Nerta

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Avistei a toca de minha mãe no horizonte, estava do mesmo jeito.
O local descampado, as pedras, a grama verde e o vento forte bagunçando nossos pelos.
Para nossa sorte ela estava lá, deitada sobre uma das pedras planas cobertas de musgo.
Que coisa estranha.
Havia uma coruja amarronzada com ela.
- Mãe! - tento andar um pouco mais rápido. - Mãe!
Vejo ela se levantando e murmurando algo com a boca.
Talvez ela não acredite que eu sobrevivi ao inverno.
Tikani para no meio do caminho.
- Por que parou?
- Pode ir, depois eu vou. - ele diz ao sentar sobre a grama.
- Está bem...- Por que ele não quer vir comigo?
Tento correr, mas a minha pata não colabora.
Ao chegar minha mãe me bombardeia
com perguntas:
- Por que está aqui? - Ela fala me farejando e tirando tufos de pelo solto com sua pequeninas garras. - Está machucada, o que foi? Quem é ele? Que cheiro é esse? Raksha?
- Calma mãe, eu já vou lhe contar tudo.
A coruja me olhava de uma forma curiosa, o Corvo pousa ao seu lado e logo percebo que eles se conhecem.
Tento ouvir a conversa entre os dois, mas é impossível com minha mãe me perguntando coisas.
- Por que ele está ali parado? Qual o nome dele? - antes que eu pudesse respondê-la ela continua seu interrogatório.
- O que foi isso na sua pata? O que foi? Você está bem? - ela balançava as orelhas freneticamente, seus pelos ainda estavam volumosos mas alguns já começavam a cair.
- Estou, mãe, o nome dele é Tikani, ele está me acompanhando.
- Por que? Ele é confiável?
- É, é sim, ele que teve a ideia de me acompanhar, mais tarde lhe conto tudo.
- Por falar em contar, essa coruja quer te falar uma coisa, o nome dela é Suindara.

Depois que Tikani finalmente chegou, Suindara nos contou tudo.
O Corvo sabia de tudo isso e nunca me falou nada.
Mal posso acreditar no que eu acabei de ouvir!
Há mais lobos como nós!
E uma alcatéia deles!
E o mais importante...
Eles querem que eu fique lá com eles.
Sinto uma alegria enorme ao saber que terei um lar, que não vou mais me esconder.
Mas...
E Tikani?
Será que eles vão aceitá-lo?
Eu não quero e nem vou deixar ele.
- Suindara, ele nasceu na mesma noite
que eu, também não uiva, ele pode ir comigo, não pode?
- Se ele quiser, mas terá que falar com a alfa, é ela que decide quem fica.
Olho para Tikani que apenas lambe minha testa e fala:
- Está tudo bem.- Me derreto com o seu tom de voz baixo.
Minha mãe viu isso?! Pelos ancestrais!
Ela vai me atormentar para que eu conte tudo à ela.
Você também nem disfarçou...

Já anoiteceu e eu estou faminta.
Tikani saiu para procurar um cervo, eu tentei ir com ele para ajudá-lo mas nem ele e nem minha mãe deixaram. Suindara está tentando pegar ratos, o Corvo limpa suas penas e minha mãe...bem...está na minha frente me perguntando:
- Você gosta dele?
- Gos..to.. sim, ele é meu amigo. - gaguejo e ela percebe que fiquei nervosa com a pergunta.
Amigo...poderia ser mais...mas...
Quieta!
- Não estou perguntando se você gosta dele com amigo, o que eu vi aqui, não foi lá coisa de amigo.
- Talvez? - a respondo. - Não sei direito o que eu sinto por ele.
Ela apenas esboça um pequeno sorriso.
- Ele parece gostar de você, me diga uma coisa, ele é mesmo um lobo?
Será que ela vai achar estranho o fato dele ser um híbrido?
Eu não acho ele estranho.
- Ele é um híbrido, mãe.
- Um o quê?
- Meio lobo e meio cão.
- Ah, eu sabia que seu rosto era um pouco diferente de um lobo normal.
- Como passou o inverno? - decido mudar de assunto.
- Esse foi o mais difícil, havia poucos ratos e muitos coiotes por aqui, você está um pouco magra... vai recuperar seu peso nessa primavera.
Tikani retorna com um grande cervo.
Devoramos a sua carne em pouco tempo.
- Estou com sede, sabe onde tem água por aqui? - ele me pergunta.
- Logo ali, vamos.
O levei até o pequeno riacho, a água produzia um ruído calmo e relaxante.
O observo bebendo água, ele parece estar incomodado com alguma coisa.
- Tikani?
- Sim? - me responde lambendo o focinho para tirar as gotinhas de água.
- Você está se sentindo bem? Está meio
abatido... o que foi?
- É que...- ele suspira e olha para mim. - É complicado...
- O quê?
- Você deve ir para a alcatéia, eu irei voltar para casa.
An?! Por que?! Qual o motivo disso?!
- Por que você vai voltar para lá?! Por que não vai comigo? - pergunto alarmada.
- Eu não sou um lobo, talvez eles não me aceitem, eu queria ser uma coisa só...
- Você é meio lobo, e daí se eles não te aceitarem? Eu vou ficar com você.
Tikani me olha, posso ver seus olhos marejando e num movimento rápido ele me abraça, um abraço tão apertado que fico sem ar.
Por que ele está assim?
Não compreendo, talvez ele se sinta estranho em não ser nem um lobo e nem um cão.
- Obrigado. - ele fala entre os meus pelos.
- Obrigada também. - falo.
- Por que você está me agradecendo? - me pergunta enquanto desfaz o abraço.
- Por tudo, por me salvar, por caçar para mim, por se preocupar e por me dar alegria.
Você está soltinha hoje hein?
- Alegria?
- É alegria, agora vamos voltar para lá,
você vem, não é?
- Sim eu vou, aliás, acho que foi você quem me salvou...

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Vocês não imaginam como eu estou feliz! Obrigada a todos que leram😙😙😙😙😙.
Eu sei que esse capítulo está pequeno, mas o próximo vai ser maior, eu prometo.

RakshaOnde histórias criam vida. Descubra agora