Capítulo 2 - O Reencontro

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Um despertador tocou ao longe. Amara, irritadíssima, atirou o travesseiro onde sabia que a fonte do som estaria, acertando-o em cheio. Odiava acordar cedo mas, mesmo sendo sábado, tinha que ir trabalhar. Levantou-se, praguejando em todas as línguas pelas dores no corpo.

Tinha um vestido de casamento muito especial para terminar em poucos meses. Havia desenhos espalhados pelo seu ateliê, com vários manequins e rolos de tecido em todos os cantos. Mesmo tendo ideias boas e bonitas, nada parecia satisfazer a designer. Nada parecia ser especial o suficiente para fazer parte do dia especial da Primeira Ministra do país. Mesmo com as ideias da cliente, nem ao menos tinha um tema, apenas desenhava o que aparecia na mente e torcesse pra que no final conseguisse um ponto de partida para o vestido. Para dificultar, a Ministra havia-lhe dito apenas as restrições, coisas que o vestido não deveria ter. Regras da vida pública de uma pessoa política, Amara supôs.

Amara fechou a porta to apartamento, xingando baixo pela dor na perna. Antes, seu ateliê era na sua própria casa - as vezes as criações invadiam o seu quarto -, mas o seu médico a forçou a construir o local de trabalho em outro lugar. Misturar a sua vida pessoal com a sua carreira só lhe trouxe problemas. Odiava a si por ter obedecido, mas sabia que era necessário. Agradecia, porém, por ter arrumado um armazém perto do seu prédio, o que fazia a caminhada pelo curto caminho até ele cada vez mais excitante. 

O lugar era bonito, com uma fachada de tijolos vermelhos do lado de fora. Mesmo aparentando não ser nada, o local era sofisticado a sua forma. Do lado de dentro, o primeiro andar era pintado de branco. O piso, de todos os 3 andares, era de cerâmica acinzentada, como de piso de fábrica. Por questões de facilidade na locomoção, os manequins e rolos de tecido ficavam embaixo, mas as vezes apareciam nos outros andares. Havia uma pequena copa num dos cantos da construção, onde Amara mantinha toda a cafeína que lhe era necessária. 

Andou por entre os objetos, tentando chegar o mais rápido possível na escadaria, localizada no canto oposto da copa. Como havia passado por uma das cafeterias no caminho para o trabalho, não precisou preparar nada. Antes mesmo de pisar no primeiro degrau, ligou o aparelho de som, deixando tocar a sua playlist especial para trabalhar. Nela, tinha músicas de todos os gêneros, de kpop até funk, passando por heavy metal e mpb. Ultimamente, tinha escutado mais músicas indies junto aos maiores sucessos das décadas passadas, justamente para ter inspiração. Não que tivesse adiantado algo. 

Subiu até o segundo andar, andando até o meio do ambiente. Por todas as paredes, colados nela com fitas coloridas, diversos desenhos. Croquis, aquarelas, não havia um espaço vazio por todo o cômodo. No fundo, logo acima da porta de entrada do andar de baixo, uma janela única substituía o que devia ser parede de tijolo. Pegou um bloco usado pela metade, um estojo e o apoio, sentou no chão, perto da parede mais próxima, e começou a desenhar. Gastara umas vinte folhas antes de um barulho a chamar pra longe da bolha de criação. Seu celular, em algum lugar do ateliê berrava aquele jingle chato da marca, desesperado para ser atendido. Amara, desistindo das possibilidades de ignorar ele, saiu a procura do bendito pedaço de metal. Não é como se odiasse aparelhos eletrônicos, mas gostaria de ser menos dependente deles para poder ser alguém no mundo. Após lentos segundos procurando, achou-o e olhou o identificador. 

— Número privado? Quem é o corno? — Disse irritadiça. Antes de deixar cair na caixa postal, atendeu, saudando a pessoa do outro lado da linha com um grunhido rabugento.

Boa tarde pra você também, princesa. — Respondeu a voz do outro lado da linha. Masculina, grave e familiar. 

— Quem é? — Amara pergunta.

Como não me reconhece, Amara? — Brincou a voz. — Sou eu o Kike. 

— Kike? Como conseguiu o meu número? — Perguntou Amara desconfiada. Fazia uma semana desde que tinha recebido os ingressos e, mesmo assim, não pôde conter a suspeita.

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