Capítulo nove

19 4 0
                                    

Penteava meus cabelos no meu banheiro quando minha mãe aparece no reflexo do espelho. Estava pronta para me levar para a casa de Rodrigo, apenas me esperando. Iríamos fazer o trabalho naquele sábado de manhã. Enquanto minha mãe me observava com um sorriso tímido eu tentava esconder o fato de eu estar apavorada e ao mesmo tempo esperançosa. Eu não sei, eu sou complicada.

O resto da semana se passou como todas as outras semanas. Rodrigo apenas falara comigo para me informar o seu endereço. Fora isso, ele continuou a ser o menino tímido da nossa sala. Depois da nossa discussão, que acabamos resolvendo que tudo estava bem entre nós dois, fiquei pensando se não deveria ter sido mais dura com ele. Se não deveria não ter deixado com que ele me convencesse a recomeçarmos. Se não deveria não ter aceitado suas propostas. Era tarde demais para reverter alguma coisa. Fazer o projeto não seria algo agradável, fazer com alguém que eu não gostasse seria pior ainda. O projeto eminente me deixava confusa. Um trabalho de escola é algo completamente comum para a maioria dos jovens. Para mim, era uma tarefa difícil, que precisava ser cumprida. Acho que voltar a fazer coisas normais, talvez me ajudasse a me sentir normal de novo.

Terminei de arrumar meu cabelo, minha mãe me esperava. Não havia por onde fugir. Isso será um desafio. Respiro. É só um trabalho. Eu já havia feito trabalhos antes. Não era um monstro. Se eu realmente me empenhasse, eu ficaria livre daquilo tudo para sempre.

Minha mãe e eu seguimos para o carro. O trajeto é tomado pelo silêncio de nossas bocas e os gritos da minha mente. Estava começando a pensar se deveria ficar no carro até minha mãe concordar em me levar de volta para casa, quando o prédio de fachada azul aparece. Quando percebo, minha mãe já me deixou em frente ao local e sai dirigindo. Informo pelo interfone, gaguejando, o meu nome e o número do apartamento de Rodrigo. Andar 25. Entro no elevador e quando aperto a campainha da porta, minha ficha cai. Eu quero gritar por socorro.

— Olá Clara! Pode entrar, a casa é sua. Meu nome é Valéria, mas pode me chamar de Tia Val, eu me sinto menos velha. Rodrigo está te esperando no escritório para começarem o trabalho. Qualquer coisa que precisarem, podem me chamar.

O fato da mãe do Rodrigo ( que supostamente tinha morrido ) ter atendido a porta foi quase engraçado e eu teria rido, se eu não estivesse surtando. Ela chegava a ser chata de tão simpática. Pedi licença e segui pelo corredor que ela indicava. Última porta no fim do corredor, a porta está aberta. Eu me sentia como um prisioneiro dando seus últimos passos em direção à sua sentença.

As paredes eram tomadas por fotos. Rodrigo criança. Rodrigo brincando no parquinho. Uma família inteira sorrindo, olhando para a câmera. O casamento dos pais de Rodrigo.

A última foto era recente. Rodrigo estava sentado em uma cama, onde parecia ser seu quarto. Ele tocava um violão. Eu não tinha a mínima ideia de que Rodrigo tocava um instrumento. Ele era realmente um completo estranho para mim.

Finalmente abro a porta e me deparo com Rodrigo. Ele esta sentado de frente para o computador, pesquisando algo. É possível observar o seu perfil. Ele não nota minha presença, então acabo ficando parada na soleira da porta, o que me dá tempo para observar o garoto. Seu cabelo castanho formava um topete. Seu maxilar largo causava uma harmonia com o resto de sua face. Os lábios eram pequenos e seu nariz estreito e baixo. Suas sobrancelhas curtas e cílios grossos se destacavam. Seu pomo de adão era proeminente. Analisando sua aparência com a luz da manhã e sem os problemas que precediam nossas encontros, notei uma coisa. Rodrigo era bonito. Ele não era bonitinho. Ele era lindo.

As orbes concentradas de Rodrigo se mexem e o garoto vira seu corpo em minha direção. Ele fica meio sem jeito e fica alguns segundos com a boca aberta sem saber o que falar.

No meio do caosOnde histórias criam vida. Descubra agora