Bendize não estava tão longe, Inara já podia ver a pequena cidade amontoada ao redor de uma imensa montanha. Mas estava longe o suficiente para ela escutar seus instintos. E apesar de as construções não mostrarem que havia uma força bélica grande, ela precisava ter cautela.
— Vamos procurar alguma propriedade rural por aí Ônix, mesmo que não nasça muita coisa, os homens sempre irão insistir em trabalhar a terra e preciso de um disfarce.
Ônix diminuiu a altitude e começou a circular por todo lado, a visão inóspita não desanimou Inara que já tinha visto, nesses três meses de viagem que sempre uma família ou outra ainda mantinha o costume de viver como agricultores. Após quase meia hora de busca, Inara finalmente viu uma casinha e apontou.
— Ali! Vamos buscar algo para me ajudar a entrar na cidade.
Ônix desceu em uma parte mais baixa não parecendo satisfeito de ter que se separar dela novamente. Seu olhar ansioso e suas narinas dilatadas soltando uma tênue fumaça mostrava sua preocupação, Inara sorriu e lhe beijou o focinho.
— Vou ficar bem, fique por perto, volto já.
Inara não esperou seu dragão levantar voo, sabia que ele o faria se fosse preciso se esconder e correu em direção a construção.
Subiu um promontório de terra e encontrou uma cerca de madeira. Abaixou e sorrateira se aproximou um pouco mais, sondou o quintal, não tinha ninguém, mais segura de que não seria vista, ela pulou a cerca e correu até a parede.
Não se ouvia nada, além do som característico de patos, gansos e galinhas que ciscavam qualquer coisa pelo quintal.
O mugido de uma vaca ao longe e o barulho ritmado do solo sendo golpeado por enxadas mostrou que os moradores estavam na lida.
Inara se esgueirou até a porta e empurrou. Estava apenas encostada e ela entrou sem dificuldade. A casa modesta tinha apenas cozinha com duas portas, havia somente bancos e uma mesa de madeira. Uma panela bojuda no fogão de lenha fumegava algo cheiroso que fez o estômago de Inara roncar. Ignorou a fome e abriu a primeira porta. Sondou o catre revirado e as peças de roupas masculinas e pequenas. O quarto de um menino.
Uma família completa... Isso era bom sinal e Inara se animou. Saiu do quarto e abriu a outra porta. Nesse quarto a cama maior mostrou que estava no lugar certo. Abriu o roupeiro e encontrou tudo o que precisava. Pegou um vestido, sapato simples, algumas fitas e um pente.
O que mais? Franziu o cenho olhando para as coisas em sua mão. A única vez que se vestiu como menina foi no baile de reencontro. E foi Délia que cuidou de tudo por isso ela não sabia o que precisava para parecer uma moça sem deixar mostrar nenhum traço de seu treinamento como soldado.
Vasculhou as coisas em uma mesinha e encontrou um colar, levou a mão ao objeto, mas parou. Não sabia se aquele simples enfeite tinha alguma importância sentimental para a dona da casa. Não podia fazer isso, poderia ser o marido que deu a esposa em um dia especial ou mesmo o filho.
Revirou os olhos. Se precisasse matar o faria sem sentir remorso, se precisasse lutar o faria sem pensar. Mas roubar sem necessidade não lhe parecia descente, e aquele colar, não era necessário... Saiu do quarto rapidamente antes que mudasse de ideia. Em cima do fogão, na parte do fundo, estava pendurado um quarto de novilho.
Inara fez bico, comida... Era necessário, claro! Colocou a roupa na mesa e cortou um grande pedaço da carne defumada, enrolou no tecido e saiu da casa. Se esgueirou pela parede e correu pelo quintal, pulou a cerca e se abaixou na madeira, voltou a olhar o quintal para garantir que ninguém a tinha visto, nada mudara, continuava completamente silencioso só com o barulho dos animais
Assim que se distanciou da propriedade correu descendo o monte. Ônix a esperava, deitado com a cabeça apoiada nas patas, nem manifestou reação com sua aproximação.
Inara se esgueirou por baixo de sua asa e ele a abriu a envolvendo completamente, dando a ela a privacidade que ela precisava e novamente com esse gesto de companheirismo Inara sentiu uma grande pena de ter que se separar dele, sempre podia dormir embaixo daquelas asas, aquecida e protegida, mas isso seria perigoso, o que era uma grande pena.
