Capítulo 10

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Zoe

Eu nunca havia visto Noah dirigir daquela forma, como se fosse atingir a velocidade da luz num piscar de olhos ou pisada no acelerador. Ele parecia frio e concentrado, e eu imaginei se era comum aquele tipo de situação em sua vida. Era assustador, mas também transmitia uma sensação grande de segurança. Eu não sabia se era o jeito agressivo de Noah, mas eu realmente me sentia segura ao lado dele. Inquieta, de fato, mas segura.

Alguma coisa aconteceu para ele estar daquele jeito, e eu apostava todo o vinho que se encontrava no meu estômago, e que queria sair, que era algo relacionado a Abigail. Só Abi deixava Noah ensandecido, disfarçando uma calma em atitudes frias. Efraim também tinha um poder de mexer com ele, mas quando esse era o caso, suas pupilas dilatavam e o brilho em seus olhos saia do verde comum para um negro tenebroso.

Segurei-me com firmeza na poltrona do carro, sentindo o embrulho na barriga ir e vir com força cada vez que ele atravessava um semáforo sem olhar a cor. A gente meio que fica daltônico para aqueles instrumentos quando estava nervoso, e eu não poderia culpá-lo. Se fosse algo relacionado com Seth, eu agiria da mesma forma. Ou pior, já que eu não tinha o controle que Noah demonstrava.

Chegamos a Goiabeira em tempo recorde depois de quase atropelar um gato e derrubar um lixeiro de cima da calçada. Vi que ele diminuiu a velocidade dentro do bairro, mas pareceu extremamente reticente em fazer isso. Como se fosse algo de instintivo nele, e não de escolha. Aquilo era desconcertante de tão humano em se tratando daquele cara.

Noah sempre foi intrigante, mas nas últimas semanas ele beirava a loucura de tão diferente, e isso me fazia salivar de curiosidade. Eu não sabia se o problema estava na nossa aproximação repentina, ou nele. Estar com Noah nunca foi fácil por conta da situação paterna, mas ultimamente eu daria uma perna só para estar ao seu lado, vendo-o se comportar de forma tão peculiar com mais frequência.

Quem era aquele cara?

Parou com o carro na frente da casa dele, deixando a chave na ignição e soltando o cinto com violência.

— Tranque as portas e não saia daqui de dentro até eu voltar. – Falou sem um pingo de emoção na voz, apesar de estar respirando tão ruidosamente.

Então saiu com tudo, pisando apressado nas escadas de madeira em frente a casa que eu sempre achei tão linda quando era criança e que agora parecia acabada demais, como os habitantes que viviam dentro dela.

Levantei os olhos para a fachada descascada que não via há muito tempo. Tinha cinco anos na última vez em que brinquei de boneca com Bekah naquele jardim. Agora não era mais um jardim. Só terra e capim alto. Antes podíamos encontrar muitas espécies de flores ali, e a casa cheirava a rosas em qualquer época do ano, mesmo que não tivessem rosas brotando.

O lugar estava descuidado. Parecia abandonada, largada em um bairro de outras casas com cores alegres e vivas. Nem parecia que ali morava a ex-mulher de um deputado federal e seu filho. Parecia que não morava ninguém além do capim exibido, para falar a verdade.

Desliguei o motor do carro, pondo fim ao frio do ar condicionado. Não me lembrava de estar tão congelante com Noah ali dentro, mas agora eu me sentia num iglu. Foi quando comecei a ouvir os gritos altos e estridentes vindo da casa de Noah. O som me lembrava algum programa do Animal Planet sobre animais em sofrimento. Meu corpo estremeceu e a pena tomou meu peito com tudo. Não queria estar sentindo pena dele, Noah odiava aquilo, mas não pude evitar.

Sabia por Vini o quanto Abi estava mal, mas não imaginei que o mal a que ele se referia queria dizer que ela acordava os vizinhos a noite com gritos guturais e histéricos. Aquilo era doentio e fazia meus pés gelarem de agonia.

Improváveis Deslizes (Degustação)Where stories live. Discover now