Sobre perdoar - #34

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Laura limpou as lágrimas e retirou o celular no bolso da calça. Já passava das 5 da manhã, resolveu então ver o nascer do dia no convés. Assim que chegou ao andar superior sentou-se, encolhendo as pernas e passando os braços ao redor delas, pousando o queixo sobre os joelhos. Ela não soube quanto tempo ficou ali. A vista era magnífica, ao longe o sol ia despontando no horizonte e o vento gelado ia contra sua pele fazendo-a arrepiar. Ouviu passos próximos, olhou para trás e viu o homem loiro próximo. Esse havia colocado uma blusa de moletom e tênis. A voz séria dele rompeu o silêncio confortável entre eles.
- Não consegue dormir?
- Não. - Disse ela serena. - E você? Ainda com problemas em se adaptar ao colchão ou ainda continua dormindo no chão? - Ele riu do comentário sarcástico da médica, colocou as mãos dentro dos bolsos do moletom.
- Já dormi por tempo demais. Ela exibiu o primeiro sorriso: pequeno e meio frágil, mas um sorriso mesmo assim. Steve sentou-se ao lado dela cauteloso, e ela o encarou. - Eu fui um idiota fazendo você reviver a dor da morte de Johnny, a morte...- hesitou em dizer, mas disse - do nosso filho. Foi desnecessário.
- Capitão...
- Deixe-me terminar. - ele continuou. - Por muito tempo eu tive raiva sim, eu pensava Laura que tivesse brincado comigo por causa das mentiras, pela quebra da confiança. Quando eu soube da criança, eu temi por não saber quais consequências o soro teria sobre o desenvolvimento dela se ela tivesse sobrevivido, por vezes pensei que não devia ter ido embora e ter encarado tudo isso de frente.
- Steve, eu não desejava te fazer mal. - Seu coração estava despedaçado. - Nick e eu tínhamos uma relação instável. Não éramos pai e filha. Quando eu estava na agência eu queria ser vista não como uma Fury, mas como uma agente qualquer. Não espero que compreenda, eu sei que errei ao não te contar a verdade.
- Quanto a isso você não precisa se preocupar. - Disse fazendo menção de se levantar ao sentir que a conversa poderia ter chegado ao fim. Ele caminhou alguns metros à frente.
- Eu sinto muito. - Laura disse fazendo-o virar-se novamente em sua direção. - Não queria que acabasse assim.
- Eu também não. - ele falou de imediato, seus olhos azuis profundos presos aos dela. Então Steve voltou a se sentar. Passaram algum tempo apenas olhando para a linha do horizonte. Laura sentiu seus olhos lacrimejarem, seus lábios tremerem e uma dor sufocante em seu peito. Isso sempre acontecia quando estava prestes a chorar.
- Isso que havia entre nos dois não era um jogo. - O loiro não queria falar daquele assunto.
- Laura... - ele não a olhava. Ela odiava isso... Essa indiferença nunca lhe agradaria.
- Quero te pedir perdão. - Disse rompendo ela mesma o silêncio dessa vez, ela já podia sentir suas lágrimas quentes rolando pelo seu rosto e sua voz falhando miseravelmente encontrando os olhos azuis. - Eu errei... - Ele esperava que continuasse, ela ponderou por uns instantes pensando se realmente deveria prosseguir. - ...quando eu acordei, queria ir atrás de você, depois de tudo o que tinha acontecido. Mas você já estava longe.
- Laura...
- Minha mãe me contou por alto da briga que você e Nick tiveram e tudo mais.
- Nancy não devia ter te contado. - O som grave da voz dele preencheu o local.
- Eu pedi pra ela que não me esconde-se nada. Queria saber onde meu pai está para confronta-lo... - Laura se sentia mais relaxada, menos apreensiva. Mas sentia mal por tudo que seu pai fez.
- Não é necessário Laura. - Steve disse. - Não traga mais carga negativa para sua vida.
- Mas eu quero Steve. É necessário sim! Meu pai conseguiu matar o que eu sentia por ele. - A sinceridade e a determinação no fundo de seus olhos castanhos eram invejáveis. Ele sentiu algo estranho dentro de si, tão desconhecido que nem mesmo ele soube dizer o que era ao certo. Ele pareceu distante, embora seus olhos a mirassem vidrados, era como se ele não a estivesse enxergando. Percebeu sua face suavizar mais uma vez, de uma forma quase terna.
- Você pode me perdoar Steve? – indagou, Ele acordou de sua divagação, olhando as íris castanhas se focalizando mais uma vez a sua frente.
- Em meu coração já perdoei. – Ele respondeu simplesmente. Ele ficara sério novamente, seu semblante de mármore havia voltado ao rosto descontraído. Ela se perguntava o que havia falado de errado para ele ter mudado tão bruscamente, mas não encontrava nada de mais em suas palavras. Viu-o olhar para a linha do horizonte, evitando mira-la nos olhos. Ele realmente estava incomodado com alguma coisa. Ela mirou o sol a sua frente. Steve suspirou levemente quando sentiu a mão pequena sobre a sua.
- Obrigada. - Ela sussurrou quando ele voltou a encara-la.
- Seu perdão é muito importante pra mim. - Seus olhos chocolate não desgrudavam dos seus e mais uma vez se sentiu hipnotizado. Eles eram imãs. Eles o puxavam com tamanha força que por mais que tentasse resistir, ele não conseguia não se atrair. Como se ele tivesse resistindo. Quem ele queria enganar? Não havia resistência alguma. Ele sorriu levemente ao constatar aquilo, enquanto se inclinava devagar em sua direção. E como imã, ela também fez o mesmo. Seus narizes se tocaram. Mas seus olhos continuaram abertos. Suspiraram ao mesmo tempo, cada um sentindo o ar do outro em suas bocas entre abertas. Fecharam os olhos juntos. Cientes que faltava apenas milímetros para que seus lábios se tocassem. Seus corações batiam desenfreados em expectativa. Um barulho os despertou. Um dos Quinjet da base acabava de decolar . Seus olhos se abriram de supetão. O que estavam fazendo? Se levantaram ao mesmo tempo, afastando-se.
- Tenho que ir. - Ela disse com um sorriso tímido nos lábios rosados. - Hoje tenho plantão. Bom dia Steve.
- Bom dia Laura.

