Capítulo II - Pocahontas

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Pocahontas 

Por: Cá Becker 

  "You just made me trip, fall, and land on your lap "

19 de janeiro de 2017 - Londres

Terminei de amarrar meu cabelo em um rabo de cavalo.

Meu estomago estava embrulhado e tudo que eu queria era voltar para baixo da minha coberta e me esconder do mundo lá fora; inclusive da entrevista de emprego e as contas constantes que eu encontrava embaixo da porta. É ridículo que uma mulher como eu ainda me sinta envergonhada com situações que me tirem da minha zona de conforto. Mas acontecia, e eu não podia fazer nada.

Assim que meu relógio marcou oito horas da manhã, eu desci as poucas escadas do condomínio nem um pouco luxuoso em que eu morava. As coisas mudaram de uns anos para cá, e a menina escritora e sonhadora ficou para trás; as contas e responsabilidades passaram a bater na porta e antes que eu pudesse jogar tudo para o alto, Pandora morreu e John nunca mais voltou. A perda de Pandora foi tão terrível quanto o desaparecimento de John; o que era reservado para eu não conseguia ter ideia.

O transito não estava movimentado para o horário, o que por um lado foi ótimo.

O prédio que constava no endereço era imponente e bonito. Eu não tive tempo de contar, mas mais de dez andares o prédio tinha. Isso era óbvio. No hall de entrada, uma loira vestida em um tubinho cinza sorria para todos, o que me deixou levemente irritada. Sabe-se lá o porquê. O andar anotado no meu pequeno papel indicava o quinto andar, e depois de ser acompanhada até o elevador, suspirei aliviada de estar em um ambiente mais vazio e solitário.

O quinto andar era uma sala de reuniões ampla e clara. A mesa era longa e um homem, que devia ter a minha idade, estava sentado na ponta dela. Os cabelos morenos e bem penteados me faziam lembrar alguém do meu passado; os olhos verdes eram firmes e curiosos, não desviaram dos meus nem por um segundo. O terno estava bem alinhado e a gravata tinha um nó perfeito.

Eu me senti desconfortável dentro do meu jeans surrado e um cardigã antigo da minha mãe. Não havia sido minha primeira escolha para a entrevista, mas eu derramei geleia no vestido social ao tomar café da manhã, e digamos que aquele era o único do meu armário.

- Sente- se, por favor. – O moreno disse. – Senhorita... – Ele gesticulou com a mão me incentivando a falar.

- Bocherr. Olivia Bocherr. – Sentei na cadeira com a postura mais ereta que eu consegui, em uma tentativa falha de imita-lo.

- Me chamo Charlie Phobio, sou sócio dessa empresa a mais de dez anos; comecei de baixo e hoje já sou um dos sócios majoritários. A uma semana minha secretária se demitiu e pude ver como alguém me ajudando faz falta. A dias venho em busca de alguém capacitado o suficiente para me auxiliar. Por gentileza, sua formação?

- Sou formada em inglês e literatura a dois anos; considerei a possibilidade de também estudar Direito, mas infelizmente minha renda não permitiu. – Fui sincera, acreditava que essa poderia ser a melhor maneira de conquistar algo.

- Interessante. – Ele rabiscou algo no currículo que ele tinha em mãos. – Casada? Filhos? Expectativas para vida?

- Sou solteira e sem filhos. Meu maior objetivo é independência. Tenho alguns sonhos e sei exatamente o que fazer para alcança-los. – Entrelacei meus dedos.

- E até onde você estaria disposta a ir para alcançar esses tais sonhos? – Engoli em seco.

- Eu faria o necessário, mas não passaria por cima de ninguém; minha educação e meu caráter jamais permitiriam isso. – Ele expressou surpresa com a minha resposta e mais uma vez rabiscou no papel.

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