As nove hierarquias do céu

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  — Como mencionei, sou um anjo guardião. Meu papel é orientar e influenciar os homens em suas jornadas de vida. Nas narrativas populares, somos retratados como seres de luz, responsáveis pelo crescimento espiritual da humanidade. Valorizamos a liberdade e, quando estamos no céu não temos apego a coisas materiais, entretanto, após minha queda, fui condenado a viver eternamente como um humano, carregando os pecados e desejos humanos,  isso alterou minha perspectiva sobre dinheiro e luxúria. — Diz ele abrindo os braços e apontado para a enorme casa em que ele morava.

— Mas você não trabalha. Como consegue manter tudo isso? A essa altura, você já deve saber que eu sei que todo aquela conversa de você ter pais que vivem por aí viajando foi pura mentira— Arqueio as sobrancelhas e ele morde os lábios reprimindo um riso, tornando-se ainda mais cativante. Durante todo esse tempo, tentei resistir às suas investidas para me seduzir, porém, cada hora que passava, mais difícil se tornava ignorar seus olhos, seu toque e aquele sorriso que se originava no canto de seus lábios, espalhando-se por seu rosto.

—Você está pensando alto demais. — Ele me observa de soslaio e emite uma risada que instiga um desejo por ele em meu âmago, um anseio por mais daquela risada.

Assim que percebo sobre o que ele estava se referindo, sinto meu rosto arder em rubor. 

— Saia... da minha... mente — digo, enfatizando cada palavra, o que o faz rir ainda mais.

— Casey, estou aqui. Não vou a lugar algum. — Ele repousa uma das mãos sobre meus joelhos desnudos pela saia de renda (até um pouco curta) que visto. — Se minha presença causa tudo o que você pensou, basta dizer, já sou seu, muito antes de nos conhecermos. — Seu toque desliza até a parte interna de minha coxa. Esse contato inesperado faz meu corpo estremecer, ansiando por mais. Cada centímetro que suas mãos exploram, irradia ondas elétricas por todo meu ser. Embora meu corpo clame por mais, sei que essa proximidade é inadequada; afinal, ele mentiu para mim, ocultou segredos e subestimou minha capacidade...

Equipo essas palavras como um escudo contra seu toque e reposiciono-me na cadeira, afastando sua mão.

— Você não me afeta assim — digo, mais para mim do que para ele. Preciso acreditar em minhas palavras. — Eu não estou aqui porque sua presença me agrada, estou aqui porque você tem algo que me pertence: informações sobre o que tanto escondeu de mim. 

— Você questionou como mantenho tudo isso. Bem, sou um anjo; uso meu charme e artifícios. — Pisca um olho e reviro os olhos.


— Acredito que agora queira compreender melhor a hierarquia de seu pai. — Ele me conduz até o fundo da casa, onde um jardim se desenrola com diversas flores. O chão era repleto de mato muito bem cortado, no centro, uma piscina de água límpida cujos reflexos me faziam lembrar seu olhar.  Ao redor dessa piscina, havia uma cerca de arbustos e do outro lado dessa cerca, uma macieira projeta sua sombra sobre uma mesa de piquenique branca. Atravessamos o espaço enquanto o crepúsculo emoldura o cenário. Não sabia dizer se o Éden realmente existiu, (porém, depois de tudo o que eu descobri hoje, não cabia a mim tal desconfiança), mas, se tivesse existido, com certeza transmitia a mesma paz e beleza quanto esse lugar. A imersão na  serenidade me faz desejar que o tempo se detenha. — Os Arcanjos lideram os Anjos, como mencionei. — Ele disponibiliza uma cadeira para que me acomode. — Deus confia a esses seres celestiais missões transcendentes e revelações além do entendimento humano. — Explica, assentando-se no encosto vago ao meu lado. — O Príncipe dessa categoria é MIKAEL. Penso que sabe a quem me refiro. — Fico boquiaberta ao escutar isso.

— Meu pai é um príncipe? — Indago, surpresa.

— Certamente, Vossa Majestade — ele brinca, inclinando-se levemente. — Contudo, aqui na Terra, esse título perdeu relevância após sua expulsão do céu. — Encerra minhas expectativas. — A seguir estão os Principados, guardiões da comunidade dos Arcanjos. Supervisionam os líderes dos Anjos Guardiões. O Príncipe dessa categoria é HANIEL, que lida com questões amorosas entre os seres celestiais.

— Muitas coisas se encaixam agora — comento, em tom jocoso.

— E prosseguindo, temos as Virtudes. De acordo com as leis divinas, orientam as pessoas conforme a vontade divina. Traduzem o desejo de Deus e fornecem discernimento aos humanos. O Príncipe dessa categoria é RAPHAEL, que guia as ações de cura e é a medicina divina.

— Cada categoria possui um príncipe? Não há um rei? — Minha curiosidade aflora.

— O Rei de todas é Deus. Apenas Ele detém esse título. No entanto, os que estão abaixo têm papéis vitais. As Potências, por exemplo, zelam pela ordem e pelos elementos: Água, Terra, Fogo e Ar. São invocadas para repelir tentações. O Príncipe das Potências é KAMAEL, que interfere nas relações interpessoais e disciplina, capta influências divinas para transmitir aos Anjos dessa categoria.  Dominações vêm em seguida. São líderes inatos, inspirando o homem a triunfar sobre seus demônios internos. O Príncipe das Dominações é TSADKIEL, auxiliador em situações diversas, profético e inspirador. Fomenta mudanças positivas nas almas frágeis. Agora, os Tronos são únicos, cuidando do trono de Deus, unindo a humanidade e comunicando as ordens divinas. Seu Príncipe é TSAPHKIEL, simbolizando forças criativas e auxiliando a visão de futuro, ligado à Terra. Os Querubins, a penúltima categoria, ordenam o caos universal, transmitindo conhecimento e ideias. Seu Príncipe é RAZIEL, o Anjo dos mistérios e do conhecimento original. São os bebes, retratados com simpatia e graça pelos pintores. — Seus traços de ironia contornam suas palavras. — E, finalmente, os Serafins, a categoria mais próxima de Deus. Embora anjos não envelheçam, os Serafins são os mais antigos. Representam a infinita bondade, vigiam, adoram e louvam a Santíssima Trindade. Manifestam a glória divina e têm poderes de purificação e iluminação. O Príncipe dos Serafins é METRATON, governando a criação para os habitantes da Terra. Essas são as nove hierarquias celestiais, cada qual com um príncipe. Todas existem para manter a ordem no céu e reger tudo na Terra. — Finaliza, ao colher uma maçã caída. Ele me oferece, mas recuso.

— E quantas dessas hierarquias existem no céu?

— São 72 anjos guardiões ao todo, distribuídos em grupos de dez, liderados por sete Arcanjos. O último Arcanjo comanda um grupo de doze Anjos Guardiões, o grupo de seu pai.

— Espere um instante — tento processar essa avalanche de informações —, o que ocorreu com esses anjos guardiões depois da queda de meu pai do céu? — Christopher sorri, traiçoeiro e entusiasmado por perceber o meu interesse por toda aquela história, ou melhor, dizendo: sua história.


—Essa é a minha parte preferida.




Caído para mimOnde histórias criam vida. Descubra agora