Quando chegou em casa, Laura foi direto para o quarto. Abriu uma das cômodas e pegou a pequena caixa de veludo negro, sentou-se na cama e por alguns minutos olhou par de alianças, retirou a menor e pôs em seu dedo.
Pode perceber o sentimento de alívio nascer em seu peito.
Viu aquela conversa apagar meses de dor, de lágrimas derramadas e de desespero.
Tudo havia ficado no passado. Estava na hora de viver o presente. Laura colocou a pequena caixa no criado mudo, aconchegou-se na cama, fechou os olhos sentindo o sono chegar. Os dias passaram voando. Era início de verão e as temperaturas em Nova York estavam bem altas. Naquela noite
Laura andava impaciente pelos corredores do New York Presbyterian Hospital sem entender o motivo de tanto zumbido pelo local. Enfermeiras, internos, residentes e até os atendentes conversavam entre si e a curiosidade acerca da nova fofoca fazia seus ouvidos coçarem em antecedência, na espera da grande revelação. Era horrível ficar no escuro, sem saber o motivo de tanto alvoroço em pleno plantão. Aproxima-se da sala do chefe da ala cirúrgica onde avista a maioria dos seus amigos encostados no corredor sem tirar os olhos do interior da sala.
- Qual o motivo desse alvoroço gente?- Pergunta ao se aproximar de Margaret.
- É que o Capitão América está aqui! - Ao ouvir aquelas palavras Laura sentiu o coração quase sair pela boca. Nenhum civil sabia que Steve Rogers sobreviveu aos tiros que recebeu nos degraus do Tribunal Federal de Nova York... não até agora. Fim de jogo. Laura visivelmente transtornada caminhou esquivando-se do povo que se acotovela diante da porta da sala do Chefe, o Dr. Jason, abriu a porta e se deparando com um par de olhos azuis. Os lábios dele não se moveram. Ela estava visivelmente constrangida ao olhar para o homem do braço biônico em seguida para o chefe.
- Doutora Amandeli? Precisa de alguma coisa? - Ouviu a voz ácida do chefe.
- Me desculpem. - murmurou atrapalhada - Não pretendia interromper...com licença...- Laura fechou a porta rapidamente e saiu em disparada por entre as pessoas aglomeradas na porta. Foi para a área de descanso seguida por Margareth.
- O que foi aquilo lá na sala do Janson?
- Pensei fosse outra pessoa lá dentro... - Respondeu Laura.
- Quem? - Meg estava curiosa pelo motivo de Laura ter aberto a porta da sala do Chefe geral...
- Aí Meg, eu confundi... - Laura tentava ser confiante.
- E o Jason? Te viu?
- Sim
- E aí?
- Ficou sem entender a interrupção.
- Laura que gafe! - Havia sinceridade no tom de voz da Meg.
- É eu sei... - Laura murmurou seria. - Foi no impulso.
- Agora todo mundo de New York New York deve achar que você é uma louca amiga.
- Nem me fale...acho que eles têm é certeza. - Laura por fim se sentou na parte baixa do beliche e permaneceu ali por alguns minutos antes de sair do quarto para fazer sua última "ronda" no plantão.

Laura bebericou sua última xícara de café, depositando sobre a bancada e caminhou para fora do refeitório. Acabou dando de cara com a última pessoa que queria ver aquela madrugada: Doutor Jason.
- Doutora.
- Senhor, que bom poder vê-lo, - sorriu com um sorriso forçado - iria procurá-lo para pedir desculpas pelo ocorrido mais cedo... - Antes que Laura pudesse terminar ele interviu autoritário.
- A Doutora foi inconveniente entrando na minha sala sem bater. Espero que não se repita... - Disse curto e grosso, frente à frente com ela.
- Sim senhor. - Foi tudo o que Laura conseguiu dizer. Assim que o homem se afastou, Laura encontrou os olhos de Dora a encarando. Estava com um sorriso de escárnio nos lábios. O homem passou por ela a passos largos e ela o seguiu. Laura já estava acostumada a aquele tipo de gente, tanto dentro do hospital quanto dentro da SHIELD.

O vento balançava as cortinas do quarto. Nesse instante, Laura repousava seus braços sobre a mureta da sacada, olhava o céu estrelado quando a campainha tocou. Caminhou até a porta para atender inesperadamente quem nunca esperava.
- O que está fazendo aqui? – disse tentando soar firme.
- Posso entrar? - Como era possível que depois de tanto tempo seu pai apareceria como se nada tivesse acontecido. Laura permitiu a entrada daquele homem que não via há mais de um ano.

Continua...

I Knew you were troubleOnde histórias criam vida. Descubra agora