A GENTE PODIA TER SIDO MAIS

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A nossa sintonia era notável, tanto na preferência pelo café amargo quanto nas conversas sobre Nietzsche, Schopenhauer, o jogo da quarta passada e o último capítulo da novela das nove. Rolava afinidade, dessas raras, incomuns, tinha até aquela coisa de um terminar a frase do outro. A gente combinava em muita coisa, o beijo se encaixava, o papo fluía, rolava química. Nas discussões sobre direita e esquerda, Corinthians e Palmeiras, rock e bossa nova o que vencia era a harmonia, imperando até nas nossas diferenças. Parecíamos ter sido moldados um para o outro, como almas gêmeas. Pelo menos era o que eu achava.

Depois de uns meses e alguns vinhos você se foi, não disse nada, não atendeu minhas ligações, não respondeu as mensagens e me bloqueou das redes sociais, fiquei sem entender aquilo tudo, me prometeu o mundo e foi embora antes do dia raiar. Nunca fiz o tipo que se apaixona fácil, foi isso que te atraiu, pressa difícil e uma conquista suada, era essa a intenção, tola fui eu que não percebi a tempo para te impedir de me ganhar. O prêmio? Mais um coração partido, talvez. O tombo foi grande, a decepção imensa, eu acreditei, pela primeira vez em anos, que a gente podia dar em alguma coisa. Eu queria tanto que desse. 

Você optou por jogar no lugar de amar, eu afirmei pro mundo que foi por medo. É mais fácil considerar que por baixo de toda a sua segurança existia um rapaz amedrontado em frente dessa minha mania de intensificar a vida. Prefiro a versão de que por baixo de toda essa armadura tinha um cara desesperado para se libertar de todo esse metal que prendia sua alma doce, um cara exageradamente bonito, e assustado também, talvez com o coração remendado por conta de alguns gostares errados, um moço louco para se permitir cair de cabeça em uma nova história, mas que não sabia como vencer esse álter ego criado para sua própria proteção. Você era o cara de exatas, racional, calculista, e isso te rendia algumas medalhas, escolher por sentir anularia o jogo e você tinha espirito de campeão, o pavor da derrota te fez fugir. Poético, né? Mas eu sei que no fundo não foi nada disso, você era só mais um desses caras que gostam de colecionar coração alheio, quis mais uma menininha apaixonada para colar no seu álbum da vitória e eu caí no seu papo, não teve poesia alguma na nossa história, infelizmente, a gente podia ter dado muito certo, mas você escolheu não sentir. Fazer o que. 

Sabe aquele ditado: “sorte no jogo, azar no amor”? Cê ganhou a guerra, mas quem saiu perdendo não fui eu.

O Verão Em Que Tudo Mudou 2Onde histórias criam vida. Descubra agora