Capítulo Quatro - Conversas de Metrô

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Explico a Dacre a simples lógica do transporte de Vancouver: uma estação central te dá acesso a quase todos os itinerários da cidade – o que já é uma boa coisa. Eu passo aqui todos os dias para ir à faculdade, mas tenho que tomar um ônibus para chegar em casa.

– Há quanto tempo você vive aqui?

– Acho que em agosto fará seis anos – encontro um lugar para nós dois na plataforma.

– E você está aqui desde quando? – questiona-me um pouco assustado.

– Desde o primeiro ano do ensino médio – respondo. – Meus pais tinham planejado me deixar aqui por um ano, mas aí eu me acostumei demais e acabei fazendo todo o ensino médio aqui. Consegui me destacar nas aulas de inglês, fiz um currículo interessante e consegui uma bolsa para literatura inglesa. Não necessariamente para estudar só literatura, mas é o meu foco quando escolho as aulas.

– Isso é demais – ele parece impressionado. – Alguma ideia do que eu faça?

– Talvez você seja um assassino de aluguel, ou um investidor, ou um artista. Eu não sei, tenho um leque de opções na minha mente.

– Você está quase lá.

– Sério? – penso na pesquisa que Sam fez quarta à noite.

– Aham. E está começando a falar com sotaque britânico de novo! – ele belisca a minha mão.

– Ok, isso pode soar um pouco stalker demais, mas a minha colega de quarto jogou seu nome no google e achou um ator famoso que é muito parecido com você.

– Sério? O que falava sobre esse ator?

– Bom, ela não me deixou ler, mas vocês têm a mesma jaqueta preta que te vi usando. E parecem ter o mesmo cabelo e olhos.

– Parecemos ter ou somos a mesma pessoa?

– Ei, você está me deixando confusa e com medo! Eu acho que você matou o ator famoso e assumiu o lugar dele após descobrir que são gêmeos idênticos separados na maternidade.

Dacre solta uma risada quase maléfica e eu espero que todos no metrô olhem para ele e lembrem seu rosto caso algo ruim aconteça. E, depois de cinco segundos, ele transforma a sua risada e ele parece estar morrendo, se engasgando na minha piada.

– Você deveria ser comediante, sério, essa foi a melhor piada que eu ouvi desde que nasci.

– Para de exagerar, Dacre! – soco o ombro dele. – Vai morrer de tanto rir.

– Você deveria confiar no Google.

– Na última vez que fiz isso, eu achei que estava morrendo porque estava sentindo uma dor absurda na cabeça. Desde então, eu aprendi a não confiar no Google, muito menos em estranhos que tem páginas no Google.

– Em minha defesa, todo mundo que tem acesso à internet e um perfil em qualquer site tem uma página no Google.

– Não, eu quis dizer Wikipédia! – tento me consertar, mas ele está rindo de novo.

– Ok, senhorita agente do FBI, não precisa revelar as suas fontes.

– Ah, fala sério, agora eu vou ser zoada por ter um pouco de amor à minha vida!

Cruzo os braços e afundo minhas costas no banco do metrô, esperando ser sugada por ele e jogada para fora. Confiro o meu celular para tentar esconder a minha vergonha, mas um segundo depois Dacre está tomando-o de mim e guardando em seu casaco.

– Não, você não vai fingir que não escorregou. Todos somos humanos, eu sei que você tem muitos erros para cometer.

– E um deles foi concordar sair com você – reviro os olhos.

– O que? Como assim? – ele parece revoltado. Está com medo de tomar um pé na bunda no meio do metrô, senhor Sabe Tudo? – Laura, eu vou te provar que sair comigo não foi um erro.

– Vai ter que se esforçar muito, querido. Muito mesmo.

– Então quer dizer que eu já comecei em desvantagem?

– É, com certeza você começou com menos dez pontos.

Olho ao redor, vejo que estamos começando a deixar os túneis. Droga, a gente passou da estação!

– Dacre, a gente precisa descer na próxima estação – comento quando ele está mais preocupado em digitar algo no celular do que me olhar.

– Já chegamos?

– Passamos, na verdade.

– E ainda dá tempo de chegar ao restaurante?

– Eu espero que sim.

A voz padrão do metrô anuncia a próxima estação e eu puxo Dacre para que ele desça comigo. Felizmente só passamos duas estações e caímos em uma que é só irmos para o outro lado da plataforma para tomarmos a direção oposta.

Não troco uma palavra com Dacre, mas flagro seus olhos em meu rosto e roupa. Eu encaro minhas botas surradas – todo ano eu preciso comprar uma nova porque eu uso bota mais que uso tênis nesse lugar. E Dacre parece ter tirado suas roupas de um catálogo de uma marca famosa masculina, tudo parece perfeito, do nó do cadarço da bota até os fios de cabelo penteados para trás.

O metrô para bem à nossa frente, entramos e nos sentamos lado a lado. Dacre devolve o meu celular e sorri.

– Podemos conversar mais assim que chegarmos ao restaurante. – Ele parece sério ao dizer isso. – Brincadeiras à parte, eu também estou com uma desconhecida me guiando por uma cidade que eu nem conheço. Mesmo se a sua amiga não tivesse pesquisado, você ainda teria vindo?

Evito olhar para seus olhos observando a parede do túnel.

– Eu teria vindo mesmo assim – respondo.

– Nós nos conhecemos em uma cafeteria, o que tem de estranho e perigoso nisso?

Nada. Mas te conhecer fez uma sensação estranha retornar ao meu corpo. E eu tenho medo do que ela seja.

...

Olá queridos leitores,

E aí, gostando da história? Já shippam? Estão esperando um beijo? Acham que o Dacre está fingindo isso tudo? Acham que a Laura ainda vai descobrir algo sobre ele?

Vejo vocês no próximo capítulo,

Isa

Doce Sotaque | ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora