Prólogo

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Jequié, 02 de maio, de 1913.

- Peguem ela, não deixem essa cabrita miserável fugir, matem essa desgraçada!
Gritava desesperado o jagunço aos seus capangas, um homem de meia idade, alto, de pele parda, forte e assustadora aparência de um homem das cavernas, já aparenta ser bem velho devido suas rugas grossas e sujas do sangue de tantos outros pobres como aquela moça que dele fugia, olhos amarelados, roupas típicas dos vaqueiros da região e o rosto cheio de marcas das muitas brigas que já protagonizou. Dentes amarelados e podres denunciavam os muitos cigarros que fumara durante seus quarenta e três anos de vida, era de se dá medo e pena sua imensa falta cuidados consigo mesmo, e para completar a obra, adorava usar um chapéu de palha velho no alto da cabeça. Aquele homem só não era mais repugnante que a energia maligna que trazia em seus olhos, olhos fundos e parados como se fitasse um abismo tão escuro que nem o próprio diabo gostaria de entrar lá.
Alguns metros à frente, uma moça continua a fugir desesperadamente, ela uma menina de quinze anos, tinha lá sua boleza, apesar dos trapos que trajava, roupas remendadas e sujas de carvão e terra, o cabelo despenteado e maltratado, estava agora ainda mais assanhado e bagunçando pelo desespero da fuga. Corria o mais rápido que suas pernas podiam aguentar e em seu rosto uma expressão assustadora de medo. A sua pele clara transparecia através de sua roupa gasta e um dos seus mamilos quase esposto graças aos buracos de sua blusa, lágrimas escorriam dos seus olhos, sem serem amparadas pois as mãos estavam agora a se agarrar em tudo que podia para manter o equilibrio da moça e evitar uma queda ou algo do tipo. A vegetação seca castigava seus pés enquanto ela corria sobre espinhos e pedras de todos os tipos e tamanhos, alguns galhos secos e retorcidos do que sobrou das árvores que teimavam em crescer alí, para serem duramente castigadas pelo sol e pela falta de chuva arranhavam-na os braços, pernas e também no rosto, mesmo com uma destreza impressionante suscitada pelo medo ela nem sempre conseguia se desvencilhar de galhos e tocos.
- Ela foi por ali! Grita um dos homens.
- Peguem-na, essa desgraçada me paga! Grunhia o jagunço.
Alguns metros depois de correr pelo mato a moça avista uma estrada, mas pensa que se ficar ali escondida atrás de alguma árvore ou ainda se tentasse fugir pela estrada seria capturada muito mais rápido, primeiro porque escondida mesmo que demorassem eles a achariam, como peixe na rede, e pela estrada aqueles homens iriam pegá-la por serem mais velozes e infelizmente na limpa estrada sem a proteção da vegetação não haveria nada para escondê-la.
Seus pés descalços castigados pelo chão quente e pelas pedras, na perna uma vermelhidão por ter, no meio da fuga, encostado em um pé de cansanção planta que causa uma irritação horrível na pele do desprevenido que nela toca causando uma coceira quase insuportável. Sem muitas alternativas e ouvindo os homens se aproximarem ela pensa em voltar a correr pelo mato, por sorte ou destino vê uma carroça vindo pela estrada e resolve correr até ela para pedir ajuda a quem quer que fosse, melhor o amparo de um estranho do que ficar ali e morrer no facão do seu carrasco.

Na carroça estava um homem de uns sessenta e oito anos, mas que parecia ser muito mais velho, tinha a pele de quem muito viveu e trabalhou de sol a sol, era curtidor de couros. Passara a vida inteira as margens do Rio de Contas limpando a pele de animais para garantir o seu sustento. Um homem de físico forte devido ao duro trabalho braçal que realizava. De repente ele percebe a menina correndo de dentro do mato, se assusta, e ao ver que ela vem em sua direção puxa as rédeas do cavalo e por via das dúvidas põe a mão no cabo do seu facão.

- Socorro moço me ajude. Grita a menina desesperadamente, ao chegar perto da carroça.
- Sossega dona, mas que diabo que a senhora viu?
- Moço me esconda e depois eu lhe explicarei tudo. Ela tenta conciliar as palavras entre as lágrimas e a respiração ofegante.
- Mas que diabo é isso, tá doida moça? Adiante, diga o que tu tem. Gritou, não que fosse um mau homem, a vida é quem nos dá o terrível hábito de desconfiar de tudo.
- Meu senhor eles tão vindo, eles vão me ver, vão me matar. Gaguejou entre lágrimas.
- Oxente vê se pode aparece aqui assim do nada, nesse estado, querendo minha ajuda, olha moça eu não lhe conheço, me deixe em paz.
Ela olha para o pescoço dele e vê uma medalhinha de Santo Antônio de Pádua, e com um impulso de esperteza dispara:
- Senhor por Santo Antônio homem e pela fé que o senhor tem em Nosso Senhor Jesus Cristo me ajude, por amor a Nossa Senhora. Sua angústia soava tanto como apelo quanto como prece.

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