Hotel

69 7 0
                                    

Aurora sentou-se em sua cama d'água e puxou o telefone com fio que estava sobre a sua mesinha de cabeceira, discou alguns números e esperou que alguém atendesse do outro lado da linha o que não demorou.

-Oi. -Atendeu Maria com a voz pesada, sem animação.

-Maria, sou eu, Aurora.

-Oi, Aurora -Respondeu com menos empolgação que antes.

-Tudo bem? -Perguntou enquanto ajeitava-se na cama, o tom de voz da amiga não lhe parecia confortável.

-Não, Aury -Suspirou do outro lado da linha -Não está nada bem. O gerente da loja prestou queixa na delegacia hoje à tarde, meu pai viu as imagens. Já era! Ele e minha mãe estão brigando alto na sala, ele está culpando ela pela minha "criação" e dizendo que tudo é culpa dela. -Ela suspirou mais alto dessa vez -Agora é oficial: ele me odeia!

-Ai Meu Deus -Aury pulou da cama ainda com o telefone verde em mãos -Mas ele falou alguma coisa sobre...

-Prisão? -Concluiu a frase interminada da amiga -Não é necessário ele dizer nada, está estampado na face dele que será um prazer me levar para o xilindró.

-Qual é? -Aury quase arrancou o fio do telefone da parede em um grande passo que deu adiante -Ele é seu pai!

-Isso não significa nada para ele.

O pai de Maria, era o delegado da cidade. Era um homem alto com aspecto de lenhador, amedrontava as crianças com o seu olhar por cima dos óculos escuro que sempre usava, não tinha cabelo, era careca desde os vinte anos e nunca pareceu se importar com isso. Se orgulhava da sua querida, pequena e pacata cidade onde nunca nada de muito extraordinário acontecia, por isso era horrível aos olhos dele quando sua filha se tornava modelo de mau comportamento diante da sociedade.

Ele se chamava George, nunca foi casado com a mãe de Maria, ela foi o fruto de uma noite de réveillon "muito louca" em uma discoteca em mil novecentos e setenta. George forçou a mãe de Maria a fazer o teste de DNA para comprovar se a garota era realmente sua filha e quando foi comprovado tentou ganhar a guarda da menina na justiça, mas tudo que conseguiu foi uma guarda partilhada pois ele ainda não era casado no tempo e com a longa carga horária de trabalho não teria tempo para cuidar de uma criança. Ele tentava ser um bom pai, mas nem sempre era compreendido por Maria.

-Maria, eu descobri onde o cara está hospedado, o tal do dono das joalherias. -Falou mantendo o resto de esperança empenhada em sua voz.

-De que adianta, agora? -Indagou seca e firme.

-Ele ainda pode retirar a queixa contra nós!

-O gerente não vai retirar a queixa, ele nos odeia desde que temos quinze anos!

-Qual, é? Ele é só um empregado vai ter que cumprir as ordens do patrão -Ela sentia seus joelhos afrouxarem-se, não tinha tanta força e coragem quanto demonstrava, ela era uma farsa. -Temos que tentar!

-Eu estou de castigo, tá legal? -Reclamou depois de um tempo hesitando -Não posso nem virar a esquina...

"Você vem comigo!" -Aurora ouviu uma voz autoritária um pouco distante do outro lado da linha se dirigindo a Maria -"Com quem você está falando, mocinha?"

-Ninguém -Rebateu Maria antes de desligar o telefone.

Aurora afastou o telefone da orelha e continuou com o olhar fixo nele como se quisesse visualizar o que aconteceria na casa de Maria através do aparelho, pôs o mesmo com delicadeza na sua mesinha de cabeceira e passou a mão entre os cabelos arrepiando sua franja espessa, ela tinha que agir rápido, não queria ter que encarar o olhar de decepção de sua mãe e muito menos o de seu pai quando ele voltasse de viagem.
  ***
-Aury! O que está fazendo aqui? -Perguntou Zora, surpresa ao receber um abraço repentino da garota franzina. -O que está fazendo aqui, menina?

Quem é ela?Onde histórias criam vida. Descubra agora