– Laura, sua cabeça tem estado nas nuvens! O que aconteceu? – Sam, minha colega de quarto, cai ao meu lado no sofá e aperta a minha coxa. – Que bicho te mordeu durante o dia?
– Bicho nenhum, Sam. Eu estou me sentindo um pouco perdida com a quantidade absurda de visitantes andando por aí. Você viu que esse promete ser o inverno mais frio dos últimos quinze anos?
– Sim, eu vi. Mas, eu já estou acostumada, como você – ela aperta meu braço. – Não sei como uma garota latina conseguiu se acostumar tão bem com o clima canadense.
– Talvez eu não seja brasileira como conto para vocês – dou de ombros e ela morre de rir.
– Ai, Laura, você é mais canadense que qualquer outra pessoa que eu conheço.
– Eu só moro aqui há seis anos, o que tem de errado nisso?
– Bom, você foi a melhor da turma nas aulas de inglês durante o ensino médio, se formou com honras e ainda está cursando literatura inglesa. Mais fluente que isso, só nascendo de novo!
– Ei, lembra do dia que a gente se conheceu no meu primeiro ano e você achou que eu fosse britânica?
– Lembro sim! Você tem um talento para imitar sotaques que te faz ser a pessoa mais multicultural do mundo.
– Eu não sou multicultural, eu estou mais para uma pessoa que é de todos os lugares do mundo. Porque eu não entendo nem a cultura do meu país direito – começamos a rir freneticamente porque é verdade, eu entendo nada do Brasil, ainda mais morando longe.
– Bom, você pode, pelo menos, me contar se é um cara que te deixou nas nuvens?
– Sam, é por isso que eu te amo! – revelo a verdade depois de tanto rir. – Eu estava naquele café na Gastown quando ele entrou, pediu um café e pediu para sentar comigo porque não havia mais lugares vagos.
– A cafeteria estava lotada?
– Aham.
– Se você não acreditasse em tantas teorias físicas, eu diria que isso foi completamente obra do destino. Como ele é? O que ele faz? E o nome dele?
– Ah, o destino que você acredita não gosta de mim porque ele foi embora antes que eu pudesse perguntar seu nome. – Puxo a minha mochila e pego o papel que ele me entregou. – Mas eu tenho o número dele.
– Me deixa ver isso agora, Laura! – Sam toma o papel da minha mão.
– Tudo o que eu posso dizer é que ele destoava do clima da cafeteria, quase como se tivesse entrado ali para uma emergência e ele nem é daqui, o sotaque australiano dele entregou tudo!
– Um australiano? Laura, eu te venero! Manda uma mensagem pra ele agora.
– Agora? Sam, onze horas da noite.
– E daí? Vocês não se conheceram em uma situação muito normal mesmo.
Pego meu celular, salvo o número dele como "Cara misterioso" e abro a caixa de texto para mensagens.
– Confere se ele tem Whatsapp! – Sam quase me deixa surda.
– Boa ideia. – Abro o aplicativo e busco pelo nome dele. – Bingo! – Minha atenção vai até a foto dele. - Ele estava usando essa exata jaqueta!
– Pera aí, você conheceu um homem desses? Laura, eu preciso frequentar esse café com você mais vezes! Aposto que ele é modelo.
– Mando a mensagem pelo Whatsapp ou como SMS?
– Manda SMS para parecer menos stalker, claro! – Ela puxa uma almofada, abraça-a e observa a tela do celular. – Digita algo.
– Tipo o que?
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Doce Sotaque | ✓
Short StoryDois estranhos em uma cafeteria. Ela parecia habitar ali, com seu café e notebook. Ele destoava, era um completo estranho. Ele tinha um sotaque facilmente reconhecível, ela fingia todos os sotaques do mundo para tentar se esconder. O jeito de pronun...