Enquanto se despia, Inara começou a conversar tranquilamente, nunca ficava quieta e sendo seu dragão o único companheiro ela contava a ele tudo o que acontecia.
— Acredita que eu não tive coragem de roubar um colar barato, mas roubei um naco enorme do alimento deles? — Inara pegou o pedaço de carne no meio do tecido e guardou na bolsa.
— Esse pedaço se fosse vendido daria para comprar uma dúzia daquela bijuteria.
Ônix suspirou deixando um gemido escapar e Inara torceu a boca dramaticamente. — Eu sei. Fui má, não fui? Quando tudo isso acabar vou voltar e entregar a eles algumas moedas para pagar as coisas que peguei.
Inara já tinha tirado todo seu traje de luta, agora estava somente com a túnica, essa ela nunca tirava, era presente dos Elementais e estava repleto de magia. Olhou para a roupa que tinha trazido e franziu o cenho, a lembrança da primeira e única vez que vestiu um vestido lhe voltou. No baile tinha se sentido maravilhosa, mas no dia seguinte precisou sair no tapa com vários cadetes por conta das piadinhas, depois disso tanto ela quanto Lisse ou Ana tinham prometido não vestir mais essas porcarias, pelo menos não enquanto estivessem em treinamento no quartel.
Mas ainda assim a visão daquelas roupas tão femininas deu a Inara um sentimento de melancolia, a fez lembrar de tempos que ela e as irmãs sequer imaginavam o futuro reservado a elas e ainda suspiravam enquanto falavam sobre os garotos menos horríveis do quartel.
Colocou o vestido por cima da túnica, calçou os sapatos e puxou as cordas do corselete o mais que conseguiu acentuando ainda mais sua cintura, penteou os cabelos e os prendeu a maneira que via Délia usando.
Saiu debaixo das asas de seu dragão e olhou para a prancha da espada. Seu espelho desde que começou a viajar.
— Não pareço uma guerreira da brisa, só uma camponesa linda que vai sorrir inocente para cada investida na primeira taberna que encontrar sem levantar suspeitas porque uma moça tão fofa como eu não poderia nunca saber se defender.
Inara sorriu animada e otimista. Fez uma trouxa com suas coisas, amarrando junto a espada, o arco e aljava. O chicote tinha ficado dentro da bolsa.
Torceu a boca, precisava encontrar um saco maior, aquele não lhe ajudaria muito. Não para guardar suas armas. Por fim rasgou o tecido que ia abaixo do vestido e enrolou a sacola, fazendo um rolo enorme e comprido.
Melhor... A ponta da espada estava encoberta pelo menos. Colocou aquele volume nas costas e montou Ônix. Ia entrar na cidade como camponesa, melhor disfarce não poderia encontrar.
Ônix alcançou altitude, quando alcançaram os céus Inara não teve tempo de desembrulhar sua espada, nem mesmo de sentir o perigo.
Se viu rodeada de dragões de chumbo. Os guerreiros negros sequer prestavam atenção nela, mantinham o foco em Ônix que seguindo o próprio instinto de proteção, deu uma rasante e mesmo ainda estando alto ele virou o corpo e com um empurrão usando a asa ele derrubou Inara.
Na queda ela viu que seu dragão negro voou com velocidade ganhando distancia dela. Ele fez aquilo para protegê-la e ela chorou, porque nada podia fazer senão gritar o chamando de volta.
Com o baque no chão veio o tranco e com isso ela sentiu o corpo amolecer, antes de perder completamente a consciência ela teve um vislumbre no céu a frente. Ônix lutava bravamente com os guerreiros negros, eram tantos que ela soube naquele momento que ele seria capturado. O chamou mais uma vez antes de seus olhos fecharem.
Ouviu uma voz ao longe.
— Tola... Não devia ficar andando por ai com ele. Chamou a atenção para você mesma.
Novamente apagou.
Uiui, não me matem *-* rsrs beijos até semana que vem nesse livro :D
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Sanoar 3- Herança Cósmica- (DEGUSTAÇÃO)
FantasyEm sua busca incansável pelo dragão do equilíbrio Inara corre atrás de cada pequena pista, até que perto de Bendize ela perde o próprio dragão e se vê prisioneira. Agora ela precisa correr contra o tempo e arrumar um jeito de reaver Ônix. Em meio...