de medo e — simplesmente não posso!

No sonho, os reis e rainhas da Península, seu pai Krain, sua mãe Kalanthe, a brava Kadiya e a inteligente Haramis olharam para ela com pena e desprezo. Depois a deixaram trancada no quarto, sozinha, ignorada por todos. Anigel batia na porta, soluçando, mas ninguém aparecia. Então ela olhou outra vez pela janela e viu uma parede de chamas que se estendia de horizonte a horizonte, mais alta do que a torre da Cidadela.

O fogo avançou rugindo na direção dela e Anigel começou a gritar, a gritar.

— Acorde! Não chore, doçura, está tudo bem!

As chamas eram agora lírios encarnados com listras negras, dançando, enquanto ela se contorcia numa rede, suspensa pelos cipós da planta. Anigel estava no canto de uma sala com paredes de blocos quadrados de pedras, toda enfeitada com plantas floridas. Immu a segurava, procurando evitar que ela caísse da rede.

— Um sonho, foi só um sonho — disse a velha nativa com voz doce. — Você está segura, minha querida, salva. Aqui em Trevista, com amigos.

Finalmente Anigel parou de gritar, saiu da rede, trêmula ainda, e sentou num bloco de pedra. Immu passou uma esponja molhada no rosto da princesa, penteou os cabelos emaranhados, ajudou-a a vestir uma túnica longa, rosada. Anigel disse, em voz baixa:

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⏰ Última atualização: Sep 20, 2016 ⏰

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O Trílio Negro - Trilio - Vol 1 - Julian MayOnde histórias criam vida. Descubra agora