Cela

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    Aury assistiu Bernardo adormecer lentamente em meio ao pranto, como se houvesse recebido uma injeção de anestesia que fazia efeito dentro de alguns segundos. A cabeça da jovem estava um caos, seus pensamentos misturavam-se e seus sentimentos confundiam-se entre tanto medo e ansiedade, como se a própria fosse uma novela desejava que chegasse logo o próximo capítulo para acabar esta angústia que parecia infindável. Precisava saber o que aconteceria consigo.

    Seu pai, Orlando ficaria eternamente desapontado com a filha que até então era seu orgulho. Sua mãe não confiaria mais nela, a impediria de até mesmo manter a amizade com os seus outros quatro amigos que também estavam envolvidos no assalto e o único cara que ela acreditava poder salvar sua pele havia tido um ataque de loucura e a chamava incansavelmente de Lady Laura como um alucinado, era tudo muito estranho. Talvez ela pudesse conversar novamente com o Duarte quando ele despertasse, talvez ele tivesse bebido demais e por isso falava coisas com coisas. Ele não poderia ser maluco!
    Apesar de estar trancafiada , sentia as horas passarem muito rápido.
    Aurora tentava aconchegar-se naquele chão frio e duro, sua cela era vazia, não havia nem ao menos camas de cimento, porque era uma cela provisória, ninguém ficava muito tempo preso na delegacia da pequena e pacata cidade de Hortília, havia apenas duas opções para quem era preso naquela cidade: Era transferido para um presídio na capital, ou era liberto pagando uma sentença em dinheiro, ou ainda trabalho comunitário.

    As horas passaram-se rápido enquanto Aurora mantinha-se em seu tolo devaneio que não a ajudaria em nada, segurava os joelhos com os braços na posição fetal encostada no canto da parede escura, enquanto o silêncio da madrugada invadia rapidamente todo o ambiente, a voz despertada a pouco do Duarte a assustou em meio aquele silêncio perturbador:

    -Ainda acordada? –Ele estava sentado com as pernas esticadas como um boneco de pano jogado no chão por uma criança que enjoou do mesmo.

    -Sim –Respondeu com a voz rouca, pigarreando em seguida. Ela olhou de relance para ele, mas logo desviou o olhar para a parede de sua própria cela. –Não consigo dormir.

    -Me desculpe, moça, pelo meu comportamento estranho! –Ele pronunciava cada palavra com muita cautela, parecia se esforçar para isso –Devo ter te assustado, não foi minha intenção. Foi...-Ele parou por uns dois segundos olhando fixo para um ponto no chão, procurando as palavras certas para completar sua fala. –Eu não sei o que foi. Não sei o que me deu. Eu não sei. Me desculpe.

    Aurora parecia ter encontrado graça nas palavras do homem e ouvia ele se explicar com um sorriso maroto na face e balançando levemente a cabeça como se estivesse entendendo algo.

    -Não precisa me pedir desculpas, senhor Duarte! – Ela coçou a bochecha e deu um ar de riso –Já fiquei bêbada também!

    Ele olhava atentamente para ela enquanto ela falava e também enquanto se calava, ele queria encontrar algo nela que lhe desse a certeza de que não era sua falecida noiva, Lady Laura.

    -Qual o seu nome, moça?

    -Eu me chamo Aurora, senhor... –Ele balançava a cabeça e mordia o lábio inferior desconectado –Mas o senhor me chamou de Lady Laura. –Ela levantou-se apoiando-se na parede e aproximando-se da grade tentando manter a postura, tentando não demonstrar tanta curiosidade –Porque me chamou por esse nome?

    Ele se sentiu na obrigação de também tentar se aproximar mais da jovem levantando-se e caminhando até a grade de sua cela, agora ele podia voltar a olhar na face dela iluminada rapidamente por um facho de luz vindo do final do corredor. Ele abraçou-se na grade que lhe tirava a liberdade.

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