Prólogo.

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O cheiro adocicado escapava da panela e se espreguiçava até as narinas do cozinheiro. O fogo baixo fazia cócegas na panela antiaderente que fervilhava a geleia de morango. Uma ou duas bolhas estouravam por aqui e acolá, tentando saltar até o rosto do segundo competidor, que transpirada pelo calor e pela tensão de ser observado por sua tutora.

As pessoas que observavam os dois últimos cozinheiros, acreditavam que o tempo valsava a favor deles. Os dois competidores estavam fixos em suas receitas, usavam e abusavam das espiadelas que podiam dar sobre o papel em que anotaram as alterações que fariam. Os braços guiavam as colheres com leveza, com lentidão.

- É estranho que o segundo competidor ainda não preparou as formas das trufas. - Um dos juízes comentou junto ao apresentador do programa.

- Os dois competidores são brilhantes, não acha que ele têm uma carta na manga? - O comentarista questionou.

- Sem dúvidas os dois competidores são brilhantes, mas até agora não o vi criando nada que possa ir contra o tempo. O chocolate precisa ser tratado com respeito e sob suas regras. Ele já devia ter colocado para resfriar.

O segundo competidor espiou o relógio. Faltavam quinze minutos.

Abruptamente ele retirou a colher da panela, afastou-se dois passos e secou o suor do rosto. Sua concorrente ergueu os olhos para ele assim que ele a olhou sorrindo com malícia. A raiva da primeira competidora atirou-se contra seu concorrente, mas não foi o bastante para fazê-lo desistir daquela guerra.

- O melhor chocolateiro será decidido daqui a pouco e não temos como saber o que os dois concorrentes estão pensando. - O comentarista soltava com ânimo. - Mas sabemos que esta competição não fora amistosa entre os dois e podemos esperar qualquer coisa fantástica.

A mulher caminhou até a geladeira e retirou suas forminhas. A perfeição podia ser descrita naquelas ocas de chocolate que receberiam, em breve, um recheio de morango. O outro concorrente aguardou por uns minutos, até tomar uma ação. A panela fervilhava enquanto ele ficava parado, olhando para o céu claro.

O segundo competidor mergulhou contra a panela, desligou o fogo e puxou as forminhas em que faria a casca dos bombons de chocolate. Ele puxou, também, uma bandeja de metal que esfumaçava contra o dia quente. Com uma velocidade admirável, ele untou as formas com o chocolate e mergulhou-a contra a forma de metal. O chocolate endureceu sobre os gritos de admiração e os comentários animados dos juízes e do apresentador.

- Nunca falamos que não podiam trazer seus próprios meios de resfriamento. É incrível como eles conseguem usar os artifícios de seus concorrentes!

Quando a prova se encerrou, os dois chocolateiros estavam cansados e orgulhosos. A primeira mesa era composta por bombons de chocolate ao leite com um colar de chocolate branco que a chocolateira usou para unir a base achatada com o corpo em forma de oca.

Já na outra mesa, haviam apenas bombons impecavelmente iguais.

Em questão de beleza, os dois concorrentes estavam empatados. Mas, quando o segundo concorrente explicou o que tinha feito, a competição estava decidida.

- Se gostam de um chocolate mais doce, comecem comendo por cima. - Havia prazer em seus olhos, enquanto explicava com a voz aveludada. - Mas se querem algo mais ácido, mais azedo, comecem pela base.

Naquele dia, quando foi decidido que aquele competidor era o melhor chocolateiro do mundo, também nasceu Willy Wonka. O futuro dono da maior e mais fantástica fábrica de chocolates do mundo.


Ϣ.Ϣ.


Willy Wonka chegou a sala de visitas e estancou sobre o carpete vermelho. O cérebro do chocolateiro questionou-se se o corpo era feito do chocolate seca rápido que usara para construir o palácio de chocolate de um velho conhecido indiano, uma vez que nunca vira alguém travar com tamanha velocidade.

Por um segundo, enquanto a visitante girava no eixo para saudar o dono da fábrica, Wonka lembrou de sua infância. De quando saiu de casa, passou pelo museu das bandeiras (de onde fora expulso por já estarem fechando), quando encontrou sua fada madrinha e começou sua carreira de chocolateiro. Lembrou, com um arrepio subindo a espinha, quando foi declarado o melhor chocolateiro do mundo.

O pânico de Wonka fora enjaulado assim que os olhos castanhos caíram sobre os olhos perolados da mulher que lhe visitava. Tinha que se manter forte, consciente e fixo nas armas que usaria para o contra-ataque.

- Amanda. - A voz fina de William vacilou enquanto ele pensava que, definitivamente, nenhuma mulher poderia ser considerada uma fada madrinha ou um anjo da guarda.

- William. - Ela saudou com suavidade. - Quanto tempo.

O tic-tac de um relógio explodiu ao longe, quando a voz aveludada da mulher parou de ecoar nos tímpanos de Willy e o silêncio começou a cacarejar por ali.

- Cinco anos, talvez?

- Sete anos – Ela rosnou enquanto avançava dois passos – seis meses e três dias, Wonka!

A respiração masculina se cortou. O silêncio fora cortado pela lâmina afiada que era voz daquela que um dia fora, há anos, a guia de um garotinho mirrado, permeado pelos pesadelos de um aparelho odontológico.

Cada passo que ela avançou na direção de Willy Wonka, ele avançou contra a parede. Não ficaria perto daquela mulher quando ela estava furiosa.

- He-he. - A risada assustada escorregou dos lábios de Willy. Ele não conseguia formular nenhuma palavra.

O sangue fugiu do corpo e o chocolateiro jurou que desmaiaria. A bengala foi usada para apoiar o corpo e disfarçar o pânico que corria nas veias de Willy quando ele escutou:

- Vim buscar, William, o livro que você me roubou.

O medo de Willy WonkaOnde histórias criam vida. Descubra agora