Hal: Parte II

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15 de março, 2070.

Fazem alguns meses desde que perdi completamente minha inocência nessa cidade. Todo dia seus horrores me surpreendem cada vez menos, e estou passando a estranhar quando consigo ter uma rotina comum, sem mortes ou roubos. Minha mulher já havia começado a me estranhar, dizer que o trabalho me consome demais, e em nosso tempo livre não consigo agir como um ser humano normal, ela está preocupada comigo.

Para esse dia se tornar pior a única peça que falta é o dispositivo anti-incêndio detectar a fumaça do meu cigarro como ameaça e inundar a sala toda, mas isso é um defeito que não ocorre em anos.

Recebi o novo caso em meu computador como sempre e no ritmo que ando não faço o esforço para ler a introdução passada pelos policiais da cena do crime, mais obsoleto que nunca. Eu deveria ter seguido o conselho do meu pai e ter virado programador fixo de corporação como ele.

Ignorei completamente o caso e passei pro próximo detetive, sai da fila de espera no computador e fui até meu pequeno armário escolher meu sobretudo, escolhi o de cor preta e agarrei meu chapéu pendurado na parte de trás da porta. O Bar me esperava.

Ter encontrado esse bar foi a melhor coisa nessa cidade, não se tratava de qualquer bar sujo cheio de bandidos e tocando aqueles barulhos eletrônicos insuportáveis, e sim de um autêntico bar de pessoas direitas, o que já era difícil de se encontrar, e com música de verdade. Parei meu carro no estacionamento atrás e entrei pelos fundos, nada lá dentro era como a maioria das pessoas estavam acostumadas, sem modernidades ou tecnologia demais, apenas luz fraca, um pequeno palco, banda de jazz, balcão espaçoso e um bom whisky.

Sentei calmo em uma das mesas e o garçom nem mesmo precisou trocar palavras comigo, sabia o que eu iria pedir e trouxe-me com rapidez um copo e meia garrafa de whisky. Além de mim deveriam ter 5 ou 6 pessoas, sempre vazio.

Depois de aliviar um pouco o stress voltei para o mundo real dentro de meu carro. Minha situação financeira não era das melhores, me atrapalhei com dívidas e tenho que me matar de trabalhar para pagá-las, porém eu continuo recusando casos atrás de casos pela falta de interesse e por estar de saco cheio.

Uma chuva começou, observei os pingos escorrerem pelo vidro e deitei minha cabeça no banco fechando meus olhos por um momento. Eu preciso de férias urgentes, bem longe daqui, talvez em uma praia artificial, um lugar onde exista o sol mesmo que não seja verdadeiro.

Escutei sons de batidas na minha janela direita, olhei para encontrar o que parecia ser uma mulher usando uma capa de chuva abaixada esperando que eu abrisse. Abaixei a janela um pouco apenas.

- Sim?

- Você é o Detetive Hal? – Não consegui enxergar muito bem sua aparência.

- E se eu for?

- Sou Samantha La Vie, faço parte da diretoria geral do Departamento de Polícia de Neo York. Posso ter uma palavra um minuto com o senhor? – Agora que ela mencionou esse sobrenome, realmente possuía um sotaque francês pouco carregado. Abri a porta e a moça se sentou no meu banco de couro com aquela capa molhada. Vadia.

Saquei minha pistola com a mão direita e apontei em direção a ela.

- Você é muito bela com seu estilo todo escuro e seu sotaque francês, mas não é uma boa mentirosa. Eu conheço a diretoria geral e não existe nenhuma La Vie, mesmo se existisse, ela não me encontraria em meu carro, atrás de um bar no meio de uma chuva. Me diga sobre o que se trata agora.

- Tenho te observado há vários dias naquele bar, e você parece ser bem capaz para preencher uma vaga para meu chefe. – Mantive minha pistola apontada.

Selva de Aço e ConcretoOnde histórias criam vida. Descubra agora