Ryla
Chamam meu nome na área da emergência, e corro para o hospital assim que recebo a ligação.
—Ryla? Eu, eu sou o pai da paciente da qual você está responsável daqui em diante, prazer Tyler Moutar. —O homem diz, seco, e me estende a mão, aperto e me apresento.
—Qual é o quarto em que sua filha está?
—221, olha só, aqui está a chave vim aqui rápido pois tenho que voltar para Florianópolis, se ela acordar, é sua missão me avisar, ouviu? —Que grosseria.
—Tudo bem.
—Tudo o que você precisa saber sobre ela está na ficha ao lado da cama, passar bem.
—Bom dia, senhor.
Entro no quarto me deparo com a mais linda mulher que já vi na vida, mantenho meu profissionalismo e pego a ficha para ler.
Nome: Beatrice Vazn Moutar
Idade: 16 anos
Boletim prévio: a paciente apresenta estado de coma.
Chegada: 21/02 Queda de avião
Responsável/contato: Tyler Moutar
Em todos esses anos estudando enfermagem, entendi que pessoas em estado de coma não podem expressar-se, mas ouvem tudo o que lhes for dito e quando enfim acordam, tem tudo o que ouviram como um sonho.
Sento-me ao lado dela e pego sua mão machucada e pequena, as unhas são grandes e estão pintadas de um vermelho tom de sangue.
—Cuidarei bem de você, sabe, você é linda.
Dois meses se passam e já se tornou uma maravilhosa rotina ter Trice na minha vida, cada minuto é uma esperança de que ela acorde e diga que também me ama, meia noite em ponto dou-lhe um selinho e digo:
—Feliz aniversário, minha princesa, seu pai me ligou dizendo que mandou um abraço, que babaca, não é mesmo? Pode te abraçar e não faz isso.
A aflição me corrói quanto ao estado dela, nas últimas três semanas tivemos que reanima-la duas vezes, mas procurei manter a calma para que os colegas de trabalho não percebessem que a importância que dou à Trice é maior.
Fim de mais um expediente, é a pior hora do meu dia, dou as chaves na mão de Rafaela, enfermeira noturna de Trice e sigo para casa.
Cinco horas, já estou na frente do espelho tentando não ficar cega com o lápis de olho, pego um cobertor e coloco na bolsa, os cobertores do hospital são frios e Trice constantemente arrepia-se de frio, conto na bolsa e caço pela casa alguns trocados para comprar um bolo cor-de-rosa para Trice.
O padeiro me olha e diz, Sorrindo:
—Posso me estar enganando, moça, mas esse sorriso é paixão.
—Ah, seu Theo, me traga seu melhor bolo cor-de-rosa, pois o senhor tem razão, é paixão. —Ele diz para mim e me entrega um dos bolos de abacaxi com morango, lhe dou um sorriso, pago a conta e sigo para a floricultura próxima do hospital, pensando em como irei acomodar tudo aquilo na minha pequena lambreta, faço um pequeno malabarismo com o buquê de flores e o bolo, mas logo recupero o equilíbrio e Sigo, o Bolo vai na cestinha, e as flores coloco entre minhas pernas.
Chego no hospital e com pressa, grito um bom dia aos colegas da recepção.
Paro em frente à porta do quarto, olhando para o 221, para certificar-me de estar no quarto certo, entro, sorrindo, esperando vê-la, quando meus olhos não captam seu rosto minhas mãos começam a suar e meu rosto a formigar de nervosismo, corro até o banheiro, na esperança de que tenha acordado, mas não a encontro, então volto até a recepção.
—O que aconteceu com a Trice? —Quando percebo o tom alterado em minha voz, desejo me enterrar, mas, a essa altura todos da recepção me olham, em especial Rita, a quem me dirigi.
—Beatrice, a paciente do quarto 221, pode me dizer o que houve? —Tento manter o tom profissional, a moça olha para o computador e parece digitar o nome de Trice, em seguida me olha, aflita, quase chego a perceber uma ponta de pena em seu olhar.
—Ela teve outra parada cardíaca, tiveram que reanima-la, está na uti, sob observação agora. —Um nó fere minha garganta ao pensar no quanto está vulnerável.
Com a ausência de Trice, aproveito para arrumá-lo para quando chegar, limpo as janelas e o ar-condicionado, troco os lençóis e limpo a pequena mesa de centro onde coloco o bolo de aniversário cor-de-rosa, ponho então as petúnias brancas em um vaso de vidro na estante acima da cama de Trice, terminado o trabalho, começo outro, mas dessa vez preparo o roteiro do seminário do TCC, já que me resta tempo.
Olho no relógio, nove e meia, falta meia hora para o fim do meu expediente e a ideia de não vê-la hoje me incomoda, meu nome é chamado nos alto-falantes do quarto, para variar, me assusto com a voz estridente de Rita dizendo que tenho que comparecer à sala do dr. Evaristo Gonçalves.
Bato a porta e entro, pedindo licença, Evaristo puxa a cadeira para que eu me sente, minhas mãos soam frio.
—Posso ajudar, doutor?
—Ryla, vou ser rápido, me foi repassado que você é quem está responsável por Beatrice Vazn Moutar, sim? —Ele indaga, lendo a ficha de Beatrice
—Sim, sou eu. —Meu rosto volta a formigar.
—Tenho três notícias para você, uma é boa, porém, as demais são ruins, a boa, é que conseguimos mais uma reanimação bem sucedida, uma das ruins, é que você terá que substituir Rafaela no turno da noite. —Não consigo conter minha felicidade quando ouço isso, mas acabo com minhas expectativas quando lembro que ainda resta uma notícia ruim.
—Agora, Ryla, você terá que prestar muita atenção... —Meu coração aperta. Evaristo levanta-se e liga o computador, que mostra a imagem raio-x de uma pessoa paraplégica, fito-o sem entender o motivo da imagem.
—Quando aquele avião caiu e conseguimos salvar Beatrice e Taylor Vazn, não tínhamos esperança alguma de que Beatrice viveria pouco mais que três dias, desde então, Ryla, nunca verificamos a estrutura óssea da moça. O que você está vendo aqui é a coluna de uma pessoa paraplégica, na base do cóccix, ouve fratura, e para evitar que isso viesse a debilitar outros órgãos como a bexiga, por exemplo, tivemos que retirá-lo, o que estou tentando dizer, Ryla... —Meus olhos marejam, minha garganta cria um nó. Evaristo senta-se na cadeira a minha frente e com o pequeno controle, desliga a televisão, tira os óculos e olha fixamente para mim.
—É que... —Seus olhos ficam tristes e a gravidade de sua voz aumenta. —Beatrice perderá o movimento das pernas.
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Por Amor
RomanceBate a segunda campa, puxo Andy pelo braço para o corredor escuro da limpeza, sentamos ali, naquele chão um tanto empoeirado em silêncio, e antes mesmo de perguntar o vejo desabar em meu ombro, não me contenho e sinto meus olhos marejados, envolvo-o...