Amigo Monstro - cap. 5

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Meu tio - Joe - espalha seu odor de bebidas pela casa toda e sinto nojo só de pensar em chegar perto dele. E todos os dias isso acontece.

É horrível o modo como todos fazem a mesma coisa, todos os dias. Ainda mais se for se embebedar às custas do irmão e ser um grande estorvo na vida da cunhada e da sobrinha.

Mas o que estou dizendo? Eu também faço as mesmas coisas todos os dias. Mas isso vai mudar.

Um mês. E eu vou sumir!

- Samantha, desce logo! - minha mãe grita e eu me apresso em descer as escadas.

Seguro Joe por um braço, tampando minha respiração, enquanto ele me xinga das coisas mais obscenas possíveis. Sinto vontade de jogar ele no chão e sair correndo daquela casa, mas quem disse que eu tenho coragem?

Será que é muito ruim desejar a morte de um parente? E de dois?

Praticamente o arrasto até o quartinho nos fundos. Penso em trancá-lo lá dentro, mas isso me proporcionaria um grande castigo depois. Castigos como: ficar trancada no porão sem comida por um dia ou queimaduras na palma da mão ou qualquer outro que minha mãe criaria. E eu realmente prefiro os castigos dela.

Meu pai passa o dia inteiro trabalhando como policial e quando chega - à noite - fica um pouco agressivo. Costumo passar a noite trancada em meu quarto. Na verdade, passo a maior parte do tempo assim.

Já faz tanto tempo que o monstro do guarda-roupa parou de me assombrar. Viramos confidentes um do outro, testemunhas das atrocidades humanas.

Ei, amigo Monstro, eu também sou humana!

Joe chegou mais cedo hoje. Isso quase nunca acontece. É quase medonho saber que ele vai morrer de cirrose. É muito ruim desejar isso?

Ao olhar para meus próprios braços e enxergar minhas marcas e lembrar de ter tocado em Joe, posso sentir o cheiro tão odiável, posso ver uma gosma verde cobrindo minha pele, e sinto nojo.

Nojo de mim mesma.

Corro até o banheiro, tranco a porta e tiro minhas roupas com pressa.

A água do chuveiro está gelada, mas eu me enfio em baixo d'água. Sinto vontade de vomitar. Sinto raiva. Uma raiva que eu escondi de mim mesma por muito tempo e que agora vêm à tona com força.

Pego uma esponja áspera e esfrego meus braços com força. Sinto arder.

Mas eu quero mais.

E é aí que minhas marcas acontecem.

Com minhas unhas, arranho meu corpo, e desta vez não paro até ver o sangue se misturar com a água e cair no chão do box.

Posso ver todo o ódio que eu sinto ali, na mistura rosada descendo pelo ralo, no sangue preso às minhas unhas. Me agacho e fico observando, enquanto a água gelada faz os arranhões arderem.

- Não vou mais fazer isso. - sussurro.

Quando os pardais se aquietamOnde histórias criam vida. Descubra agora