Capítulo 1

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  Aqui na comunidade eu tenho uma vida boa, não vivo nenhuma pobreza, como a maioria das pessoas acham que quem vive em uma favela vive.
Meu pai tem uma padaria e até hoje os negócios andavam bem, pelo menos pra mim. Porém acabei descobrindo que os negócios não iam tão bem assim. O dono do morro já veio umas três vezes aqui cobrar ele e não temos como pagar, infelizmente meu pai deve muito a ele.

Estou debruçada na sacada do meu quarto, olhando para as casas que se aglomeram em frente a minha. São tantas casas.

Eu não saiu muito, só vou pra escola e volto. Bailes? Nunca fui em nenhum, até ouço o som que vem lá da quadra de cima, todos os finais de semana. Gosto de funk, até ouço, mas tenho muita vergonha de dançar e não gosto muito de ficar em meio de multidões. Prefiro o silêncio do meu quarto.
Esses lugares nunca me atraíram, principalmente as coisas que dizem que rolam por lá, nada com o que eu quero me meter.

A única coisa que me incomoda as vezes, é o som dos tiros que as vezes rola por aqui, me apavora e acabo entrando em pânico toda vez que a favela é invadida ou tentam pacificar. Não entendo porque querem tanto pacificar o Vidigal, aqui é bem mais tranquilo do que em outras comunidades do Rio de Janeiro. Digo isso não porque eu moro aqui, mas porque sei que o tráfico é bem menor e o porte de armas também. Nenhum bandido fica na rua armado, é muito difícil ver esse tipo de cena por aqui.

Ouço vozes e olho pra baixo, vejo o dono do morro parado em frente a padaria, gritando com meu pai.
Ele deu um prazo pro meu pai pagar e pelo visto esse prazo termina hoje, eu só não sabia disso. Odeio quando meus pais escondem as coisas de mim, eu já sou bem grandinha pra saber das coisas.
Como meu pai vai pagar?
Esse homem vai acabar dando uma surra no meu pai, pra deixar de exemplo ou algo pior. ELE VAI MATAR MEU PAI!

Desço as escadas correndo, quando chego o Patrão já está com uma arma apontada para cabeça do meu pai.
No canto da padaria minha mãe chora muito. O que eu faço? Meu pai não pode morrer. Tenho que fazer alguma coisa.
Não posso deixar ele tomar um tiro.
Não tenho dinheiro, não temos e esse homem me dá muito medo, não consigo raciocinar com ele aqui apontando uma arma pro meu pai.

– De hoje não passa. Se tu não paga, tu roda.
– Por favor, Patrão, eu tenho uma filha e uma mulher pra sustentar.
Meu pai lamenta, ajoelhado na sua frente. Nos ajuda meu Deus, por favor! Peço mentalmente pra Deus nos ajudar, só ele pode salvar meu pai agora.
– Porra nenhuma!

Ele destrava a arma. Deus nos ajuda! 

Sem pensar pulo na frente do meu pai, o Patrão abaixa a arma e me olha com ódio nos olhos.
O que eu devo fazer para convence-ló a não matar meu pai? Eu amo tanto ele, não posso deixar que esse monstro o mate, morreria no seu lugar se possível.

– Qual é mina sai daí caralho, antes que eu meta uma bala na tua testa também.
– Não... não mata meu pai.
Imploro.
– Então tu é a cria desse filho da puta? Nunca ti vi aqui na quebrada.
– Não mata meu pai por favor.
Ele me olha de cima a baixo e da um sorriso malicioso. Não vejo nada de bom que pode vim desse homem, mais eu não ligo, deixo ele fazer o que quiser comigo, desde que não mate o meu pai. Ele e a mamãe são tudo pra mim, faço qualquer coisa pra que eles não sofram. Eles fazem o máximo pra me fazer feliz então tenho que fazer o mesmo por eles.

– Já sei Gustavo, tu me da a mina como pagamento, aí nois fica kit.

O Patrão me olha novamente de cima a baixo, com o mesmo olhar maldoso de antes, só que dessa vez foi como se estivesse me analisando.
Meu Deus o que será que ele vai fazer comigo se eu ir? Não tem outra escolha, se eu não for ele vai matar meu pai e se duvidar eu e a mamãe também.
Morro de medo desse homem, ele me dá arrepios.

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