Capítulo II

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JANEIRO DE 2010 — LONDRES

— Para onde você pensa que vai desse jeito?

Pulei do sofá, largando meu muffin e meu café quentinho na mesinha ao lado, e corri para impedir que Robin chegasse na porta.

— O quê? — Ela me encarou com os óculos sujos de alguma coisa que eu deduzi como mostarda e os cabelos secos e assanhados amarrados com um cadarço de tênis no topo da cabeça.

— Aonde você vai?

— Trabalhar. — Falou como se aquilo fosse óbvio e eu estivesse sendo tola de propósito. — Dá para sair da minha frente, Ann?

— Robin, você está de calcinha e camiseta.

Minha irmã demorou um tempo para entender o que eu tinha falado, sua cabeça parecia girar sem ter um ponto fixo onde estacionar. Ela se fitou calmamente e viu suas pernas nuas e a calcinha frouxa com estampa da Minnie que usava, deu um suspiro longo e voltou cabisbaixa para o quarto.

Depois de terminar o café da manhã e garantir que minha irmã conseguisse vestir a calça jeans e uma blusa decente para ir trabalhar, eu me arrumei, peguei uma pasta que tinha preparado com documentos e currículos e coloquei os pés na Londres fria e chuvosa daquela quarta-feira. Eu já estava na cidade a pouco mais de três semanas e ainda não tinha me acostumado com o fato de não passar as tardes caminhando entre o caos e correria nova-iorquino e nem poder ir nas cafeterias do Central Park ou mesmo piqueniques com meus amigos, estes que eu mantinha contato por email e telefone.

— Leva meses. — Robin falou enquanto virava uma panela de chilli e guacamole na boca, era o prato preferido de sua ex Lana. — Nó somos americanas, pior, nós somos nova-iorquinas, somos geneticamente criadas para não se acostumar com nenhuma outra cidade. — Robin já morava em Londres há cinco anos.

Apesar da estranheza da nova vida, eu estava decidida a fazer minha estadia ali valer a pena. Bom, não sabia bem por onde começar, em Nova Iorque eu trabalhava em uma livraria, morava em uma quitinete e atrasava as contas — mamãe e papai tentavam me ajudar, mas eu não aceitava — aqui pretendo que seja diferente.

Passei metade do dia entregando currículos nas lanchonetes, cafeterias e vários estabelecimentos onde achei que poderia ser simpático o suficiente para acolher uma americana desempregada. Quando estava sentindo minha alma deixar meu corpo de tão cansada que estava, resolvi voltar para casa, no caminho passei em frente a um teatro pequeno, com cortinas vermelhas nas janelas compridas e portas de madeira escura onde se via um informativo com: TESTE PARA NOVOS ATORES PRÓXIMA SEXTA ÀS 8h00. No mesmo instante eu lembrei do ator estranho que eu tinha conhecido no meu primeiro dia na cidade, o tal de Benedict, o homem que não tirava os olhos do espelho. Corei ao pensar nele, não sabia bem o porquê mas ele me deixava envergonhada.

— Eu poderia visita-lo, não? — Faziam semanas que eu não o via.

— Falando sozinha?

Me virei rapidamente na direção da voz, um homem alto e de cabelos claros estava escorado na porta do teatro me observando, eu o conhecia de algum lugar.

— Você não estava aí antes, estava? — Perguntei, confusa.

— Te vi lá de dentro, achei que estava precisando de alguma coisa. — Sorriu. — Parecia pensativa.

Senti meu rosto queimar e meu coração acelerar, eu sabia quem aquele homem era.

— Você é atriz? — Ele perguntou. — Pretende participar do teste? — Apontou para o informativo pregado na porta atrás dele. — Vamos montar um espetáculo com algum texto de Shakespeare, ainda estamos decidindo.

— Eu...

— Venha, não custa nada tentar. — Sorriu. — Eu sou Thomas. — Estendeu a mão para me cumprimentar.

— Hiddleston. — Completei.

Ele balançou a cabeça simpaticamente e entrou de novo no teatro. Eu respirei e tentei me acalmar, quando Robin havia falado que em Londres era muito mais fácil de conhecer gente famosa eu tinha duvidado.

— Ontem mesmo eu tomei café na mesma doceria que o Paul McCartney. — Certa vez ela tinha me falado.

— Mentirosa. — Paul era meu Beatle preferido.

Corri para casa, àquela hora Robin já deveria ter chegado, ou mesmo ter sido carregada para casa pelos amigos depois de se perder no meio das gravações e pintar o rosto de alguns figurantes com tinta de parede — minha irmã realmente não sabia reagir a um término de namoro.

— Robin, você não acredita quem eu conheci hoje...

Escancarei a porta esperando encontrar minha irmã largada no sofá devorando três potes de sorvete, mas não foi bem isso o que eu vi, ou melhor, quem eu vi.

— Ah, olá, Ann.

Ele levantou do sofá e abriu um enorme sorriso, eu corei na mesma hora.

— Sua irmã me deixou entrar. — Ele continuou depois que viu que eu não falaria nada. — Quem você conheceu hoje?

— Hm... Benedict... Hm... Olá.

Passei a vista na sala e ele estava sozinho.

— Eu... — Baixou a cabeça. — Eu... Eu tenho dois ingressos para o Pink Floyd Concert. — Disse.

Pisquei rapidamente tentando processar aquela informação.

— O que você disse? — Sorri. — Onde está Robin? Está viva?

— Estou! — Ouvi ela gritando do quarto, provavelmente estava com os ouvidos colocados na porta. — Pode ficar tranquila.

— Você vai comigo? Quer dizer... Você quer ir comigo? — Ele deu alguns passos para perto de mim e segurou minha mão. — Robin me disse que você curte...

— Assim sem mais nem menos?

— O quê?

— Você está me chamando para sair? — Tentei não rir.

— Eu pensei que...

— Nós nos vimos apenas uma vez.

Ele ficou em silêncio, parecia pensar em uma resposta.

— Se você não for eu vou pegar minhas coisas e ir atrás da Lana nem que seja no inferno. — Robin saiu do quarto com a cara toda lambuzada de salgadinho de milho.

— Ela deve mesmo estar no inferno. — Bufei. —Tudo bem. — Encarei Benedict, ele parecia ansioso. — Mas só porque eu amo Pink Floyd. — Tomei os ingressos da mão dele e fui na direção da porta. — Espero estar em casa antes das dez.

— Sim, senhora. — Ele sorriu e me acompanhou.


Here With Me - Benedict CumberbatchOnde histórias criam vida. Descubra agora