Capítulo 4

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➳ ➳ ➳ ➳ ➳ ➳ ➳ ➳ ➳ ➳ ➳ ➳ ➳                     Eu Consegui?
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Ao anoitecer minhas vistas já estavam embaçadas e os meus dedos cansados de tanto discar números. Realmente, arrumar emprego hoje em dia é uma tarefa nada fácil. Deixei algumas páginas salvas para que eu continuasse amanhã, sentei-me no velho sofá marrom, pensando que quando arrumasse um emprego compraria outro. Passei a mão por alguns rasgos que continham nele e me lembrei de Andrew, um gato branco e preto que vi abandonado um dia e o trouxe para dentro de casa, péssima escolha por sinal. Depois que vó Bina faleceu eu me sentia muito sozinha e não descartei a possibilidade de que eu poderia ter um bichinho, mas eu deveria ter descartado, pois aos sete meses, Andrew não era mais um gato comum e sim um gato possuído. Em pensar a quantidade de cortinas, roupas e utensílios que perdi por causa dele me deixa louca. Tudo que ele pegava, ele destruía. Sem contar nas suas necessidades extremamente fedidas. Mijar no pé da sua cama, no chão e na geladeira não era nada agradável e admito que de tanto abaixar para limpar me proporcionou músculos nas coxas e claro que adorei.

Ajeitei-me no sofá e estiquei as pernas. Pensei na possibilidade de, por acaso, eu ser aceita na Sartori. Deus, não tenho nem ideia de como seria a minha reação caso isso acontecesse. Mas voltando a realidade, desviando dos sonhos, talvez o emprego de vendedora se encaixaria melhor no meu perfil no momento, afinal eu era boa de papo e certamente seria de vendas, sorrio convencida com o pensamento.

Levantei e caminhei até a cozinha, hoje eu estava com a fome de dez mendigos.

O quê? Não é drama não, falo sério!

Fiz um lanche contendo hambúrguer, alface, tomate, maionese e cebolas roxas caramelizadas, e como me conheço bem fiz mais dois com hambúrguer e cheddar. Depois de comer tudo com um copão de refrigerante, arrumei minha pequena cozinha e fui para o meu quarto escovar os dentes e ter uma noite de sono gloriosa.

Já de manhã, acordei com o telefonema do Sr. Howard, eu iria pegar o meu acerto. Tomei um banho rapidinho e saí rumo a empresa, mas como sempre, nada vem fácil para mim e claro que eu teria que esperar o busão passar. Após esperar incansáveis minutos no ponto de ônibus o busão chega dáquele jeito: super, hiper, mega, big, extra lotado. Passei por algumas pessoas que empacavam a entrada, dei ombradas em umas e pisada nos pés de outras, mas com muita luta e garra cheguei no cobrador. Soprei uma mecha que caiu em meu rosto para cima e passei o cartão. Mas como se a porra do meu dia já não estivesse indo tão ruim o caralho do cartão não passou.

Já posso surtar?

Peguei aquela velha bolsinha de guerra de moedas e contei rapidamente, ou tentei, porque havia um homem ao meu lado e insistentemente me dava cotoveladas no braço, até a hora que eu surtar e mandar ele dar cotoveladas na mãe dele.

Qual é aí, vai demorar muito minha filha?

Gritou uma mulher entre as pessoas com cara de encrenqueira. Virei minha cabeça igual a garota do exorcista e fuzilei a mulher.

- Ta com pressa colega? Por que não pegou um táxi? -digo sem emoções.

- Além de lerda é engraçadinha, porque você não pegou um táxi? Nos pouparia da sua lerdeza.

Respira Charlotte.

- Escuta garota, eu estou tendo um dia de cão e se você continuar falando não vou hesitar em dar um murro na sua boca, então, para a sua saúde dentária, cala essa merda de boca! -grito e todos me olham.

Reviro os olhos e continuo juntando as moedas.

Já no meu destino, caminho para dentro da empresa e cumprimento alguns ex colegas de trabalho. Como ainda não há secretária passo direto e dou duas batidas na porta de sua sala. Adentro assim que ele autoriza e conversamos um pouco.

Que homem lindo.

Engulo em seco ao sentir a pressão gostosa de seus lábios no canto da minha boca, dou um meio sorriso e ele também sorri, pego meu dinheiro de suas mãos e saio. Me encosto na porta e respiro fundo.

