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A cada canto do quarto havia um gigantesco sarcófago de granito negro, dos túmulos dos reis em frente de Lucsor, com as suas velhas tampas cheias de esculturas imemoriais. Mas era nas tapeçarias do compartimento, aí de mim, que residia a principal fantasia. As paredes imponentes, de enorme altura - chegando mesmo a ser desproporcionadas -, eram cobertas, de alto a baixo, caindo em amplas dobras, de uma tapeçaria pesada e de aspecto maciço, feita do mesmo material do tapete que se encontrava no chão, do forro das otomanas, do dossel do leito de ébano e das cortinas que em esplendorosas volutas velavam parcialmente a janela. Esse material era o mais fino tecido de ouro, todo ele semeado, a intervalos regulares, de arabescos com cerca de trinta centímetros de diâmetro, aplicados sobre o tecido a negro azeviche. Contudo, estas figuras apenas possuíam o verdadeiro carácter de arabesco quando observadas de uma única perspectiva. Por um artifício hoje comum, e que na verdade remonta a um período muito longínquo da antiguidade, eram concebidas de molde a possuírem um aspecto mutável. Para quem entrasse no quarto, assumiam a aparência de simples monstruosidades; contudo, avançando-se um pouco mais, esta aparência desvanecia-se gradualmente; e, a cada passo, à medida que o visitante alterava a sua posição no compartimento, via-se rodeado de uma interminável sucessão das sinistras formas pertencentes à superstição dos Normandos ou das que surgem nos sonos pesados de culpas dos monges. Este efeito fantasmagórico era muito acentuado pela introdução artificial de uma forte corrente contínua de vento por detrás das tapeçarias, proporcionando uma animação medonha e inquietante ao conjunto. Foi entre tais paredes - numa tal câmara nupcial- que passei, com a dama de Tremaine, as horas profanas do primeiro mês do nosso casamento; e passei-as sem grande inquietação.

Ligeia - Edgar Allan PoeOnde histórias criam vida. Descubra agora