Passei o dia pensando em como falar com a minha mãe. Foi uma tarde intrigante.
Loren vira e mexe aparece lá em casa, mas é raro dar mais de dois passos para dentro da porta de entrada. Jamé seria proibida de entrar em minha casa, não há vergonha para nós nisso, até pelo fato de ser amiga íntima minha, só não é costume.
E, além do mais, não fazia a menor ideia de como tia Mia poderia reagir ao nosso pedido, ela andava estranha por esses dias. Então optei pelo pessimismo, um pessimismo preventivo.Quando chego em casa, mamãe está sempre cozinhando. E dessa vez não foi diferente.
Aquele cheiro estava tão bom... Torci para que fosse algo com batatas. (Quem no mundo consegue não gostar de batatas?)
Cumprimentei minha mãe, fui até meu quarto, escolhi uma roupa, tomei banho e voltei para a cozinha, sem enrolação. Era como se eu dissesse "mãe, sua linda, tenho um pedido a fazer".
- Amy? Já se lavou? - Disse meio que espantada, meio que querendo rir.
- Sim, mãe.
- Em menos de meia hora e antes de procurar o que comer?! Isso é novidade.
Respondi com um riso.
- Quê faz aí, parada atrás de mim?
- Algo a dizer, mãe. - Fui me aproximando, com as mãos para trás, passos vagarosos.
- Logo vi. Diz, o que quer? - Soltou na pia uma colher e mesmo com as mãos molhadas, colocou-as na cintura.
- Loren vem dormir aqui. - Fechei os olhos feito criança que apronta e sabe que vai levar uma bronca. Estava trabalhando argumentos na mente, confesso, e rezando "deixa, deixa, deixa".
- Loren vem dormir aqui? Por quê? - Não tirava as mãos da cintura.
- Também quero descobrir. A loira estava um pouco diferente... Deixa?
- Claro, Amy, que pergunta boba. - Voltou-se para a pia, pegou de novo a colher, mexeu algo na panela. Isso me deixou bem mais a vontade. - Se fosse outra amiga sua do colégio já não sei, mas Loren é Loren, claro que pode.
- Ai, graças! Obrigada, mamãe. Agora comida. Rápido. Tem batata aí? - Não ria, eu queria mesmo comer batata.
***Não sou rica como Loren, é verdade, mas vivo bem. A casa em que moro até que é bonita, aos fundos, bem próxima ao jardim e à estufa.
(A única desvantagem disso são os insetos. Detesto insetos. Tenho alergia.)
A casa parece maior desde que eu e minha mãe passamos a morar sozinhas aqui, tem dois andares sem contar com o porão, mas não é tão extensa.Papai ensinou-me a gostar de arte. Ele fazia de tudo. Na mansão, algumas de suas obras estão expostas, Loren até tem uma ou duas que recebeu de presente. Eu tenho muitas. E continuo fazendo. Por mim e por ele... O porão está cheio delas.
Johnny era louco, completamente alucinado por música, saia com os amigos para tocar. De dia, se não encontrasse Johnny em casa, certeza de que estaria estudando ou ensaiando; de noite, se não o encontrasse, certeza de que estaria tocando com os amigos em bares e eventos, coisas do gênero. Até que conheceu Rose. Eles namoravam, e para passar mais tempo com ela, maneirou um pouco nas noites à fora, passava mais tempo em casa.
Rose era uma aventureira reprimida, filha de italianos de sangue bem quente, tradicionais. Foi difícil para a família dela aceitar meu irmão, mas quando seus pais viram na filha a felicidade que ela carregava por sentir-se livre, acabaram se adequando a Johnny e ao relacionamento dos dois. Rose adorava as maluquices ajuizadas de Johnny, e também gostava de passar tempo comigo e meus pais em nossa casa - coisa que nós também gostávamos. No fim das contas, eles tiveram a bênção de todos.
Depois do acidente, tentamos manter aquele contato próximo, mas era doloroso para ambas as partes: para nós duas, digo, mamãe e eu, porque tudo em Rose nos lembrava Johnny, e idem para Rose. Então ela partiu, voltou para a Itália e foi viver a vida, foi recomeçar.
Minha mãe diz que o jeitinho de falar de Rose é idêntico ao de meu pai. Eu nunca achei. Mas minha mãe, depois do acidente, bastava trocar duas frases com Rose para sentir vontade de chorar.
Às vezes, recebemos notícias dela, e ficamos felizes em saber que Rose está bem, formada, estabilizada na Itália. É quando manda notícias que reforça o convite de ir visitá-la, passar as férias com ela. Se dona Olivia já pudesse vê-la sem abater-se tanto, já teríamos ido, mas como não é o caso, respondo a Rose que iremos em breve. Eu poderia ir sozinha, se minha mãe tivesse companhia durante durante minha ausência, não quero deixar aqui, sozinha.
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Amiga, Se Eu Fosse Você...
Teen FictionComo seria trocar de vida com a sua melhor amiga? Em "Amiga, Se Eu Fosse Você..." isso acontece! Amy e Loren trocam de lugar, e passam a entender muito mais sobre a vida uma da outra.