Capítulo 09

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"Eu lhe daria todas as rosas do mundo, mas o que você faria com elas? Deixaria murchar em canto qualquer?"

Sinceramente o que veio a seguir foi algo indigno, e não apenas de mim, ou dela, mas de ambos. De um lado ela se esforçava para manter as conversas leves, e sem qualquer resquício dos acontecimentos passados, e do outro lado eu tentava deixar de fora a parte de mim que clamava por ela a cada minuto. Sempre que possível conversávamos, e os assuntos eram quase os mesmos, livros, nossas vidas, nossos planos, coisas simples da vida, em alguns momentos era como se simplesmente fossemos bons amigos dividindo um bom momento de papo, mas então uma pontinha de assunto delicado surgia, e a tensão se materializava entre nós. Quando havia uma terceira pessoa envolvida, eu rapidamente desconversava, e arrumava uma desculpa para ir embora. Entendendo que as pessoas não largam um assunto com facilidade. No entanto tudo isso era muito estressante, e incomodo demais ter que ficar escolhendo assuntos, medindo cada palavra, cada construção de oração. Logo me enchi de tudo isso, e tomei uma decisão, que pode ser considerada apenas paliativa, mas como eu disse antes tudo havia se tornado um jogo de tentativa e erro.

Preparei tudo para colocar minha ideia em pratica, o mais rápido possível, e quando tudo estava certo, achei por bem comunicar a ela. Estar diante dela tinha se tornado doloroso demais, então eu cogitei a possibilidade de fazer isso por mensagem, mas acabei decidindo que o melhor a fazer era mesmo pessoalmente. Apenas enviei uma mensagem pedindo que ela me encontrasse no parque na tarde do dia seguinte, quinta feira.

-Que bom que pode vir Valentina, eu não vou tomar muito do seu tempo. Prometo!

- Relaxa. Eu indiquei seus livros para algumas amigas, elas estão amando também.

- Que bom, por favor, agradeça a elas pelo carinho.

- Pode deixar. Você disse que tinha algo importante para me falar.

- Sim, claro, eu quero te contar que resolvi aceitar um convite antigo para escrever para um jornal do Rio.

- Nossa que máximo! Parabéns Nick.

-É bem legal mesmo, tipo estou bem feliz – Pelo menos eu estava tentando mostrar que estava feliz – Amanhã no final da tarde já vou para lá.

- Tão rápido? Não pode escrever para eles, e morar aqui em São Paulo?

-Em tese sim, mas chegamos a conclusão de que é melhor eu morar lá, assim capto melhor o clima carioca, e os textos ficam melhores.

- Faz sentido, mas você vai fazer falta aqui.

-Não sei se isso é verdade, o pessoal já está acostumado com minhas frequentes viagens, e eu vou aparecer sempre que possível.

- Morando aqui, você quase nunca está aqui, imagine agora.

-Tentarei fazer o meu melhor. Talvez seja mesmo a hora de crescer, tomar mais as rédeas de minha vida, me tornar um adulto como devo ser.

-Você já faz tudo isso, não seja bobo.

- Em parte sim, mas será algo bom ir para lá, terminar meu livro, e colaborar no jornal.

- Eu espero de todo coração que realmente seja. Boa sorte Nick.

Desde o dia de nosso encontro, e do beijo, eu a tinha convidado nem mesmo para tomar um refrigerante, estando apenas nós, mas naquela tarde a convidei para um lanche, e ela aceitou, talvez porque soubesse tanto quanto eu, que demoraríamos em nos reencontrar. Foi uma tarde agradável, tranquila, e muito divertida, onde a Valentina espontânea, viva e sem filtros quase se mostrou por completo, enquanto eu tentava decorar com fidelidade cada parte dela.

Na tarde da sexta feira peguei um voo para o Rio de Janeiro, deixando meus pais com os olhos cheios de lagrimas, e levando milhões de recomendações na bagagem. Embora o objetivo daquele afastamento não fosse sair da casa de meus pais, no ultimo abraço de meu pai pude sentir que havia em nós a cumplicidade do fato de que eu não retornaria a casa dele, que caminhos se dividiam ali, como se São Paulo, eu,, Valentina, e meus pais, não mais pudesse ser colocado juntos em uma mesma oração. Tomei maior consciência disso, quando o avião decolou, e a cidade cada vez menor passava lá em baixo, mesmo sem entender o motivo, e eu chorei copiosamente durante quase dez minutos.

A chegada ao Rio foi tranquila, Jônatas, meu amigo, e contato no jornal foi me buscar no aeroporto, e me levou para o apartamento que eu tinha alugado na zona sul, não era algo de extremo luxo, até porque eu nem mesmo o tinha mobiliado, mas as providencias que gentilmente ele tinha tomado, havia dado um clima aconchegando ao lugar, com o tempo eu ajeitava tudo por ali.

Naquela mesma noite decidimos sair para jantar, apesar relutância em ir para longe, ele insistiu em me levar em um restaurante na Lapa, e come convenceu com o argumento de que a comida e o ambiente eram ótimos. Saímos de meu apartamento as dezenove horas, chegamos ao lugar um pouco depois das vinte horas, o transito era quase tão caótico quanto em São Paulo numa sexta a noite. Mas o lugar realmente valia a pena, a comida era mesmo muito boa, a música ao vivo era de boa qualidade, e o ambiente agradável, apesar de cheio. Jantamos, e ouvimos um pouco de musica até quase as vinte e duas horas, O Jonatas disse que era muito cedo ainda, e que queria me apresentar um pouco do bairro, e eu sabendo que ele nasceu ali, deixei que ele fizesse as honras. Caminhamos por diversas ruas, ele falando sobre a infância, sobre os amigos, e acho que propositalmente ele deixou os arcos por ultimo, sem duvida aquele era um orgulho para os naturais dali, e para os cariocas em geral. Enquanto ele falava sobre os famosos Arcos da Lapa, ouvimos gritos, uma mulher pedindo ajuda, minha primeira ação foi olhar para o meu amigo, e que olhava para mim claramente esperando que eu não fizesse uma besteira, e então olhei ao redor, e há uns cento e cinquenta metros a nossa esquerda estava a mulher sendo agredida por dois homens, que claramente tentava levar algo dela, que segurava apesar dos golpes. Corri para ajuda-la, e no meio do caminho vi o mais alto dos homens sacar uma arma, e apontar para a mulher, quase que no mesmo momento ele me notou correndo para eles, e desviou a arma para mim. Antes que eu pudesse pensar em me jogar no chão, ouvi o barulho seco da semiautomática liberando a bala, e estando ainda em pé recebi o segundo tiro no peito. Tudo escureceu.

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Desculpem a demora... Espero que gostem!

Beijo de Outono [Completa]Onde histórias criam vida. Descubra agora