Einar não mostrou nenhum desejo contra o que eu fazia e muito menos disse alguma coisa. Como um corpo, aquilo que era, deixou-me conduzi-lo lentamente ao carro, deixou-me sentá-lo e sua quietude facilitou a colocação do cinto. Não se despediu da mãe. Sequer pareceu notar a existência da mesma quando eu fechei a porta e do lado de fora ela conferiu se estava bem trancada. Para trás deixamos uma mãe plantado no portão. As mãos estavam outra vez sobre o peito. Apertava o vestido e a pele. Apertava o coração e a alma. Ao meu lado, no banco do carona, meu amigo continuaria imóvel se não fosse o sacolejo natural do veículo.
Em mim deixou um beijo, com ela deixei a promessa de retorno.
Enrolado num pedaço de tecido tinha biscoitos e dois pães. Em uma garrafa ainda gelada - e que continuaria assim graças ao clima - tínhamos suco natural. Ele não vai querer, avisou a mãe do meu amigo. Quer dizer, ele não vai fazer nada. Coloque o biscoito na mão dele. Quando quiser, comerá. É tudo no tempo dele.
Como deve ser, eu pensei. Mas deixe comigo foi o que eu respondi.
Vi que teria dificuldade quando cheguei no limite da pista que estávamos e ao fundo tínhamos a vila colorida como testemunha daquela aventura. Eu apertei a mão do meu amigo que repousava sobre o próprio joelho e ri sozinho, porque dele não tive nenhuma resposta.
Lá vamos nós!
Saímos da pista limpa e percorremos o terreno acidentado o máximo que podíamos e julguei seguro. Havia musgo por todo lado e várias pedras soltas. Sacolejamos ao derrapar em cada uma delas e meu riso era certo, porém Einar continuou ali, apenas segurando com sua firmeza frágil o cinto de segurança. Se havia medo ou excitação, estava perdido lá dentro, onde somente ele podia ver. Depois de muito brigar com a natureza, lá estávamos nós ao pé da montanha. A mesma que se podia ver da janela de vidros manchados do quarto meu amigo. A cidade distante, o vento mais brando e nós, somente nós, habitávamos aquele pedaço de terra.
- Vamos lá fora? - Perguntei ao silêncio que era Einar.
Quem cala, consente, não é?
Foi difícil tirá-lo do jipe porque ele nenhum esforço fazia, mas depois de algumas tentativas e muita força empregada, eu o tirei e fiz sentar sobre capô do carro. Ele demonstrou insegurança quando eu tive que me distanciar para tomar a minha posição do outro lado de onde estava sentado, mas logo a montanha foi alvo dos seus olhos inexpressivos e eu queria tanto flagrar um sorriso que pelos primeiros minutos foi o rosto maduro de vinte e oito anos que eu admirei.
lolrel.
- Sabe o que é engraçado? - Eu continuei falando para a montanha e meu amigo calado. - Acho que nunca estivemos aqui. Se você esteve sem mim, não sei se saberemos, mas eu posso afirmar com certeza que nunca vim além da pista. Logo nós que sempre somos tão desbravadores - eu ri por nós dois.
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AZUL
Mystère / ThrillerO que acorda o regresso? Que sentimentos aguardam a volta? Qual é a cor de quem foi e, finalmente, retorna?