III

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Acordo como habitualmente às seis da manhã para fazer um treino antes das aulas, hoje vai ser apenas um treino físico pois já tenho treino de futebol à tarde. Vou fazer as provas para entrar na equipa feminina da universidade. Sei que provavelmente não me vai ser facilitada a entrada e que a concorrência deve ser muita mas tenho de conseguir. É o meu sonho e o meu objetivo, claro que não quero ser jogadora de futebol profissional mas poder entrar para a equipa durante os anos universitários seria um grande triunfo pra mim.

Evito fazer barulho ao sair do quarto para não acordar a Mia que se farta de dar voltas na cama, a sério nunca vi uma pessoa mexer-se tanto durante o sono, os lençóis estão completamente desfeitos e espalhados por todo o lado menos pelo corpo dela que é onde deviam estar. Saio e deparo-me com um corredor vazio, aparentemente os estudantes universitários acordam todos na hora das aulas. Alegro-me por poder usufruir de uma pista de corrida vazia, aperto o casaco de desporto porque convenhamos que ainda é cedo demais para que estar de top e o sol ainda está a nascer para poder aquecer-me. Começo a minha corrida calma e controlada de 30 minutos e quando estou na minha segunda volta deixo de estar sozinha e estou agora a ser acompanhada pelo César que definitivamente não sente o mesmo frio matinal que eu, pois só se encontra com uma t-shirt sem mangas azul escura que deixa bem vistosos os seus bíceps perfeitamente delineados.


- Bom dia. – diz-me com um sorriso rasgado.

- Bom dia. – tento retribuir o sorriso mas tenho de admitir que flertar nunca foi o meu forte, aliás nem me lembro de alguma vez o ter feito.

- É raro encontrar aqui alguém a treinar a esta hora.

- Pois eu tenho o hábito de o fazer e não conseguia passar o dia sem ele.

- É bom poder ter companhia então. Isto se não te importares claro.

- Não me posso importar, isto é público.

- Sim mas podia correr afastado de ti ou junto contigo.

- Vai ser bom ter alguém com quem treinar, geralmente faço-o com o meu pai.

- Então estás em que área?

- Desporto. – não tenciono continuar uma conversa quando estamos em plena aceleração rítmica e falar só desperdiçaria mais fôlego e energia. Sorrio na esperança que ele entenda que não quero ser rude, apenas continuar o que aqui vim fazer. Já corri o tempo estipulado e agora é hora de fazer alguns alongamentos.

- Já vais acabar?

- De correr sim. Vou passar aos alongamentos e abdominais.

- Abdominais?

- Só costumas vir correr?

- Geralmente faço uma pequena corrida só para me manter em forma.

- Pois mas no fim da corrida é aconselhável alongar.

- E os abdominais?

- Isso é por prazer. – ele ri-se e dou por mim a rir também, parece que nos damos bem e é bom poder fazer amizades quando estou longe de casa.


Depois de uns alongamentos às pernas e à coluna deito-me agora na relva para fazer uns abdominais. Tinha intenção de o fazer quando sinto a mão do César na minha perna, tremo com a sensação e o susto, não que tenha medo dele mas não estava à espera que me tocasse.

Levanto a cabeça para olhar para ele e com um sorriso travesso senta-se ao meu lado.


- O que foi?

- Só queria saber se queres que te segure os pés ou a cabeça.

- Bem eu estou habituada a fazer sozinha.


Tem agora a mão pousada sobre o meu joelho que está dobrado.


- Por isso o teu treino está a demorar tanto hoje! – o meu dia estava a começar tão bem porquê que este imbecil tinha de aparecer quando ainda nem são oito da manhã e o meu cérebro não está preparado para suportar o seu tom satírico.

- Não costumas acordar tão cedo H.

- Pois mas senti a tua falta no quarto. Mas olhando para o que te prendeu aqui eu entendo. – diz isto enquanto percorre o meu corpo todo com uns olhos repletos de escárnio. Volto a fechar o casaco e levanto-me furiosa.

- Vemo-nos por aí César! – passo pelo irmão da minha colega de quarto lançando-lhe um olhar travesso que o faz desfazer-se em sorrisos que não entendo a natureza.

- Até logo.

- Até depois para ti também Carolina. – ainda se acha cheio de graça a tratar-me como se eu fosse o seu novo plano de chacota. Não me viro para olhar para ele, ouço ainda ao passo que me afasto que ele se continua a rir. De mim.


Entro no quarto e atiro o meu casaco para cima da cama furiosa, quem ele pensa que é para me tratar assim, não foi por me ter defendido ontem que pode falar comigo como lhe apetece. Começo a andar de um lado para o outro no quarto apertado e é então que me apercebo dos intensos olhos escuros que estão pousados em mim acompanhados de um sorriso agradável.


- Desculpa, não vi que estavas aí.

- Isso vi eu, porquê que achas que me estou a rir.


Sento-me agora na cama derrotada e exausta. Não foi o treino que me cansou mas o pequeno confronto com o irmão dela. Bufo e deixo cair os ombros sentindo um peso sair de cima de mim.


- O que se passou? Acordei e já não estavas aqui.

- Saí cedo para treinar.

- E aconteceu alguma coisa? O Joel apareceu? Não me digas que nada atras de ti agora.

- O quê? Não! Não foi nada disso. Eu estava a treinar, o César apareceu, treinamos juntos e estava tudo a correr bem até que o teu irmão apareceu.

- O meu irmão apareceu no campo de futebol?

- Sim. Porquê que dizes isso como se fosse muito estranho.

- Porque é. Mesmo estranho, ele aparece apenas nos jogos de futebol e nos treinos. Nunca o vi fazer exercício nesta universidade sem ser nesses dois contextos.

- Eu não sei se ele foi treinar, só digo que apareceu, e começou a gozar comigo, não sei o prazer que lhe pode dar.

- Não sabes mesmo?


Ela continua a sorrir pra mim como se as perguntas que me está a fazer fossem de resposta óbvia. Sinto-me uma espécie de cobaia encurralada nestas quatro paredes.


- Devia saber?

- Deste-lhe uma abada e ainda nem se conheciam. Tu não imaginas como ele ficou lixado. Só sei que pensava que não te voltava a ver e aqui estás tu a partilhar quarto com a irmã dele. O sarcasmo que ele usa contigo é só a maneira de ele lidar com isso, não leves muito a peito, ele não o faz por mal.

- Meu deus foi só um jogo de futebol e foi porque ele começou a provocar.

- Não ligues, o H é mesmo assim e tenho a certeza que não o faz por mal. E ate sei porque o continua a fazer.

- E seria porquê?

- Já viste o teu estado quando estás irritada? Eu não me paro de rir só de imaginar como chegaste aqui, imagina ele. Tens de o ignorar que ele pára.


Tenho de o ignorar. Por mim tudo bem, não há nada que me vá dar mais prazer do que ignorar um rapaz presunçoso que não suporto. E a Mia conhece-o melhor que eu, se ela diz que vai resultar é porque vai. Está decidido a partir de hoje vou ignorar qualquer comentário trocista que o H possa fazer em relação a mim. Mais vou ignorá-lo completamente!

Amor VagabundoOnde histórias criam vida. Descubra agora