PARTE I: CIDADE SOL. CAPÍTULO I: O PROFESSOR

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O dia amanhece calmo. Ana acorda renovada depois de um longo descanso em um colchão confortável, passou a noite como uma rainha, nunca havia dormido em algo tão bom e aconchegante, ainda estava assustada com a história que ouviu, seria mesmo verdade? Ela bem que já tinha ouvido dizer que praga de mãe pega e além do mais era claramente um ronco e como se não bastasse acompanhados de gemidos assustadores. Mas agora já era um novo dia e logo ela iria para o centro, ter uma vida nova longe daquelas estórias, não que a casa de seu Zacarias não fosse um bom lugar, mas a menina sentia vontade de respirar novos ares e com plena certeza ficar longe dos homens que a perseguia.
Desde o encontro com aquele bom velho no meio da estrada ela não parava de agradecer a Deus pela chance que lhe dava como benção.

-Bom dia Menina, levante, vai lavar a boca e vem aqui tomar um café, hoje mesmo eu vou lhe levar para a casa do seu Carlos, tenha na certeza que ele vai ajudar você.
- Bom dia seu Zacarias, estou muito feliz com tudo que tem me feito, nem sei como vou poder lhe agradecer por tudo. Ela ainda tentava se adaptar a gentilezas, o senhor deu de ombros e ignorou seu comentário, já estava cansando de dizer que não precisava agradecer nada.
- Bom dia menina, dormiu bem?
- Bom dia dona Marli, bem por demais, muito melhor que o chão de terra que eu dormia antes, isso aqui é bom demais.
- E por falar nisso, me conte minha filha, porque você corria daqueles homens? Disparou o velho com soprando o café em sua caneca velha.

Depois que seu Zacarias perguntou isso a menina quase engasgou com o biscoito que mastigava, percebeu que Marli e seu marido a encaravam atentos para saber o que se passava, de onde ela tinha saído e porque fugia tão desesperadamente.
O semblante da jovem então mudou de contente para triste, as lembranças a feriam como ferro em brasa no lombo de um animal, seu olhos encheram de lágrimas e por um instante Zacarias se arrependeu de ter feito aquela pergunta. Depois de respirar fundo ela começou:

- Eu fugi de uma fazenda, ou melhor, um inferno, minha mãe se separou do mau pai quando eu tinha oito anos, depois minha mãe recebeu a visita de um fazendeiro dizendo que na fazenda dele nos iríamos ter casa, comida eu ia ter escola, poder estudar, fazer nome, ser gente e minha mãe serviço. Mas era tudo mentira, lá tinha mesmo era mulher de todo o tipo e nós duas só chegamos para completar, que nojo daquele monstro, mulheres lá são tratadas como lixo, as mais velhas trabalham como escravas na casa, na fazenda as mais novas como eu servem de brinquedo de safadeza para o fazendeiro e seus homens. E se alguma desobedecer apanha até encher e fica sem comer, uma vez uns homens da polícia apareceram lá, mas não viram a gente, então o fazendeiro resolveu dá sumiço nas mulheres e ir para outra cidade, um dia ele disse que iríamos ser soltas, então levou todas para um matagal e mandou que atirassem em todo mundo, foi um banho de sangue, minha mãe morreu lá, eu não tava entre elas, infelizmente, deveria ter morrido lá também e dado cabo de todo esse sofrimento logo, eu tava lá dentro da casa na cama com o jagunço e por isso fui poupada, só que assim que voltaram o fazendeiro mandou dá cabo da minha vida como as outras, acontece que antes de me procurarem eu já tinha começado a correr assim que vi que todo mndo tinha sumido, entrei pelo mato adentro e graças a Deus encontrei o senhor seu Zacarias. E agora tô aqui.

O casal olhava para ela fixamente, mas ao invés de curiosidade a expressão agora era de espanto e medo.

- Que tipo de mostro faz umas coisas dessas? Diz Marli, espantada e em estado de choque com o que acabou de ouvir. A jovem chora.
- Calma minha filha, daqui a algumas horas você vai estar na cidade, longe de tudo que lhe fez mal, vai ter uma vida digna e saudia como qualquer outra moça merece ter - Disse o bom homem, assustado tanto com a história da jovem quanto com as palavras que acabara de dizer, de onde ele havia tirado tão belas palavras, pensou.
Marli abraçou-a, um abraço fraternal e tão aconchegante ao ponto de fazer que ela se sinta segura novamente e contenha as lágrimas.

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