A Lenda de Arkanum

CAPÍTULO 1 - A VISÃO

Ashtae

Era o décimo quinto ano da segunda era. A primavera estava às portas do Oriente. Os dias eram de paz, sem batalhas, dor e sofrimento, pelo menos na maioria dos dias. Porém, algo parecia errado. Nos últimos meses Alexandra, rainha dos elfos, sentia um clima pesado no ar, era como se alguma coisa estivesse errada, algo ruim iria acontecer. A elfa sentia o mal se aproximar. Era uma sensação ruim, nauseante. Era como seu coração estivesse pronto para explodir.

Embora fossem os últimos dias do inverno, havia sido um dia muito frio. O vento gélido era como a lâmina de uma espada, cortando a pele de todos aqueles que ousavam o desafiar. A neve cobria quase todo o jardim do magnífico castelo de Ashtae, onde a família real morava. O inverno havia sido tão rigoroso, que até as plantações de uva foram prejudicadas, sem falar nos pobres animais que não foram capazes de resistir à baixa temperatura. Normal? Talvez para muitos, não para a rainha. Alexandra não se lembrava de um inverno tão severo em Ashtae, muito menos acompanhado de tantas tragédias. Para a rainha, era um sinal do despertar das trevas. A prova de que algo estava muito errado.

Naquela noite, Alexandra optou por não acompanhar sua família no jantar, o que certamente não alegrou seu pai. Damian, embora um elfo sábio, sempre gostou de ter todos á mesa. Ele podia não ser mais o rei de Ashtae, porém, ainda era o chefe daquela família, mas, naquele momento, essa não era uma das preocupações da rainha. Lidaria com seu pai depois e sabia que o velho elfo a entenderia, ou melhor, teria um sábio conselho para ela.

Trancada em seu quarto, a rainha olhava para lua, buscando explicações pelo pesar que tomava conta do seu coração. Não tinha certeza do que estava acontecendo, eram apenas suspeitas, mas, e se fosse verdade? Como rainha, tinha o dever de proteger o seu povo. Alexandra ainda tinha em sua memória os dias de caos do passado, quando a miséria havia tomado conta de Arkanum. Havia jurado a si mesma que jamais permitiria que isso acontecesse. Se preciso, daria sua vida para que nenhum mal acontecesse com seu povo. Ela os amava mais que tudo. Em sua lista, o povo de Ashtae era o número um. Nada importava mais do que eles para ela.

Antes de dormir, Alexandra havia tido uma grande conversa com Ménides, a Mãe Natureza, a qual a rainha dos elfos era devota. Por muitos séculos Ménides protegeu Alexandra e assim como no governo de seu pai, a Mãe Natureza fez com que as terras de Ashtae prosperassem cada vez mais. Alexandra era grata as bênçãos concedidas pela deusa e por essa razão, sempre se manteve fiel a ela. Mas, naquela noite, não havia feito uma prece de agradecimento, mas de perguntas. Alexandra queria respostas. Queria entender o que seu coração tentava lhe dizer. Queria compreender aquele pressentimento. Estava tão envolvida em sua conversa com a deusa, que acabou por adormecer em seus devaneios.

No dia seguinte, encontrou com seu pai pela manhã, precisava dos conselhos do velho rei. Alexandra sabia que havia algo de errado, porém, não sabia o que. Seu coração estava apertado e o pressentimento era cada vez mais angustiante. A elfa precisava de suas respostas e o fato de não consegui-las, a entristecia profundamente. Com os olhos marejados, virou em direção a janela, a qual dava para belíssimo jardim do palácio, embora, devido ao rígido inverno, não se encontrava em seu todo esplendor. Suspirou e lamentou-se com os deuses, voltando sua atenção para seu pai, o qual mantinha-se calmamente sentando em uma deliciosa cadeira de mogno, com os dedos entrelaçados sobre a mesa de carvalho velho, uma belíssima obra artesanal.

– Não fique assim minha filha... Os deuses estarão ao nosso lado. Tenha fé. – A voz do antigo rei era fraca, afinal, ele já era um ancião, mas como sempre era dotada de sabedoria. Infelizmente naquela manhã, sua voz não fora suficiente para acalmar o coração de sua primogênita.