Capítulo XVII

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Aquela era a segunda vez que eu acordava em um hospital e com Benedict me encarando.

Na primeira vez, foi graças a uma infecção alimentar. Um presente do Joe's, restaurante americano em que ele me levou. Ao abrir os olhos, estava indiferente quanto à presença do inglês, mesmo que ele tenha me levado até ali e cuidado de mim e da minha teimosia em morrer de comer comida gordurosa. Se a minha memória não falha, na época eu estava desempregada e sem rumo nenhum na vida. Já ele era Sherlock na BBC e a minha irmã ainda morria de amores pela cafajeste da ex.

Nesta segunda vez, meses depois da primeira, nossas vidas haviam mudado radicalmente. Agora eu tinha um rumo na vida no meio artístico, pelo menos era o que diziam. Muitos, principalmente meu mestre professor Rickman, me chamavam de atriz e eu adorava isso. Benedict não era mais Sherlock e, possivelmente, planejava outras coisas para o futuro. Minha irmã havia se tornado outra pessoa. Estava segura de si e não havia mais nenhum sinal de Lana em sua vida.

Claro, não poderia esquecer que agora eu estava carregando o filho de Benedict. Nem da felicidade que senti ao acordar e ver que ele estava ali do meu lado, segurando a minha mão.

- Você me deu um susto. - Disse. Levantou a mão para tocar minha gravidez. Aquela era a primeira vez que ele sentia o filho. - Nunca mais faça isso.

- Você me perdoou? - Consegui reunir forças para falar.

Ele me fitou, mas não consegui resposta.

- Eu vou cuidar melhor do Arthur. - Ele respirou fundo.

- Quem é Arthur?

- Nosso filho.

Arthur. Esse era o nome escolhido. O nome que Benedict escolheu sem mim.

- Vou ser um bom pai, você pode ter certeza, Ann.

- Eu sei que sim. Mas... me diga...

- Você não está em condições de falar. Desmaiou devido o estresse. Deve descansar e não pensar me mais nada.

- Me diga, Ben, você me perdoou?

O inglês se afastou. Ele não sorria.

- Eu sinto saudades de você.

- Por favor, não. Não comece com isso. Você não está em condições...

O ponto de felicidade que eu havia sentido ao vê-lo do meu lado, se desfez. Ele não tinha me perdoado, então por que estava ali?

- Eu quero que vá embora. - Falei, tentando parecer mais forte, mas sentido as palavras vacilarem.

- Estou aqui pelo meu filho, e te acompanharei até o fim.

Meu peito inflava. Não queria chorar, mas era quase impossível.

- Eu me arrependo, Benedict. Por favor, acredite em mim.

O médico entrou no quarto para dar orientações sobre o cuidado que eu deveria ter naquela reta da gravidez. O pai do meu filho ouviu tudo atento e prometeu ao médico que cuidaria de nós dois e que aquele episódio não mais se repetiria. Eu não estava entendendo nada. Se ele não havia me perdoado, porque mentia para o médico? A única cena que se criava na minha cabeça era, depois que o médico saísse do quarto, Benedict me abandonando e só retornando quando Arthur nascesse, para buscar a criança. Eu não queria isso.

*****

Quando chegamos ao carro, Benedict ainda estava silencioso. Ele só respondia sim ou não para as minhas perguntas e fingia interesse nas minhas exclamações. Começava a me sentir uma criança que se danou com os pais e agora eles lhe tratavam friamente.

Confesso que passei dias imaginando como seria o retorno glorioso dele para mim. Algo do tipo declaração de amor eterno e meias com a bandeira americana para o nosso bebê - sim, eu estava tão desesperada e desolada que estava imaginando absurdos. Mas não, estávamos os dois ali, em silêncio e eu não tinha ideia do que se passava na cabeça britânica dele.

Cansada, adormeci. Quando acordei, uma melodia baixinha estava tocando no rádio do carro e ele cantarolando. Era And I Love Her, dos Beatles.

I give her all my Love
That's all I do
And if you saw my love
You'd love her, too
I love her

- Eu não lembrava do quanto sua voz era bonita. - Disse, sem recordar que estava irritada com o gelo que ele estava me dando.

Pelo canto do olho, o vi sorrir. Benedict baixou a cabeça e fitou as mãos no volante, tentando esconder o sorriso. Ele manteve silêncio, mas, aquele pequeno instante do sorriso tímido e involuntário me trouxe alivio. Antes que chegássemos em casa e ele me oferecesse a ajuda para descer, eu prometi para mim mesma e para o meu filho que reconquistaria o inglês.

Here With Me - Benedict CumberbatchOnde histórias criam vida. Descubra agora