Ao sair da empresa decido pegar um táxi mesmo, só para não ter que ameaçar alguém novamente. Depois de alguns minutos, chego em meu prédio e ao cumprimentar Júlio, o recepcionista do prédio ele me entrega seis cartas que logo vejo que são contas. Tomo ar e subo até meu apartamento.

Tiro os calçados e jogo a bolsa no sofá, jogando também a chave de casa em cima da mesinha de centro. Caminho até a cozinha e pego o pote de sorvete de morango, sento na mesa e abro as cartas.

Contas e mais contas...

- Calma Charlotte, você vai sair dessa. -digo tirando e colocando a colher no sorvete várias vezes.

De repente, ouço meu celular tocar. Corro até ele abrindo a bolsa um pouco desajeitada, pego o celular e vejo que o número é desconhecido. Atendo.

- Alô?

- Charlotte Higgins? -a voz de uma mulher soa.

- Sim?

- Aqui é da empresa Sartori, estou ligando para informar que a senhorita foi uma das selecionadas para a entrevista do emprego de secretária.

Nesse momento o meu mundo para, tudo para. Meu coração palpita loucamente dentro do peito e meus olhos estão quase pulando para fora... isso é impossível.

- Continue. -digo com a voz estrangulada.

- Enviarei o endereço por e-mail e a hora. Compareça no horário marcado e, por favor, não se atrase.

A mulher desliga e as batidas do meu coração aceleram.

Deus, eu... eu... eu consegui? Fui chamada para uma entrevista de emprego? E na Sartori?

A probabilidade disso acontecer é de uma em um milhão!

Sem conseguir mais me conter grito sem me importar de que alguém venha reclamar. Eu consegui, eu consegui! Eu vou para uma entrevista caralho!

Pulo por todos os cantos da casa e paro no meio da sala para pensar em que roupa vou usar. Não posso chegar numa empresa daquela trajada em uma calça jeans e uma blusa. Penso que o dinheiro de mais cedo veio bem a calhar. Calço novamente minhas sapatilhas e pego minha bolsa junto com a chave e o celular. Tranco a casa e pego novamente um ônibus. Desta vez, um pouco menos lotado. Vou rumo a loja que me proporcionará a roupa perfeita de minha entrevista.

Chegando ao shopping, vou direto para uma loja formal que apresenta roupas na vitrine que me chamaram atenção. Escolho algumas peças que achei que combinariam e vou para o provador. Mas é aí que a catástrofe acontece: a saia fica extremamente justa. Embora eu tenha 1.72 de altura o meu quadril é muito largo. Não é aquela coisa extravagante, meu bumbum é bem proporcional ao meu corpo, combinando com as minhas coxas definidas e a minha cintura levemente afinada, dando destaque aos meus peitos também avantajados. Acredito que mesmo tendo descendência americana eu tenho muito da mulher brasileira, que realmente são lindas.

Experimentei outras roupas que serviram perfeitamente em meu corpo e pedi para uma funcionária me trazer um número maior da roupa perfeita que havia escolhido minutos antes. Perfeito. Comprei apenas três peças de roupas, afinal eu iria fazer apenas uma entrevista e não iria para mais um dia de trabalho. Após comprar tudo o que queria, peguei minhas sacolas e fui para casa. Já no apartamento, deixei as sacolas em cima da mesa e peguei o celular para verificar o endereço no e-mail e retirei as sapatilhas, junto com a calça jeans de lavagem azul escuro e a blusa soltinha verde musgo. Caminhei apenas de langerie até o quarto e coloquei um vestido confortável.

Após jantar, dei uma ajeitada na "pequena" bagunça que fiz e caminhei até o quarto, separando a roupa que eu usaria no dia de amanhã. Eu estava sonhando, só podia ser sonho. Minha ficha não havia caído ainda, mas logo me desanimei com a possibilidade de sair da empresa sem emprego. Eu precisava muito da vaga. Juntei as mãos e apertei os olhos com força e pedi para vó Bina com todas as forças que havia em meu coração para que desse tudo certo amanhã. Beijei o dedo indicador, ainda fechado, agradecendo. Deitei-me e comecei a pensar em quem faria a minha entrevista. Se era a mulher que me ligou ou um dos chefes.

Com certeza, eu esperava que fosse um dos chefes. Principalmente, o Deus grego demônio...

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